Com o episódio Betrayal (Traição) exibido na última segunda-feira (23), na HBO, a série His dark materials encerrou uma primeira temporada centrada em discussões sobre crenças, conhecimento e poder. A superprodução, resultado de uma parceria entre HBO e BBC, é baseada na saga homônima do escritor britânico Philip Pullman, lançada no Brasil com o nome Fronteiras do universo. Na história, a jovem órfã Lyra, interpretada por Dafne Keen (Logan), vive em um universo paralelo no qual o Magisterium, uma espécie de Estado eclesiástico, controla o Reino Unido.
A jornada de Lyra começa quando seu melhor amigo, Roger (Lewin Lloyd), desaparece misteriosamente, assim como outras crianças. Apesar da idade da protagonista, a produção não é destinada ao público infantojuvenil. Autoritarismo e religião, por exemplo, são alguns dos temas centrais da história. Personagens complexos completam o pacote. De passagem pelo Brasil durante a CCXP 2019, Ruth Wilson (Luther) e Clarke Peters (Três anúncios para um crime) afirmaram, em painel, que a produção é "tudo, menos uma história infantil".
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Na opinião da atriz, a série abre espaço para questionar o “maligno”. "Nós, definitivamente, precisamos trabalhar com os motivos pelos quais as pessoas fazem o que fazem, por que elas defendem algo, como Mrs. Coulter e Lorde Asriel (“tio” de Lyra) são tão diferentes, apesar de terem recebido treinamento no mesmo lugar e no mesmo tempo", diz. "Este é o motivo pelo qual cada indivíduo é tão único e tão fascinante: porque todos nós viemos de lugares muito distintos e passamos por experiências tão diferentes que moldam aquilo em que acreditamos ou não, o jeito que agimos ou não".
CRENÇAS
Intérprete do Dr. Carne, reitor da Universidade Jordan, Clarke Peters destaca o debate, na série, sobre crenças e conhecimento. "A questão é que estamos presos, porque fomos educados com certos fatos que são estabelecidos, mas não são necessariamente verdades. Então, temos sociedades inteiras que estão seguindo coisas que não são verdadeiras", diz. "É louco como você ensina isso para as pessoas, se são só teorias."
Ele conta que esse conflito o levou ao papel. "Você tem que ter certas chaves para acessar certas bibliotecas, certas referências, onde estão informações que todos nós deveríamos ter", diz. "Não gosto disso. Gostaria que, ao menos, todos tivessem acesso a tudo e chance de explorar a história, a espiritualidade e o intelecto."
His dark materials investe em recursos gráficos avançados. Enquanto a precursora Game of thrones precisou economizar no uso de imagens geradas por computador ou CGI, segundo sua sigla em inglês (computer generated imagery), a nova produção da HBO emprega o recurso quase o tempo todo.
Isso acontece porque, na história, cada pessoa é acompanhada por um dæmon (grafado dessa forma), seres vivos que são uma manifestação física externa do eu interior e assumem a forma de diferentes animais. Para Ruth e Clarke, os dæmons são uma grande sacada da saga.
"O relacionamento com os dæmons é fascinante nos livros, e eu continuo fascinada conforme vamos filmando. É a parte mais excitante para mim, a relação de Mrs. Coulter com o seu macaco", afirma Ruth. Na prática, ela conta, a interpretação se dá com manipuladores de fantoches, que, mais tarde, tomam vida com o CGI.
Diferentemente da maioria das pessoas, Coulter tem uma relação conflituosa com seu dæmon. "Alguém complexo como Mrs. Coulter tem uma relação muito difícil e até assustadora consigo mesma e, portanto, com seu animal", explica Ruth. "No curso das três temporadas, é através desse relacionamento que você consegue entendê-la."
Ela conta que trabalhou o aspecto psicológico e emocional dessa relação com o marionetista Brian Fisher. "Pensamos em como eles fazem a performance de uma relação publicamente e como são quando estão sozinhos em uma sala. Em público, eles fazem a coisa funcionar e manipulam o ambiente, mas, em casa, não suportam estar no mesmo espaço, porque Mrs. Coulter não suporta estar com ela mesma. Desenvolvemos a psicologia dessa relação." (Agência Estado)