A TV em 2020: streamings e remakes se destacam; veja no que ficar de olho

Grandes clássicos das telinhas estão voltando no próximo ano, e dentre a expansão da TV, gigantes como Disney e Apple apostam em distintas plataformas de vídeos sob demanda

Ronayre Nunes 24/12/2019 15:40
Reprodução/IMDB
(foto: Reprodução/IMDB )
Em 2019, um dos grandes destaques no mundo das séries foi a despedida de produções com uma forte base de fãs. Seja nos cinemáticos episódios de Game of thrones, ou com as risadas fáceis de The Big Bang Theory (além da premiada Veep, a clássica Orange is the new black, as setoristas de super-heróis como Jessica Jones e Gotham), os fãs de séries seguem na expectativa de que 2020 traga novidades capazes de suprir as despedidas.

Nessa vertente, produções de peso podem cair nas graças dos fãs. No gênero fantástico, The Witcher, uma readaptação de uma série de livro, (a primeira temporada estreia ainda no finalzinho de 2019, mas a expectativa é que a segunda temporada — que já está garantida — reverbere no próximo ano) e The Outsider, outra adaptação da extensa obra de Stephen King, prometem brilhar, além, é claro, de toda a franquia Star War que se expandirá com a chegada da Disney+ no Brasil em 2020.

Nos dramas, The undoing, com Nicole Kidman é uma das apostas. E na comédia, Phoebe Waller-Bridge, que brilhou com Fleabag em 2019, voltará às telinhas em 2020, agora no comando de Run.

Mais do que apostas 

As apostas específicas são sempre uma roleta russa. O melhor para entender as reais tendências do mundo das séries em 2020 é entender as ondas que a TV nadou em 2019 e o como eles podem quebrar no próximo ano. Para isso, o Correio falou com a Vana Medeiros, uma das autoras do livro Guia das séries: Tudo que você queria saber sobre as mais importantes dos últimos anos e também uma das responsáveis pelo Serie Lab, um dos maiores encontros de criadores de séries do país, e Rodrigo Seabra, autor do livro Renascença: a série de TV no século XXI. Os dois comentaram sobre duas importantes perspectivas para a TV em 2019 e 2020: os remakes e os serviços de streaming.

O velho é novo

Alf — O eteimoso, Grease — Nos tempos da brilhantina, As patricinhas de Beverly Hills, Punky — a levada da breca, Gossip Girl, Lizzie McGuire. Se em 2019 os remakes já brilharam no formato de séries, pode apertar os cintos: em 2020 eles estarão mais presentes do que nunca. A quantidade de produções “recicladas”, entretanto, não significam uma tendência negativa, pelo menos de acordo com Vana: "Esse tipo de fenômeno não evidencia uma falta de criatividade. Ele evidencia uma falta de ousadia, de coragem de uma outra ponta da indústria, que é a ponta da produção. O que eu acho que não falta aí é roteiristas e criadores com boas ideias, que fogem de uma certa estrutura narrativa, inclusive porque nos últimos tempos temos vistos uma recorrência do ponto de vistas de pessoas que não falavam antes, como LGBTS, mulheres, minorias e começaram a produzir narrativas que não tinha tanto espaço até então".

Vana aponta que os remakes são uma forma das séries competirem mais acirradamente em um universo com muitas opções: "As séries são cada vez mais abundantes, está cada vez mais complicado atrair o público para uma produção original. Uma forma de garantir que a série terá um público e não perderá dinheiro é investir em um produto que já foi testado, que já tem uma base de fã, pode ser de outra série, de um livro, o que os produtores querem saber é se tem um público cativo. Isso, do meu ponto de vista de criadora é um risco (no sentido) de a gente correr o risco de ter um nivelamento por baixo em que o entretenimento é rasteiro e uma indústria pop sem lastro”.

A onda dos streamings

Segundo Seabra, um dos responsáveis pela expansão em produções seriadas, os serviços de streamings representam uma nova forma porta de conteúdos, com mais liberdade em relação a formato: "O universo dos streamings foi é será importantíssimo para o universo das séries. E é importante lembrar: até mais (importante) que para o universo dos filmes (...). O streaming é um canal a mais para que as séries possam ser exibidas. Antes tínhamos os canais muito limitados, inclusive, e especialmente em questões temáticas, e esses streamings ampliam essa porta. Eles são uma oportunidade de os criadores se expressarem de maneira diferentes".

E se a expectativa da chegada do Disney ao mercado brasileiro (que se somará ao hall de Prime Video, Apple TV e já reconhecida Netflix) é alta para o próximo ano, Seabra aponta, entretanto, que o maior número de variedade não necessariamente se traduz em qualidade. O autor defende, tendo a Netflix como exemplo, que o excesso é um inimigo da perfeição: “Eu estou vendo muito um esforço artificial em lançar qualquer coisa uma vez por semana. Eu não vejo o mérito nisso. Eu vejo o mérito em dar espaço para quem quer criar e para quem quer criar sem censura”.

Sobre essa vertente, Vana pontua que o streaming, além do conteúdo, também libertam até mesmo o formato, e que se antes esse "meio" tinha o monopólio da Netflix, a expectativa é que no futuro isso mude. "Eu tenho a impressão que a partir de agora, plataformas como a Amazon, Apple TV e a Disney vão cada vez mais pautar esse assunto, mas com uma pequena grande dificuldade que a questão do preço. A Netflix tem a vantagem de não precisar ser veiculada em um único estúdio, algo que não ocorre com a Disney, mas ao mesmo tempo isso vai ser uma dificuldade para ela, porque a tendência é que cada estúdio lance o seu próprio streaming".

A TV nacional ainda com um pé no passado

Em questão de conteúdo, a avaliação de Cláudio Ferreira, autor dos livros A dinâmica dos reality-shows na televisão abertabrasileira, Cerrado em close – Histórias dos primeiros anos da TV em Brasília e Beijo amordaçado — A censura às telenovelas durante a ditadura militar, é que a TV nacional não fez grandes avanços em inovação no ano de 2019, e mais: essa perspectiva deve se manter em 2020.

“Basicamente acho que infelizmente não foi um ano de novidades na TV aberta. As emissoras estão tendo a difícil tarefa de reconquistar o público que está migrando para as plataformas de streaming, para ver séries em maratonas e não se ater à grade de programação”, defende Ferreira, que ainda completa: “Novelas não tiveram novidades e houve pouca ‘mobilização’ do público diante das histórias e dos personagens. Na área de entretenimento, destaque cada vez maior para os reality-shows de culinária, que, definitivamente desbancaram os concorrentes do gênero e obrigaram a emissora-líder a se render às panelas. Programas de auditório continuam resistindo bravamente, mas cada vez mais com a queda da qualidade do conteúdo na guerra de audiência”.

Em uma das fatias mais populares do país tupiniquim na TV, Ferreira faz uma ressalva em relação aos folhetins: “A grande exceção veio do horário das 18h. Órfãos da Terra abordou com muita propriedade o problema dos refugiados, colocou várias ‘nacionalidades’ na trama e rendeu bons momentos numa fronteira tênue entre realidade e ficção”.

Para Ferreira, a “tendência” da TV nacional nos próximos anos volta-se para uma repetição: “A tendência brasileira na TV aberta é justamente manter na grade de programação gêneros que dão certo: novelas, reality-shows, telejornais, programas de auditório, mas sem ousadia. Uma ou outra série traz novidades estéticas ou de narrativa, mas, no geral, os modelos se repetem”.

A explicação para essa repetição, segundo Ferreira, se volta para a clássica segurança econômica: “Em tempos de crise econômica, arriscar é mais difícil e a estratégia é sempre garantir os modelos tradicionais, com o menor custo possível. O público da TV aberta ‘envelheceu’ ao longo dos anos, o jovem está longe dos canais abertos, o que dá ainda mais munição para que as emissoras não optem pela ousadia”. 

MAIS SOBRE SERIES-E-TV