Quando a crise chega, ela não poupa ninguém. Nem mesmo os Windsor. Com lançamento no domingo (17), a terceira temporada de The crown (Netflix) percorre 13 anos – de 1964 a 1977, até o jubileu de prata da rainha Elizabeth II – em meio a muitos problemas, de ordem pública e privada.
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Mais bem realizada série histórica nestes tempos de produção de massa, The crown chega ao terceiro ano com novo elenco e clima geral de ressaca. Saem de cena a impulsividade e o frescor dos jovens soberanos, dando lugar ao casal real um tanto envelhecido (eles têm 40, mas portam-se como se tivessem 20 anos a mais) e com certa dose de amargura.
A temporada é menos glamourosa. Porém, como realização, The crown mantém o nível dos anos anteriores. Emociona, indigna, diverte e, a despeito das várias licenças artísticas (afinal, não há como saber o que disseram os membros da realeza dentro dos portões do Palácio de Buckingham), humaniza, com alguma verossimilhança, aquelas pessoas inacessíveis à plebe.
É de costas que a nova/velha Elizabeth nos é apresentada. Em 1964, quando a temporada tem início, a soberana tem 38 anos. “Velhota?”, questiona a rainha ao comparar seu antigo perfil ao atual nos novos selos do Royal Mail. Olivia Colman, agora amparada pelo Oscar de melhor atriz (pela rainha Anne, vamos dizer, bem mais mundana do que a rígida Elizabeth), não busca mimetizar sua antecessora no papel, Claire Foy.
Se nas duas temporadas iniciais a Elizabeth de Foy era puro brilho (até a maneira como respirava encantava o espectador), a nova intérprete busca a introspecção. Olivia Colman está sempre tensa e reprimida. Pouco sorri. Mas quando deixa a máscara da Coroa, atinge o ponto certo – tudo muito econômico, sem arroubos.
“Olivia é uma mulher comum. Ela tem a humildade que, acho, a rainha também tem, pois se sente como uma mulher comum presa a uma situação extraordinária”, comentou recentemente Peter Morgan, o criador da série.
Com elenco fora da curva, a nova temporada dá aos outros a chance de brilhar. Sai de cena o arrogante e autocentrado príncipe Philip de Matt Smith, agora um consorte entediado e ferido interpretado por Tobias Menzies – mais de uma vez, ele consegue se sobrepor à imagem da rainha criada por Olivia. Brilhando sempre por vias tortas, Helena Bonham Carter empresta um desdém à princesa Margaret, sufocada pela vida inerte da realeza – a atriz domina a cena do segundo e do 10º episódios, com interpretações distintas.
Em papéis menores vale destacar a Anne de Erin Doherty, a semelhança é impressionante com a irmã mais nova do príncipe Charles na juventude – o papel garante leveza e inteligência ao cotidiano um tanto modorrento dos Windsor. E para quem já está de olho em tempos mais atuais, é nesta temporada que tem início uma das histórias de alcova mais ruidosas da família real britânica no século 20.
O oitavo e o nono episódios introduzem Camila Shand (Emerald Fennell) como a paixão de um inseguro e deslocado príncipe Charles (Josh O'Connor). É um bom aperitivo para a quarta temporada, na qual surge lady Diana. Já filmada, estreia em 2020, mas a data ainda não foi anunciada.
THE CROWN
. Terceira temporada
. 10 episódios
. Netflix
. Estreia domingo (17)
EPISÓDIOS
1 – OLDING
“A idade raramente é gentil. Não há o que fazer, a não ser seguir em frente.” Com esse comentário autodepreciativo, Elizabeth II abre a terceira temporada. Em 1964, aos 38 anos, ela tem que lidar com um primeiro-ministro trabalhista (o primeiro de seu reinado, até então dominado pelos conservadores) e a ameaça de um espião da KGB.
2 – MARGARETOLOGIA
Sem grandes funções, a princesa Margaret é convocada para um jantar na Casa Branca com Lyndon Johnson, o vice de JFK que assumiu o comando dos EUA após o assassinato do presidente. Encontro regado a álcool e piadas de duplo sentido, algo impossível de acontecer no Palácio de Buckingham. Margaret salva o dia.
3 – ABERFAN
Triste conexão Minas Gerais-País de Gales. Em 1966, o rompimento da barragem de uma mina de carvão matou 116 crianças e 28 adultos de uma vila galesa. A demora da rainha em reagir à tragédia é um dos maiores arrependimentos dela. A cena final é o primeiro grande momento de Olivia Colman.
4 – BUBBIKINS
A princesa Alice, personagem desglamourizada, sofrida e pouco conhecida da família real, ganha o devido destaque neste episódio, que traz os Windsor em sua tentativa um tanto risível de aproximar sua imagem à do homem comum.
5 – GOLPE
O ensaio para um golpe de Estado e a rainha voltando a sorrir por simplesmente fazer o que gosta: cuidar de cavalos. Antes da estreia, o episódio gerou polêmica. Ex-secretário de Imprensa de Elizabeth, Dickie Arbiter criticou a série no The Sunday Times por sugerir um romance “infundado” entre ela e Porchey, seu gerente de corridas de cavalos. “É algo deselegante”, comentou.
6 – TYWYSOG CYMRU
Charles finalmente ganha destaque. A contragosto, é enviado a Gales para estudar – o crescente nacionalismo daquele país do Reino Unido motiva sua ida. O príncipe herdeiro, que só queria fazer teatro em sua escola inglesa, constata, mais uma vez, que nunca terá vida normal.
7 – POEIRA LUNAR
Enquanto o homem chega à Lua, o príncipe Philip, com seu passado de aviador, continua preso à vida maçante de consorte. Em crise, é o centro do episódio – a fala final de Tobias Menzies é um dos melhores momentos desta temporada.
8 – NA CORDA BAMBA
A série ganha alguma malícia com as trocas de parceiros da nova geração dos Windsor. Encantado por Camila Shand, ex de Andrew Parker Bowles, atual namorado da irmã Anne, Charles se aproxima de um renegado membro da família, que tem tocante grande finale.
9 – IMBRÓGLIO
Ainda Charles e Camila. O relacionamento sofre intervenção por parte da família real, que está num Reino Unido em meio à crise energética.
10 – CRI DE COEUR
“A satisfação é uma chatice”, declara Margaret. Em crise no casamento, a princesa chega ao fundo do poço. O reencontro das irmãs, na cena final, é tocante, com uma rainha afetuosa e distante da figura rígida que apresentou ao longo da temporada.