The Big Bang Theory e Supernatural, duas das séries mais longevas da TV norte-americana, chegam ao fim este ano. A primeira, com os divertidos amigos Sheldon Cooper e Leonard Hofstadter, acabou em junho, com 12 temporadas. A segunda, que narra a saga dos irmãos Winchester contra seres sobrenaturais, exibe em outubro sua 15ª e derradeira rodada. Por outro lado, fãs de Grey's anatomy comemoram: em 26 de setembro, o seriado emplaca o 16º ano.
“São sucessos comerciais e de audiência”, constata Luiz Lana, professor de comunicação da UNA. "Diversas variáveis podem explicar por que elas se tornaram fenômenos de longevidade. Um dos fatores decisivos é serem produtos lucrativos. Porém, temos de pensar também na relação delas com o público, nas relações humanas e sociais que estabelecem. Ao longo de 10, 12 ou 15 temporadas, essas séries entendem e atendem a demandas do seu tempo, ou seja, tratam de temas relevantes de cada época. E vão se adaptando ao longo dos anos", analisa.
The Big Bang Theory, Supernatural e Grey's anatomy – assim como Law & Order e Gunsmoke (20 temporadas), NCSI (16), Os Simpsons (30) e South Park (23) – têm algo em comum: capítulos independentes. "Em Friends e The Big Bang Theory, isso é muito notório. Claro, há o fio principal da história, mas se você nunca assistiu a uma temporada e resolve ver um episódio, consegue ter noção do que está se falando ali. Isso não ocorre com séries como Game of thrones", explica Luiz Lana.
Outra característica importante: todas são atrações da TV aberta norte-americana. Em média, as temporadas nessas emissoras contam com 20 a 22 episódios por ano. "É comum a TV aberta ter séries longas por uma questão de audiência, custo-benefício, repercussão e impacto", ressalta Bruno Leal, professor do Departamento de Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Especialista em narrativas audiovisuais, ele destaca um exemplo brasileiro de êxito: a segunda versão de A grande família (Globo), com 14 temporadas e 485 episódios. "É o nosso caso mais conhecido e recente. São produtos marcados pelo hábito, repetição, fidelização e maior dificuldade de maratonar. Essas séries operam na lógica da TV aberta. Enquanto ela existir, apesar de muita gente já decretar o seu fim, atrações assim vão durar", defende.
STREAMING O surgimento da TV a cabo e do streaming trouxe significativas mudanças ao formato e duração das séries. Para Bruno Leal, a HBO é o caso clássico. Desenvolve atrações com cinco ou seis temporadas, em média, e número mais reduzido de capítulos – no máximo 10 por ano. "Game of thrones fugiu um pouco desse padrão, teve oito temporadas por conta do enorme sucesso. Acontece também de séries serem canceladas mais cedo. A referência são cinco, seis anos de duração, o que tem um pouco a ver com a exploração que os canais fechados fazem das atrações. Há muita reprise, estimula-se a maratona. A lógica de produção e consumo das TVs fechada e aberta é bem diferente", opina.
Plataformas de streaming passaram a investir no filão, mas estão longe de produzir séries duradouras. Na sexta-feira, a produção original mais longeva e assistida da Netflix, Orange is the new black, entrou em seu sétimo e último ano. Quando estreou, em 2013, o streaming ainda se consolidava. Ao longo do tempo, outras novidades foram lançadas.
Bruno Leal acredita que o streaming ainda busca um padrão – a média são três a quatro temporadas. Para ele, a ligação do espectador com esses programas é outra. "A relação de fidelização é mais complexa e difícil. Quando se está operando num serviço de banco de dados que oferece enorme cardápio, é muito comum séries perderem público de uma temporada para a outra. Há muita coisa surgindo. É um desafio o streaming manter essa fidelidade, já que a marca dessas empresas é justamente a diversidade e a novidade", afirma o especialista.
ESTIGMA Na semana passada, durante o San Diego Comic-Con, nos Estados Unidos, o ator Jensen Ackles, um dos protagonistas de Supernatural, revelou que terá dificuldade de se desconectar da série e de Dean Winchester, seu personagem. "Para ser sincero, tive problema em digerir, levei um tempo para entender. Não me veio de forma natural”, contou. “Estou muito ligado a esses caras. Muito ligado à história", confidenciou.
Estrelas de séries longevas ficaram marcadas – e até estigmatizadas – por seus papéis. O caso mais emblemático é Friends, que teve 10 temporadas entre 1994 e 2004. Até hoje o elenco é conhecido pelos nomes dos personagens. "Dizem: fui ver um filme que tinha o Ross (David Schwimmer). Outro dia, assisti à série com a Phoebe (Lisa Kudrow). A única que conseguiu se desvencilhar um pouco disso foi Jennifer Aniston, mas, mesmo assim, a Rachel ainda é presente. Poucos conseguem se desfazer da marca. Com o fim de The Big Bang, é difícil imaginar o Sheldon (Amy Farrah Fowler) fazendo outra coisa", observa o professor Luiz Lana.
Sessão de terapia volta em agosto
Depois de um hiato de cinco anos, Sessão de terapia, cujas três temporadas foram exibidas entre 2012 e 2014 pelo GNT, está de volta. A nova rodada entrará em cartaz em 30 de agosto, agora no Globoplay. "É um feito inédito no mundo essa quarta temporada. A série original, a israelense Be Tipul, que nos inspirou, teve duas; a dos Estados Unidos, três; e a argentina replicou o roteiro da norte-americana", diz Roberto d'Ávila, diretor da Moonshot Pictures, coprodutora da atração em parceria com o GNT.
Quando o primeiro ciclo de Sessão de terapia se encerrou, a dramaturgia na TV experimentava um outro momento, lembra d'Ávila. A longa espera por novos episódios se deve a vários fatores. Selton Mello, diretor da atração, estava envolvido com outros projetos, assim como a Moonshot. "Atualmente, há um panorama muito grande de ofertas, mas mesmo assim as pessoas ainda se lembram da série, desejam vê-la. Tanto é que ela tem alto índice de horas assistidas no Now e Globosat Play, plataformas que exibem as primeiras temporadas. É um projeto com alto rigor artístico e estético", frisa.
MUDANÇAS Os 35 novos capítulos trazem novidades. Agora, Selton Mello atua, além de dirigir. Ele vive o psicólogo Caio, cujos pacientes são interpretados por Fabiula Nascimento, David Junior, Cecilia Homem de Mello e Livia Silva. Morena Baccarin faz o papel de Sofia, a terapeuta de Caio. Radicada nos Estados Unidos, a atriz brasileira trabalhou nas séries Homeland e Gotham, além dos filmes Deadpool e Deadpool 2. É seu primeiro trabalho falado em português.
"A gente mantém a média de episódios das demais temporadas. Cada paciente terá sete sessões, ou seja, sete episódios, como se fosse cada dia da semana. Se quiser, o espectador poderá acompanhar só os capítulos do personagem de que mais gosta", explica o produtor.
Com outras séries no currículo (Santo forte, 9mm: São Paulo e The taste Brasil), Roberto d'Ávila diz que o país tem condições de produzir séries longevas. Porém, lembra que o mercado dos EUA tem outra dinâmica. "A TV aberta americana é uma loucura, com séries de 20 episódios por ano, pois lá as produções equivalem a nossas novelas. É uma coisa mais pasteurizada, daí o volume maciço. Seriados mais curtos permitem a dramaturgia diferenciada, que aprofunda mais os conceitos. Assim, a tendência é criar vínculo mais estreito com a audiência", conclui.