Na série Belas raízes, que vai ao ar às quartas no canal a cabo Futura, a chef e nutricionista Bela Gil viaja pelo Brasil em busca de suas raízes e conhece diferentes comunidades e culturas tradicionais. Ela apresenta um conjunto de ensinamentos e tradições brasileiras que têm, em comum, lideranças femininas e o cuidado com a sustentabilidade. Quando o programa estreou, em abril passado, ele foi classificado como “livre para todos os públicos”. No entanto, na semana passada, a atração foi reclassificada pelo Ministério da Justiça (órgão responsável por essa prática) para "não recomendado para menores de 12 anos".
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Segundo a coordenadora, a análise é feita como um todo, e não somente por partes isoladas, de modo que atenuantes ou agravantes de contexto podem elevar ou diminuir as faixas etárias. Patrícia afirma que não houve mudança na classificação indicativa adotada pelo Ministério da Justiça sob a gestão de Sergio Moro. "Nunca houve qualquer tipo de ingerência por parte de qualquer autoridade nos processos de classificação indicativa, de modo que os processos de classificação indicativa seguem estritamente os critérios técnicos e legais existentes. Todos os critérios, bem como os fatores atenuantes e agravantes, estão previstos no Guia Prático da Classificação Indicativa e na Portaria 1.189, de 3 de agosto de 2018, normativas construídas de forma democrática, com a participação da sociedade civil", diz.
O procedimento de classificação indicativa pode ser feito de duas maneiras. A autoclassificação é atribuída pelo próprio responsável pela exibição da obra, com base nos critérios técnicos definidos pelo Guia Prático de Classificação Indicativa, ficando sujeita ao monitoramento do Ministério da Justiça. "É adotada pelas emissoras de televisão, que inscrevem o processo no MJSP, sem a necessidade, contudo, de enviar, previamente, a obra audiovisual. Após a estreia do programa, haverá o monitoramento pela Coordenação de Classificação Indicativa, que terá até 60 dias para confirmar ou indeferir a classificação pretendida pela emissora", explica a coordenadora. Para as redes de TV aberta, portanto, os pedidos de autoclassificação devem ser referendados pelo Ministério da Justiça.
ANÁLISE O outro método é a análise prévia, que se aplica aos mercados de cinema e vídeo. Nesse caso, quem pede a classificação deve submeter a obra à análise da Coordenação de Classificação Indicativa, que publica sua decisão no Diário Oficial da União (DOU). Somente após a publicação, a obra estará apta para exibição ou comercialização.
No caso de Por amor, Patrícia Osório esclarece que, quando o folhetim foi exibido originalmente, em 1997, na faixa das 20h, foi classificado como "livre", aplicando-se os critérios técnicos da época. "Com o passar dos anos, houve, evidentemente, atualização dos critérios de classificação indicativa, acompanhando a evolução da sociedade, de tal forma que surgiram questões quanto às inadequações possivelmente presentes na obra em apreço, tendo em vista a temática voltada ao público adulto empregada quando de sua primeira exibição", diz ela, que concedeu entrevista por e-mail. A coordenadora afirma que o monitoramento da obra, em sua segunda exibição, identificou a presença de cenas contendo tendências de ato violento, consumo de droga lícita, lesão corporal, apelo sexual, insinuação sexual, nudez velada, estigma/preconceito, que são indicativos de classificação mais elevada.
A Globo se pronunciou através de uma nota que reforça a orientação do Ministério da Justiça. "A classificação indicativa tem caráter informativo, sendo um instrumento à disposição dos pais ou responsáveis para a orientação das crianças e adolescentes, da maneira que compreenderem mais adequada. No que se refere às obras audiovisuais exibidas na televisão aberta, estas são autoclassificadas e, após o período de monitoramento, o Ministério da Justiça, por meio da Coordenação de Classificação Indicativa, atribui ou não a classificação pretendida, neste último caso, reclassificando-a. No caso de Por Amor, a novela já havia sido considerada “Livre” quando da primeira exibição, pelo próprio Ministério, tendo sido recentemente reclassificada, em razão de novos critérios de aferição da classificação indicativa por aquele órgão.".
Com relação a Belas raízes, a representante do Ministério da Justiça diz que foi identificada a descrição do consumo de droga lícita (o que não é recomendado para menores de 10 anos) e o consumo de droga lícita (não recomendado para menores de 12) em alguns episódios, justificados pelo contexto em que estão inseridos: um cachimbo artesanal sendo tragado por uma liderança indígena e o consumo de nixi pãe (bebida alucinógena que faz parte dos rituais do povo huni kuin) durante o 12º episódio.
"Durante uma cerimônia, Bela Gil experimenta a bebida e diz que foi uma das melhores experiências da sua vida. Ela conta, em detalhes, o que viu e sentiu, motivo pelo qual a ocorrência foi agravada por valorização de conteúdo negativo. Essa cena foi definidora para o aumento na classificação, já que, ainda que inserida em um contexto cultural, é protagonizada por uma não indígena e pode incentivar o uso da droga feita do cipó. Ressalta-se, ainda, que, de acordo com o Guia Prático de Classificação Indicativa, o uso ritualístico de substância alucinógena amolda-se à tendência de droga lícita. Diante do exposto, sugeriu-se classificação indicativa de "não recomendado para menores de 12 anos", afirma.
João Alegria, diretor do Canal Futura, diz que a reclassificação do programa foi recebida de uma maneira muito "tranquila". "É comum existirem diferentes pontos de vista sobre essas questões, e reafirmamos o respeito do Futura à capacidade técnica do Ministério da Justiça, estando aberto a esse processo de mediações e formação de consenso. Nesse caso em especial, a reclassificação não altera a estratégia de programação da série, mesmo porque todos os episódios inéditos já foram exibidos."
ROTINA O diretor observa que reclassificações são parte da rotina das emissoras de TV, podendo ocorrer, inclusive, mais de uma vez ao longo do processo de exibição de um programa ou série – seja para propor a elevação ou a redução da faixa etária. Ele salienta que a autoclassificação indicativa é resultado de uma construção da sociedade, num processo iniciado nos anos 2000, a partir do entendimento de que a sociedade é corresponsável por algum tipo de gestão sobre o conteúdo a que crianças e jovens têm acesso. "É muito saudável que haja variados tipos de regulação no ecossistema midiático no Brasil, de forma a deixar a sociedade tranquila. O sistema de classificação criou uma régua, um conjunto de parâmetros construídos socialmente, e isso é muito positivo."
Cada faixa de classificação tem uma indicação de horário a ser exibido. Em 2016, uma decisão do Supremo Tribunal Federal determinou que “não há horário autorizado, mas horário recomendado" e declarou inconstitucional o artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que estabelece multa e suspensão de programação às emissoras de rádio e TV que exibirem programas em horário não autorizado pela classificação indicativa. "As próprias emissoras fazem essa regulamentação. Repercutiria muito mal exibir uma cena de sexo ou de violência extrema de manhã ou à tarde, tanto que muitas novelas, como a própria Por amor, foram editadas e tiveram cenas cortadas antes mesmo da reclassificação. É uma questão não só de preservar o público infantil, mas de autoimagem", opina Rafael Barbosa Fialho Martins.
O cinema também tem que passar por essa regulamentação. As distribuidoras de filmes enviam, junto com a cópia da obra para avaliação, uma sugestão de classificação etária desejada. A opinião das distribuidoras e dos avaliadores coincide na maioria dos casos. Episódios de reclassificação são raros. Um desses casos pontuais ocorreu com o longa-metragem Aquarius (2016), de Kleber Mendonça Filho. Inicialmente, o filme foi classificado como "recomendado para menores de 18 anos". Após reclamação dos produtores e do próprio cineasta, que considerou "a classificação injusta, porque apenas filmes com forte conotação sexual recebem o selo de 18 anos, proibido para menores dessa idade", o Ministério da Justiça reavaliou a obra para 16 anos.
Daniel Queiroz, que comanda a Embaúba Filmes, distribuidora sediada em Belo Horizonte, afirma que, nos títulos que lançam, eles seguem a classificação oficial fornecida pelo Ministério da Justiça, mesmo quando a acham um pouco exagerada, e ressalta a importância da classificação indicativa como parâmetro para pais ou responsáveis. "Lembrando que ela é 'indicativa', ou seja, os pais ou responsáveis têm a prerrogativa de decidir por si e levar os filhos para os cinemas (ou permitir que assistam em casa, claro), mesmo que tenham idade menor do que a indicada. A exceção é para filmes ou espetáculos com classificação 18 anos, pois neste caso ela é impositiva, já que o cinema não pode autorizar a entrada de menores, mesmo acompanhados dos pais", diz.
Duas perguntas para Patrícia Grassi Osório (coordenadora de classificação indicativa do Departamento de Promoção de Políticas de Justiça da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública)
1 - Qual a principal função da classificação indicativa?
Ela atua na mediação entre dois valores fundamentais para uma sociedade democrática: o direito à liberdade de expressão e o dever de proteção dos direitos das crianças e adolescentes e fornece informação aos pais e responsáveis sobre o conteúdo das obras e diversões não recomendáveis a determinadas faixas etárias. A política de classificação indicativa não se confunde, em momento algum, com censura, pois não proíbe conteúdo algum.
2- No caso da TV, que o 'acesso é digamos mais livre', adianta ter classificação? Ou esse papel de regular cabe aos pais?
A classificação indicativa é uma política pública com assento na Constituição Federal de 1988, que ao mesmo tempo em que põe fim à censura, estabelece como competência da União “(...) exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão” . E enfatiza: “compete à lei federal regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada; e “estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.”
Vale ressaltar ainda que o trabalho realizado pela Classificação Indicativa não restringe nenhum conteúdo de ser veiculado, tampouco é de ordem qualitativa ou examina a precisão da informação prestada pelas obras. A livre expressão e a liberdade artísticas são intrínsecas à produção de obras de televisão, cinema, aplicativos e jogos de RPG. Cabe estritamente aos canais de veiculação escolherem o que será transmitido. O processo de classificação indicativa adotado pelo Brasil considera a corresponsabilidade da família, da sociedade e do Estado na garantia à criança e ao adolescente dos direitos à educação, ao lazer, à cultura, ao respeito e à dignidade. Essa política pública consiste em indicar a idade não recomendada, no intuito de informar aos pais, garantindo-lhes o direito de escolha. Para mais informações, recomendamos o acesso ao nosso site: www.justica.gov.br/seus-direitos/classificacao
1 - Qual a principal função da classificação indicativa?
Ela atua na mediação entre dois valores fundamentais para uma sociedade democrática: o direito à liberdade de expressão e o dever de proteção dos direitos das crianças e adolescentes e fornece informação aos pais e responsáveis sobre o conteúdo das obras e diversões não recomendáveis a determinadas faixas etárias. A política de classificação indicativa não se confunde, em momento algum, com censura, pois não proíbe conteúdo algum.
2- No caso da TV, que o 'acesso é digamos mais livre', adianta ter classificação? Ou esse papel de regular cabe aos pais?
A classificação indicativa é uma política pública com assento na Constituição Federal de 1988, que ao mesmo tempo em que põe fim à censura, estabelece como competência da União “(...) exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão” . E enfatiza: “compete à lei federal regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada; e “estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.”
Vale ressaltar ainda que o trabalho realizado pela Classificação Indicativa não restringe nenhum conteúdo de ser veiculado, tampouco é de ordem qualitativa ou examina a precisão da informação prestada pelas obras. A livre expressão e a liberdade artísticas são intrínsecas à produção de obras de televisão, cinema, aplicativos e jogos de RPG. Cabe estritamente aos canais de veiculação escolherem o que será transmitido. O processo de classificação indicativa adotado pelo Brasil considera a corresponsabilidade da família, da sociedade e do Estado na garantia à criança e ao adolescente dos direitos à educação, ao lazer, à cultura, ao respeito e à dignidade. Essa política pública consiste em indicar a idade não recomendada, no intuito de informar aos pais, garantindo-lhes o direito de escolha. Para mais informações, recomendamos o acesso ao nosso site: www.justica.gov.br/seus-direitos/classificacao
O QUE CAI NA PROVA DA INDICAÇÃO
Confira quais são as faixas de classificação adotadas pelo Ministério da Justiça
>> Livre para todos os públicos:
Exibido em qualquer horário. Não expõe crianças a conteúdos potencialmente prejudiciais.
>> 10 anos – Não recomendado para menores de 10 anos
Exibido em qualquer horário. Conteúdo violento ou linguagem inapropriada para crianças, ainda que em menor intensidade.
>> 12 anos – Não recomendado para menores de 12 anos
Exibido a partir das 20h. As cenas podem conter agressão física, consumo de drogas e insinuação sexual.
>> 14 anos – Não recomendado para menores de 14 anos
Exibido a partir das 21h. Conteúdos mais violentos e/ou de linguagem sexual mais acentuada.
>> 16 anos – Não recomendado para menores de 16 anos
Exibido a partir das 22h. Conteúdos mais violentos ou com conteúdo sexual mais intenso, com cenas de tortura, suicídio, estupro ou nudez total.
>> 18 anos – Não recomendado para menores de 18 anos
Exibido a partir das 23h. Conteúdos violentos e sexuais extremos. Cenas de sexo, incesto, ou atos repetidos de tortura, mutilação ou abuso sexual.