Bunnies (coelhinhos), assim mesmo, no plural. Foi esse apelido – e uma série de detalhes sórdidos, explorados à exaustão pela imprensa britânica – que derrubou uma estrela em ascensão no Partido Liberal (1859-1988) no Reino Unido. Não fossem os “coelhinhos”, vale dizer, Jeremy Thorpe (1929-2014) bem poderia ter se tornado primeiro-ministro.
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Scott foi o homem que, nos anos 1970, derrubou Jeremy Thorpe (Hugh Grant) no chamado Thorpe Affair. A minissérie acompanha pouco mais de 15 anos na vida dos dois personagens. No início dos anos 1960, Thorpe, um membro do Parlamento, solteiro, conhece Norman Josiffe (Whishaw), que trabalha como empregado na casa de um amigo.
Encantado pelo jovem, Thorpe diz a ele que, se um dia for a Londres, pode procurá-lo, o que Norman de fato faz, tempos depois.
Hugh Grant apresenta Thorpe como um homem encantador, manipulador e dissimulado. Já Josiffe (o sobrenome Scott foi adotado por Norman mais tarde) de Whishaw é instável, mitômano, mas tem lá seus encantos. O caso termina por decisão do parlamentar. Com o passar do tempo, cada um dos dois se casa e tem filhos.
FANTASMA Norman, agora Scott, não consegue se estabelecer – tenta receber um cartão de seguro social, que acredita ser fácil para Thorpe, então com o prestígio em alta, providenciar. Volta e meia o fantasma de Scott aparece para Thorpe, fazendo exigências.
“Diga a ele para não falar. E não escrever para minha mãe descrevendo atos de sexo anal sob qualquer circunstância”, é uma das sarcásticas falas do personagem de Grant na trama – o ex-amante havia terminado de contar para a mãe do político as intimidades que teve com o filho dela. Manter relações homossexuais foi considerado crime na Inglaterra até 1967.
O início do fim se dá quando Thorpe, por meio de amigos próximos, encomenda a morte de Scott. Uma série de trapalhadas risíveis culminam no assassinato do cachorro da vítima. Scott leva Thorpe e alguns dos envolvidos no crime a julgamento – não há vencedores nem vencidos.
A costura desta trama – a minissérie foi baseada no livro homônimo do jornalista John Preston, publicado pouco mais de um ano após a morte de Thorpe –, passados 40 anos de seu desenlace, é impecável. A assinatura de Frears se faz presente na leveza com que ele trata o tema, que ganha um tom de comédia dramática. A trilha sonora marca as passagens com um tom teatral.
Grant, cada vez melhor com a idade (o ex-queridinho das comédias românticas é quase sessentão), consegue dar a exata dimensão humana do personagem. Thorpe é frágil na intimidade, mas uma raposa política um tanto perversa na vida pública.