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Série 'O mecanismo' se propõe a desvendar as engrenagens da corrupção


Rio – Um galpão abandonado de 3,5 mil metros quadrados no bairro portuário carioca do Santo Cristo abriga temporariamente as sedes da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Ou melhor, da Polícia Federativa e do Ministério Federal Público. Os nomes foram mudados para seguir a legislação, pois ambos fazem parte de uma ficção: a série O mecanismo, que será exibida a partir de 23 de março na plataforma Netflix.

Assim como o musical previsto para estrear no fim do ano, em São Paulo, e o filme Polícia Federal: a lei é para todos (de Marcelo Antunez, lançado em 2017 e primeiro de uma trilogia), a Operação Lava-Jato, considerada a maior ação de combate à corrupção no Brasil, inspirou o seriado criado pelo cineasta José Padilha (Narcos, Tropa de elite, Robocop) e por Elena Soarez (Eu tu eles, Casa de areia), que assina o roteiro em parceria com Sofia Maldonado.

A série se baseia em fatos reais, mas os profissionais envolvidos fazem questão de frisar que se trata de uma criação. A proposta não é reforçar “a ideia simplista de que ou você é azul ou é vermelho”, afirma Daniel Rezende, diretor de alguns dos oito episódios da primeira temporada.

“O objetivo é exatamente a gente se entender como sociedade, entender o pensamento do mecanismo e como ele acontece. Padilha é especialista nisso, ele pega um assunto extremamente complexo e o decodifica para que todo mundo possa compreender. Na série, temos partidos políticos, empreiteiros, procuradores, juízes e delegados federais, mas ela é muito mais focada na obsessão do ser humano pelo poder, pela ganância”, explica.

APARTIDÁRIO
Rezende garante que a série não toma partido de ninguém. “Ela mostra a luta dos policiais para descobrir como funciona o mecanismo e como quebrar aquela engrenagem. O mecanismo é apartidário, não tem ideologia e está impregnado tanto no mais alto escalão político, empresarial e econômico quanto no mais baixo”, frisa ele, diretor do longa Bingo: o rei das manhãs e responsável pela montagem de Tropa de elite e Cidade de Deus.

Os personagens são fictícios, mas trazem referências que funcionam como elos com a realidade.
É o caso do doleiro Roberto Ibrahim, interpretado por Enrique Diaz. O sobrenome de origem árabe não deixa de ser alusão ao doleiro Alberto Youssef, descendente de libaneses e pivô da Lava-Jato. Selton Mello faz o papel do protagonista Marco Ruffo, inspirado no delegado federal Gerson Machado, considerado um dos “pais” da operação anticorrupção.

A atriz Caroline Abras, que interpreta a delegada federal Verena Cardoni, aponta a liberdade criativa da série, que foi gravada no Rio de Janeiro, com locações em Brasília, Curitiba e São Paulo. “Diferentemente dos personagens que estão nos noticiários, os nossos trazem a questão do lado humano. O espectador sentirá até certa empatia e identificação, pois vai ver como é o cotidiano deles, a relação com a família e os amigos, quais são os defeitos e qualidades. Quando criei minha personagem, não houve aproximação nem comparação com alguém real. Fazer essas associações não leva a lugar algum.
Nossa história começa do zero, não é um game de quem é quem”, comenta.

Marcos Prado, outro diretor do seriado, explica que alguns papéis surgiram da fusão de fatos reais e seus respectivos protagonistas. Isso também ocorreu em outros trabalhos de José Padilha, como Tropa de elite 2. “Misturamos políticos, épocas diferentes. No Tropa, por exemplo, ninguém reconhece o Sérgio Cabral, porém, o governador do filme tem características não só dele, mas de outros governadores. Em O mecanismo é assim também, algo genérico. O objetivo principal é retratar a engrenagem que funciona em várias sociedades, inclusive fora do Brasil, mostrando as várias esferas de corrupção. Do cara que faz gato em casa e falsifica a carteira de estudante aos desvios bilionários de dinheiro”, informa.

Selton Mello diz que corrupção é onipresente


Fã das séries The crown, The Sopranos, Stranger things e House of cards, Selton Mello não esconde a satisfação de trabalhar pela primeira vez com o diretor José Padilha. Isso pesou na hora de aceitar o papel do delegado Marco Ruffo.
Sem contar o alcance de uma produção da Netflix, exibida em 190 países.

“Marco é um grande personagem, assim como outros que fiz, mas o fato de ele atingir milhões de pessoas, em diversos lugares, é um estímulo a mais. Corrupção, favorecimento ilegal e propina, infelizmente, são temas presentes em qualquer sociedade, qualquer país. Por isso, acredito que vai haver uma identificação do público lá fora também”, destaca.

Marco Ruffo é ambíguo e complexo – herói e anti-herói, ao mesmo tempo. “Delegado afastado do cargo, ele é baseado em um personagem real, o Gerson Machado. Preferi não conhecê-lo justamente para ter mais liberdade criativa. Gerson foi a base para criar um personagem que vai além do cotidiano, da vida como ela é”, observa.

O ator acredita que O mecanismo vai levar o telespectador a refletir sobre várias questões, sobretudo neste momento conturbado que o Brasil atravessa. “Estamos nestes tempos meio loucos e é importante falar disso. A democracia deve ser tagarela e a função da arte é fazer pensar”, resume Selton Mello.

Depois de protagonizar O mecanismo, o ator mineiro se dedica a um projeto internacional. Selton vai estrear como diretor em Hollywood, comandando o drama musical Cathedral City.


O MECANISMO


. De José Padilha e Elena Soarez
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Episódios dirigidos por José Padilha, Marcos Prado, Felipe Prado e Daniel Rezende
. Com Selton Mello, Enrique Diaz, Caroline Abras, Alessandra Colasanti, Leonardo Medeiros e Johathan Haagensen
. Estreia em 23 de março, na Netflix


* A repórter viajou a convite da Netflix
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