Bastou a notícia vir à tona para a própria Netflix jogar a toalha. ''Assim fica difícil competir'', publicou o perfil oficial do seriado House of cards no Twitter, tão logo o vazamento da delação do empresário Joesley Batista, dono do frigorífico JBS, foi divulgado na última quarta-feira, 17, provocando um tsunami no já caótico universo da política do Brasil. A semelhança entre a trama norte-americana e os fatos brasileiros vem espantando os fãs da série. Realidade e ficção, aliás, têm se misturado em várias produções da indústria audiovisual, que explora com sucesso enredos parecidos com o da Operação Lava-Jato.
Lançada em 2013, pouco antes de o Brasil mergulhar na atual crise política, House of cards se tornou uma das séries de maior sucesso no mundo. A primeira temporada foi a mais assistida da Netflix naquele ano, enquanto a mais recente, que estreou em 2016, foi vista por mais de 9 milhões de assinantes do serviço de streaming. Escrita pelo norte-americano Beau Willimon, conta a história de Francis ''Frank'' Underwood, um político sedento pelo poder e capaz de tudo (até de matar) para chegar à Casa Branca.
Interpretado por Kevin Spacey, o protagonista começa sua trajetória como congressista do Partido Democrata, o mesmo de Barack Obama e Hillary Clinton. Embora os nomes dos partidos sejam verdadeiros, todos os personagens são fictícios. O enredo aborda os bastidores, muitas vezes escusos, da política (real) dos EUA.
CORRUPÇÃO
O inescrupuloso Underwood, no início da trama, planeja assumir a Secretaria de Estado e se aproximar da presidência. Ao longo de 56 episódios, todos disponíveis para assinantes da Netflix, Frank forja alianças, corrompe pessoas, trai aliados e manipula jornalistas, oferecendo um enorme repertório de reviravoltas. Acompanhado pela mulher, Claire (Robin Wright), o congressista acaba se tornando presidente da maior economia do mundo. As elogiadas atuações renderam o Globo de Ouro aos dois atores. Além disso, House of cards conquistou seis prêmios Emmy entre 2013 e 2016.
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O sucesso da série, cuja produção recebeu investimentos de cerca de US$ 50 milhões por temporada, está relacionado à imprevisibilidade de um roteiro fictício extremamente conectado com a realidade. Embora inspirada no universo norte-americano, as semelhanças com os acontecimentos brasileiros empolgam os fãs no Brasil. Frank Underwood já foi comparado a Lula, por conta da alta popularidade e do envolvimento com graves denúncias de corrupção. Outros veem no protagonista proximidade maior com Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, pelas alianças desfeitas e a capacidade quase maquiavélica de manipular e interferir nos acontecimentos.
Há ainda quem compare Frank a uma versão de Michel Temer, por ambos terem assumido a Presidência depois de escândalos e de ''trocar de lado''. O brasileiro abandonou o barco de Dilma Rousseff, enquanto o americano, também vice-presidente, passou a comandar a Casa Branca depois de tramar o impeachment do titular, que se vê obrigado a renunciar.
Peça-chave da forte estratégia de marketing montada pela Netflix, o perfil oficial da série no Twitter já brincou com as coincidências entre a trama americana e a Lava-Jato. Em março do ano passado, quando houve a condução coercitiva do ex-presidente Lula para depor na Polícia Federal, a plataforma de streaming publicou que estava ''assistindo ao noticiário brasileiro''. Na última quarta, quando estourou o escândalo Joesley Batista, o tuíte em português do perfil oficial e global da série, além de ser reproduzido na rede social por 132 mil pessoas, foi uma das notícias mais compartilhadas do dia.
HUMOR
Além de House of cards, outros roteiros de produções televisivas brasileiras e estrangeiras se inspiraram nas emoções proporcionadas pelas reviravoltas do poder. Um ano antes da estreia de Frank Underwood na Netflix, a HBO lançou Veep. Com tom humorístico, mas sem perder o sarcasmo, a série mostra a história de Selina Meyer, a vice-presidente dos EUA que resolve disputar a Casa Branca. Julia Louis-Dreyfus, atriz principal, ganhou um Emmy em 2012 por sua atuação.
Naquele mesmo ano, quando o ambiente político era bem mais tranquilo em Brasília, com bons resultados na economia e sem grandes tensões entre o Planalto e o Congresso, a Globo lançou O brado retumbante. A minissérie de oito capítulos, exibida em janeiro, contava a história de Paulo Ventura (Domingos Montagner). Eleito presidente da Câmara dos Deputados para atuar como fantoche do governo, ele acaba comandando o país depois da morte do presidente e do vice em um acidente aéreo.
Com o turbilhão de investigações, prisões, novas descobertas e escândalos da Lava-Jato ainda em aberto, o tema já tem data para estrear no cinema. Em 7 de setembro, será lançado Polícia Federal – A lei é para todos, a primeira produção sobre a operação. Com Marcelo Serrado no papel de Sérgio Moro, Leonardo Medeiros como Marcelo Odebrecht e Ari Fontoura interpretando Lula, o filme pretende mostrar a fase inicial das investigações e seus desdobramentos até a condução coercitiva do ex-presidente petista, ocorrida em março de 2016.
POLÍCIA FEDERAL
Em fevereiro deste ano, o Estado de Minas acompanhou a gravação de uma das últimas cenas do longa, a prisão do empreiteiro Marcelo Odebrecht. Embora conte com personagens da vida real, os protagonistas de A lei é para todos são agentes fictícios da PF. ''O Calloni (Antônio) faz o coordenador da Lava-Jato, que é o delegado regional de combate ao crime organizado do Paraná, Igor Romário de Paula (no filme, ele se chama Ivan Romano). Entrevistamos o Igor e o usamos para compor o personagem, com sua personalidade, gestual, etc. Mas o conjunto de ações é fictício. É uma junção de várias figuras, porque são mais de 50 delegados, não dava para colocar todos no filme'', explicou o diretor Marcelo Antunez.
A ideia é de que o longa seja o primeiro de uma trilogia sobre a Lava-Jato. Se depender dos últimos acontecimentos em Brasília, não vai faltar roteiro. Enquanto os brasileiros se surpreendem a cada dia com novas denúncias, House of cards anuncia a quinta temporada. Em 30 de maio, o mundo terá novo encontro com Frank Underwood.
HORÁRIO POLÍTICO
2012. VEEP
Na HBO, estreou Selina Meyer (Julia Louis-Dreyfus), a vice-presidente que luta para conquistar a Casa Branca
2012. O BRADO RETUMBANTE
Na Globo, estreou Paulo Ventura (Domingos Montagner), que vira presidente da República depois de uma tragédia
2013. HOUSE OF CARDS
Na Netflix, estrearam Claire (Robin Wright) e Frank Underwood (Kevin Spacey): vale tudo para conquistar o poder
2017. POLÍCIA FEDERAL – A LEI É PARA TODOS
Em setembro, estreia Sergio Moro (Marcelo Serrado), que chega ao cinema em filme sobre a Lava-Jato