São Paulo - Didi Mocó e Renato Aragão são completamente distintos um do outro, embora indissociáveis. Afinal, são mais de 50 anos de presença do personagem na vida do humorista e de quem o acompanha na TV, no cinema ou em outros meios por onde o trapalhão passou. Muito menos falante do que a sua criação, o artista se mostra tímido e reservado. “Para mim, três pessoas já é multidão. É difícil eu ir em festa. Só quando os colegas lançam um filme ou um programa, eu vou para dar uma força. Mas badalação, não”, afirma, sinalizando que prefere não estar no centro das atenções. Mas será difícil manter-se longe dos holofotes por muito tempo, já que o comediante se prepara para retornar ao papel na nova versão de Os Trapalhões, prevista para 2017.
A releitura do programa, exibido originalmente de 1969 a 1994, terá também a presença do remanescente Manfried Sant’Anna (Dedé) e outros atores do elenco original.
Ao contrário do que foi cogitado inicialmente, os novos membros não irão reinterpretar os papéis do quarteto formado por Didi, Dedé, Mussum e Zacarias, mas, sim, personagens inéditos. “Eu continuo sendo o Didi”, reforça Renato Aragão, acrescentando que o mesmo vale para Manfried Sant’Anna, já escalado para retornar como Dedé.
Além do retorno à TV – de onde está afastado desde 2013, com o cancelamento de As aventuras de Didi –, Renato Aragão volta aos cinemas para Os saltimbancos trapalhões: rumo a Hollywood, 50º longa-metragem da carreira. Sequência do filme de 1981 (inspirado na peça homônima de Chico Buarque, Luis Bacalov e Sérgio Bardott), o musical tem direção de João Daniel Tikhomiroff e estreia em 19 de janeiro.
Os saltimbancos, aliás, foi também a porta de entrada de Aragão para o teatro, há apenas dois anos, quando o filme original foi adaptado em peça. E apesar de estreia bem-sucedida nos palcos, o foco continua nos meios por onde se consagrou. “Gosto de fazer cinema e de fazer televisão. Estou sempre antenado com os dois”, enfatiza.
Renato Aragão diz ainda que, junto aos preparativos para a estreia nos cinemas do novo Os saltimbancos e do retorno à televisão, dá andamento a mais um filme. Sem revelar detalhes, o comediante diz apenas que será também um musical, gênero que foi a estreia dele na tela grande, com Na onda do iê-iê-iê (1966). Aos 81 anos, a única coisa que não está nos planos é aposentar-se.
* Repórter viajou a convite da organização da Comic Con
» Drummond e Os Trapalhões
De acordo com Renato Aragão, um dos pontos de virada na carreira foi quando o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, no fim dos anos 1970, deixou de dar uma entrevista por telefone justificando ao repórter que, naquele momento, estava assistindo ao programa Os Trapalhões. A justificativa, diz o comediante, ajudou a diminuir o preconceito que algumas pessoas, principalmente intelectuais, tinham contra a atração televisiva. “Antes, (as pessoas) diziam que viam um pedaço enquanto passavam pelo quarto da empregada. Depois disso, passaram a nos assistir na televisão da sala”, afirma. O quarteto também foi reverenciado por Caetano Veloso na música Jeito de corpo.
» Sucesso nos cinemas
Dos 51 filmes estrelados por Renato Aragão a partir da década de 1960, apenas 21 contaram com a presença de todos os integrantes de Os Trapalhões. O primeiro filme a contar com o quarteto completo foi Os Trapalhões na guerra dos planetas (1978) e o último foi Uma escolha atrapalhada (1990).
entrevista
Renato Aragão, comediante
“Sou uma pessoa muito tímida”
Você planejava a volta de Os trapalhões?
Esse retorno foi inesperado para mim. Eu apenas pretendia continuar fazendo meus filmes e outros projetos que eu ia lançar para a Globo. Mas apareceu essa ideia, vinda do (diretor) Ricardo Waddington, que, focado no grande sucesso da Escolinha do Professor Raimundo, sugeriu resgatar também Os Trapalhões para a nova geração. E aquilo foi me empolgando até que disse ‘eu entro nessa aí’.
Além de atuar, você está envolvido em outra área da produção?
Estou também como redator, com outros dois redatores-chefes e seis redatores. É uma turma muito boa. Estamos aprimorando o texto dos episódios, e o primeiro já está pronto. Alguns roteiros ainda estão muito grandes e temos que reduzir para caber no tempo de 30 minutos.
E qual vai ser o formato do novo programa? Existe mudança no tipo de humor?
Será exatamente como era em Os Trapalhões. O formato não será de sitcom, mas de esquetes. Só que a gente está modernizando. Aqueles textos que existiam antigamente, que falavam da atualidade da época, nós vamos colocar para hoje.
Você estava afastado da TV desde 2013. O que fez nesse período?
Não parei. Estou sempre fazendo projetos. Uma vez um amigo meu chegou e disse pra mim: “Renato, você é igual à Globo News: nunca desliga”. Depois eu me toquei e pensei em descansar um pouco, mas eu não consigo. E já estou fazendo o roteiro de um novo filme, musical também com a mesma turma do (novo) Os saltimbancos trapalhões, é uma equipe muito boa. Tem muita concorrência aí dos blockbusters. Não temos a verba deles, mas a gente vai lutar com as nossas armas.
Existe conflito entre Didi e Renato?
São totalmente diferentes, um não tem nada a ver com o outro. O Didi é aquele cara que quer ser feliz, não está preocupado com o dia de amanhã. Ele quer viver intensamente o hoje. E ele é um sonhador, sonha ficar com a mocinha mais bonita, mas o galã é quem leva a melhor e ele fica chupando dedo. Mas ele tá sempre alegre, feliz, sem se preocupar. Com Renato Aragão é diferente. Eu quero ser um bom pai de família, sou preocupado com o meu trabalho e qual o projeto que vou fazer amanhã, ao contrário do Didi. Considero o Didi o meu alter ego. Sou uma pessoa muito tímida, não gosto de badalação. O Didi não, ele quer estar em todo lugar. Eu gostaria de ser o Didi.
Existe algo que ainda queira fazer na carreira?
Olha, quase não dá tempo de fazer tudo que preciso fazer, por isso prefiro nem pensar em outras coisas. Não dá tempo. Eu gostaria de continuar fazendo teatro, quero conciliar agora na minha vida cinema e televisão. .