Aos 45 anos, o ator Bruno Garcia é dono de uma galeria de personagens que marcaram sua trajetória. Pedro Guerra, da novela Coração de estudante (2002), é apontado por ele como um dos mais marcantes, assim como, no cinema, Vicentão, de O auto da compadecida (1999), também é representativo. O pernambucano que trocou o Recife pelo Rio de Janeiro em busca de novos desafios vai definindo sua carreira em marcos bem destintos, “dependendo do ponto de vista”. “Ter começado a fazer televisão ainda cedo em Recife me deu estofo, afirma, lembrando ainda o fato de ter trabalhado com Guel Arraes na série Sexo frágil (2003) e em novelas como Bang bang (2005).
Atualmente em cartaz nos cinemas com o filme de suspense O caseiro, produção nacional dirigida por Júlio Santi, e no teatro com a estreia prevista para ontem, em São Paulo, da peça O livro de Tatiana, musical escrito e dirigido por ele, que esperou 18 anos para ser montado, sua carreira deve render novos marcos.
“Sou multifacetado”, diz o ator, que gosta de desenhar, esculpir, dirigir e trabalhar com audiovisual. “Gosto das várias camadas que cobrem a dramaturgia. Produção é o mais difícil, por obrigar você a botar o projeto debaixo do braço e sair em busca de patrocinador, do dinheiro e todo aquele esquema complicadíssimo da Lei Rouanet”.
Aliás, os últimos debates em torno da famigerada lei provocaram discussões rebatidas pelo ator. Bruno diz ter ficado impressionado com raciocínios bizarros segundo os quais os artistas estão mamando nas tetas do governo. “As pessoas não sabem do que estão falando.
CONSENSO
Ele reconhece que o Brasil está vivendo situações de um roteiro inimaginável. “A cada dia que acordamos, o país está pelo avesso do avesso do avesso”, sintetiza. O ator espera que todos esses acontecimentos levem para algum lugar de consenso em que possa ser reconhecida a necessidade de se fazer uma gigantesca reforma política. “Precisamos mudar o sistema político brasileiro, que é arquitetado para ser corrupto. Isso está claro. Não é discussão de direta, esquerda, centro. É um formato que tira do povo a capacidade de monitorar e exigir dos seus governantes as ações para as quais foram eleitos: cuidar da nação e não dos interesses próprios.”
As críticas de Bruno não param por aí e mostram que o ator não estão tão otimista. “Quando você se vê em um governo em que o vice-presidente junto com o presidente da Câmara, ambos com problemas na Justiça, conseguem impetrar processo de impedimento de uma presidente, não há como ter otimismo. Um vice interino que a partir dessa manobra absolutamente suspeita acabe com o Ministério da Cultura e volte atrás com a pressão fica claro que se trata de um governo oportunista, casuísta e que não sabe o que quer fazer”, dispara.
Mas Bruno não desiste de seus planos, mesmo que a maré não esteja para peixe. O Livro de Tatiana é prova de sua determinação. A peça foi escrita por ele há 18 anos.
“Queria contar uma história vibrante com a qual pudesse atingir todas as idades. O musical traz esse tipo de alegoria que agrada muito o pensamento lúdico. É uma história non sense, quase conversando com o surrealismo”, diz o ator, que também assina a composição das nove canções.
Escrever e compor nunca foi problema para ele. Apaixonado por literatura e influenciado por amigos músicos, Bruno revela ter feito letras para alguns deles. Mas foi ganhar um violão há quase duas décadas, que começou a dedilhar, o que resultaria nas canções do musical. “Pensei em convidar Flávio Mendes, maestro de Bibi Ferreira, e o músico Zé Ricardo para criarem as músicas. Para minha surpresa, pouco tempo depois, uma das canções estava pronta”, afirma ele, dizendo-se influenciado pelo rock dos anos 1970.
Durante a peça, a banda Armonika, do Rio de Janeiro, fará performance ao vivo. Bem humorado, o ator revela que a escolha para o nome da menina-título do espetáculo quase provocou ciúmes entre suas três irmãs. “Optei por Tatiana por ser um nome sonoro e também para prestar uma homenagem ao nome da filha do primeiro casamento da minha amiga Adriana Falcão.”.