O uso de hormônios para tratamento de doenças, planejamento familiar ou pessoal já é uma realidade na medicina há muitas décadas. Desde o surgimento das pílulas anticoncepcionais (normalmente associação de estrógeno com progesterona), as mulheres ganharam um controle sobre a vida e a carreira que antes era inconcebível. O tratamento de distúrbios menstruais, climatério e menopausa pode ser feito com hormônios e ajuda as mulheres nas mais diferentes fases da vida.
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A experiência de mais de 50 anos fez com que as doses fossem otimizadas e, além disso, esclareceu possíveis riscos e contraindicações. Hoje sabemos, por exemplo, que mulheres que apresentam enxaqueca com aura não devem usar pílulas anticoncepcionais com combinação de estrógeno e progestágeno pelo risco de trombose. A terapia de reposição hormonal (TRH) na menopausa também teve que ser reposicionada após descobertas a respeito da sua associação com câncer de mama. Essas informações só foram elucidadas após o uso prolongado por um número considerável de pessoas e até mesmo hoje os médicos levam em consideração o risco/benefício na hora de prescrever hormônios de qualquer natureza.
No Brasil, apesar de ser controversa, a utilização de hormônios para fins estéticos está cada vez mais comum. Em conversa com o endocrinologista Rafael Fantin Sik, esclareci algumas questões a respeito de um dispositivo implantável que vem chamando a atenção de especialistas, conhecido como "chip da beleza”. O implante, que na verdade não tem nada de chip, é um tubo de silicone com gestrinona, mas pode vir associado a outros hormônios, como a testosterona e o estradiol. Esse pequeno tubo é inserido sobre a pele em um procedimento cirúrgico ambulatorial e tem duração dos efeitos incerta. Não é necessário que ele seja removido, pois será absorvido pelo próprio organismo, com o passar do tempo. Rafael esclarece que a sua produção ainda não é industrial e faltam estudos sobre a sua eficácia e segurança.
Como o dispositivo não tem uma exata taxa de liberação hormonal constante e fixa, pode levar a efeitos colaterais como acne, oleosidade da pele, aumento de pêlos, engrossamento da voz, alteração de colesterol e outros. É impossível determinar o correto término do tempo de duração e, por isso, há risco de malformações fetais caso a mulher engravide utilizando o dispositivo.
Por ser um hormônio com ação antiestrogênica, antiprogestogênica e androgênica (masculinizante), a gestrinona leva a um ganho de músculo e perda de gordura mais específicas em braços, culote e coxa. Esse é o motivo da grande procura pelo público feminino, pois o implante promete acabar com a gordura localizada e a celulite. Em compensação, a mulher que porventura engordar em uso do chip adquirirá gordura principalmente em região abdominal.
Antes de pensar em colocar o "chip da beleza", o ideal é que a mulher saiba a relação dos seus riscos e benefícios e, caso opte pelo uso, faça um teste de adaptação com esses mesmos hormônios por outras vias de administração, como oral, dérmica e intravaginal.
Ainda faltam estudos dessa natureza para estabelecer segurança e as mulheres que utilizam-se desse método de certa forma podem ser coresponsabilizadas por possíveis efeitos colaterais maléficos. A gestrinona não tem liberação da Anvisa no Brasil, o que faz com que seja difícil de determinar efeitos a longo prazo com boa metodologia.
Nesta coluna, sempre ressaltamos o quanto a beleza e autoestima são importantes, mas também é nosso objetivo trazer informação de qualidade para que cada paciente saiba fazer suas escolhas de forma responsável e orientada. Procurar profissionais bem formados com residência médica em endocrinologia é o primeiro passo, pois dessa forma conseguimos minimizar os riscos com aumento dos benefícios de cada tratamento proposto.
Se tiver alguma dúvida ou comentário, me envie um e-mail: nadiabavoso@hotmail.com
Nádia Bavoso é dermatologista titular da Sociedade Brasileira de Dermatologia, Mestre pela UFMG e professora de dermatologia na Unifenas -BH.