A pandemia causada pelo SarsCov-2, o famoso novo coronavírus, está proporcionando um excelente aprendizado para toda população. A busca de explicações mais corretas e o combate às fake news tem impulsionado as pessoas a pensarem mais nos fatos que nas opiniões, os "achismos" estão perdendo espaço. As decisões erradas neste momento comprometem a vida, a segurança e a economia de uma nação. Entretanto, a sequência de prioridades devem ser exatamente esta: saúde, segurança e, somente depois, a economia.
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Um dos estudos sobre o novo Coronavírus divulgado nesta semana, na renomada revista Science, identificou que no epicentro da pandemia - a cidade de Wuhan, na China - os novos casos acompanharam o fluxo migratório. Esse estudo afirma que os resultados de controle de dispersão da doença são oriundos de diversas ações que aconteceram de maneira simultânea, entretanto as restrições de mobilidade estabelecidas no dia 23 de janeiro são apontadas como a principal responsável pelo bom desfecho.
Os chineses perceberam que pacientes assintomáticos ou com sintomas leves eram 86% dos contaminados que, por desconhecimento, estavam transitando em todos os locais e transmitindo a doença. Com isso, a restrição de mobilidade e de viagens se mostrou eficaz na redução de novos casos na China, Itália e São Paulo como observamos nesta semana.
Muitos países tentaram estratégias mais amenas por meio da realização de distanciamento social mais leve ou mesmo a tentativa de manter grupos de baixo risco circulando para tentar desenvolver a imunidade populacional, porém todos modificaram suas decisões. Países como a Inglaterra de Boris Johnson (testado positivo para Covid-19) e Holanda de Mark Rutte estão modificando suas atuações. Estes países eram os grandes exemplos para aqueles que temiam mais o colapso financeiro que o de saúde.
Os EUA registraram o primeiro caso no final de janeiro de 2020, as ações ostensivas de controle de mobilidade deveriam ter sido iniciadas logo no início de fevereiro. O atraso de quase dois meses na implementação dessas ações trouxe um resultado catastrófico para o país: já são mais de 86 mil casos confirmados e 1000 pessoas morreram. O que mais assusta é a velocidade exponencial: em 24 horas, entre os dias 26 e 27 de março, foram registradas 100 mortes só em Nova York. O EUA já ultrapassou China, Itália e Espanha. O epicentro do COVID-19 agora está nas Américas.
Nova York, que foi fundada em 1624, com o nome de Nova Amsterdã pelos comerciantes impulsionados por seus desejos de tempos melhores às margens do rio Hudson, agora pode receber o nome de Nova Wuhan: 40 mil casos registrados, 365 mortes, sendo 100 em 24 horas, 1200 pessoas em respiradores artificiais. Infelizmente, as projeções são que não haverá leitos e nem materiais suficientes para os atendimentos.
Cidades e hospitais de referência nos Estados Unidos já vivem a sobrecarga do sistema de saúde e a falta de equipamentos de segurança. Estamos diante de uma crise de abastecimento de equipamentos segurança e saúde no país mais rico do mundo e isso, definitivamente, é uma situação crítica e jamais vista. Muitas pessoas que estão utilizando de maneira equivocada os equipamentos de proteção não conhecem as necessidades de utilização e nem imaginam como o consumo errado pode prejudicar a saúde de toda a população.
A situação exige que seja realizada uma coordenação intensa de todo atendimento. Serão necessários locais exclusivos para o atendimento desses pacientes, já denominados de “Covidários”. Nesses espaços, é possível reduzir mais de 100X o gasto com equipamentos de proteção, garantindo a reserva de recurso para momentos de maior escassez.
A falta de proteção adequada para os profissionais que realizam atendimentos é extremamente grave. Significa que pessoas com competências de cuidar vão adoecer e terão que se afastar das suas atividades. A estrutura disponível no país mais rico do mundo é totalmente insuficiente para a demanda que irá surgir. O Senado americano aprovou o pacote de 2 trilhões de dólares para recuperação dos estados e assistência, isso significa 10 trilhões de reais. Com certeza não estamos falando de uma “gripezinha” que não atinge atletas.
Covid-19 no Brasil
O Brasil já confirmou quase 3 mil casos de COVID-19 e 77 mortes. Diante deste quadro incerto e possivelmente catastrófico, os governadores dos estados brasileiros se reuniram um dia após o pronunciamento do presidente da República Jair Bolsonaro que se posicionou de maneira contrária ao isolamento social e favorável à realização de um distanciamento mais leve, a fim de preservar a economia e evitar a crise.
A maioria dos brasileiros, em torno de 60%, não acreditam que o isolamento social é uma estratégia eficaz para conter as novas infecções pelo novo Coronavírus. Esse percentual nos coloca entre entre os 4 países mais pessimistas em relação aos resultados das ações adotadas, atrás do Japão, Índia e México.
Mas, os estudos recentes trazem informações que contrariam esses pensamentos. São Paulo, o estado que vivenciou a primeira morte por COVID-19 e foi o epicentro no Brasil, já pode acompanhar de maneira positiva as ações realizadas com agilidade e rapidez. Um estudo realizado pela USP (Universidade de São Paulo) confirma que as medidas de distanciamento social adotadas pelos paulistanos e o decreto do governador João Dória determinando o fechamento de serviços não essenciais desde o dia 24 de março já surtem efeitos na redução de novos casos. Estamos conquistando o tão sonhado achatamento da curva.
O governador cogita intensificar as medidas de restrição por meio da implementação do isolamento social ou lockdown (a palavra tão usada nos últimos dias) - de forma que o trânsito de pessoas na cidade seria controlado podendo, inclusive, fazer uso da força policial.
Durante a quarentena a sensação é de viver um domingo, seguido de outro domingo. As ruas desertas, os comércios fechados. Há quem consiga pensar apenas em números e cifras que não estão em movimento, porém não podemos nos esquecer de que ainda não conhecemos esta doença completamente. Não há como determinar os efeitos imediatos e posteriores da Covid-19 na população jovem e é um erro pensar que esse grupo sempre sofrerá efeitos leves.
Como a economia gira sem a força de trabalho? A vida é uma prioridade e importa. Não é nada confortável a fala de que o novo Coronavírus possui alta letalidade somente no grupos de pessoas acima de 60 anos. Em um rápido exercício: imagine as pessoas com mais de 60 anos da sua família, agora pisque os olhos e imagine que ao abrir este parente querido está morto devido a um quadro gripal e tente justificar essa dor através da manutenção do seu emprego e das suas garantias financeiras. Não é uma tarefa fácil, uma decisão intragável.
Os profissionais de saúde a frente dos atendimentos terão que decidir sobre quem tem indicação de receber os respiradores disponíveis. Uma decisão que causará sérios transtornos para as famílias e para os profissionais. Neste momento profissionais do Hospital das Clínicas da UFMG se empenham no desenvolvimento de ferramentas para ajudar na classificação dos pacientes para que seja possível ofertar a proporcionalidade terapêutica adequada e desta forma garantir o melhor tratamento adequado a cada paciente.
Estamos diante de uma pandemia, de uma situação completamente nova e de um problema de saúde que não é leve, não é passageiro e não permite achismos para tomadas de decisão. Fique em casa e utilize os itens de proteção somente quando for necessário.