Os pacientes oncológicos fazem parte do grupo de risco para infecção pelo coronavírus e, por isso, daremos continuidade à conversa com o professor Gustavo Meyer, cirurgião de cabeça e pescoço, focando nos riscos de um procedimento cirúrgico, após infecção por COVID-19.
O primeiro risco a ser ressaltado é o da exposição ocupacional. Procedimentos como traqueostomia, intubação orotraqueal, intubação nasotraqueal, bem como a manipulação cirúrgica da via aerodigestiva superior em pacientes infectados representa risco de contágio para a equipe de saúde envolvida no tratamento. Desde o início da pandemia, em todo o mundo se notificou risco aumentado para os profissionais que lidam diretamente nessas regiões.
Existe também o risco para o paciente de se sobrepor à agressão causada pela doença (e a toda resposta inflamatória que a infecção pode desencadear). O trauma cirúrgico desencadeará, de modo inexorável, o aparecimento de um quadro inflamatório de resposta à manipulação dos tecidos.
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A testagem rotineira no ato da internação não assegura que o paciente não esteja infectado, uma vez que há elevada taxa de exames falsos negativos nos primeiros dias. Por isso, é recomendado que pacientes que serão operados devem permanecer em total isolamento nos dez dias que antecedem o tratamento cirúrgico. Infelizmente, nem sempre essa recomendação pode ser seguida, pois muitos pacientes necessitam de cuidados de terceiros.
Um ponto importante a ser destacado é o aumento na incidência de complicações cirúrgicas e o aumento na mortalidade pós-operatória, em pacientes que já tiveram COVID, sobretudo naqueles que apresentaram a doença em sua forma mais grave, com necessidade de internação hospitalar. Esse aumento no risco de complicações permaneceu até vários dias depois da melhora do quadro infeccioso. Atualmente, a recomendação a ser seguida é de se esperar, no mínimo, sete semanas após o diagnóstico, para realização de qualquer procedimento cirúrgico eletivo, mesmo que o paciente já se encontre assintomático.
Uma intervenção cirúrgica realizada em prazo inferior a esse está relacionada ao aumento do risco de complicações pulmonares nos primeiros 30 dias, inclusive com necessidade não esperada de ventilação mecânica no pós-operatório, bem como aumento da mortalidade nos primeiros 30 dias após o procedimento cirúrgico.
O dilema que vivemos no presente momento é ter que prestar a melhor assistência, oferecendo o menor risco, com todos os seguintes fatores se apresentando simultaneamente:
- diagnóstico tardio em grande parte dos casos
- indisponibilidade de leitos e insumos
- progressão da doença durante a espera do tratamento
- risco ocupacional para a equipe assistencial
- risco de exposição ao paciente que será internado
- necessidade de se postergar o tratamento por sete semanas, em pacientes que já tiveram COVID
Diante de todos esses fatores conflitantes, a rotina tem se apresentado especialmente desafiadora, mesmo para os especialistas mais experientes.
Tem alguma dúvida ou gostaria de sugerir um tema? Escreva pra mim: carolinavieiraoncologista@gmail.com