Várias situações na medicina atual nos colocam, como médicos, em situações complexas na escolha da melhor ação diante de uma doença específica em que temos de lidar com um paciente que é uma pessoa única com caraterísticas próprias.
Desde estudante, escutamos a máxima de que “as doenças são as mesmas mas os doentes são diferentes”. Isso torna as condutas variadas diante de uma mesma doença, não podendo então existir uma conduta universal que contemple de forma igual em todos os pacientes mesmo tendo as mesmas doenças.
Desde estudante, escutamos a máxima de que “as doenças são as mesmas mas os doentes são diferentes”. Isso torna as condutas variadas diante de uma mesma doença, não podendo então existir uma conduta universal que contemple de forma igual em todos os pacientes mesmo tendo as mesmas doenças.
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Eles organizam as diretrizes clínicas com alguns algoritmos para auxiliar nas condutas. Essas diretrizes clínicas hierarquizam os diferentes níveis de evidencia científica classificando de 1 a 5, e os diferentes níveis da qualidade da evidência em quatro possibilidades: alta, moderada, baixa ou muito baixa. Em seguida, definem a qualidade das recomendações em dois níveis (forte e fraca). Essas diretrizes então separam as condutas em “sugeridas” ou “recomendadas”, dependendo do grau de evidência científica encontrada.
Portanto, mesmo existindo diretrizes para vários tipos de condutas, acaba sendo tarefa do médico assistente aplicar da maneira mais adequada e racional aquela tentativa de padronização que os algoritmos criados tentam direcionar como um fio guia nas condutas.
Mas diante de um paciente real, com todas as suas especificidades e individualidades, mesmo com as diretrizes baseadas nas melhores evidências científicas disponíveis para ajudar na tomada de decisão, ainda assim ocorrem vários tipos de divergências.
Mas diante de um paciente real, com todas as suas especificidades e individualidades, mesmo com as diretrizes baseadas nas melhores evidências científicas disponíveis para ajudar na tomada de decisão, ainda assim ocorrem vários tipos de divergências.
Como já mencionado antes, os médicos assistencialistas, que nem sempre são pesquisadores, atuam no atendimento cotidiano dos pacientes e se defrontam com uma pessoa singular com variáveis diferentes entre si, com combinações diferentes de comorbidades, diversos tipos de interações medicamentosas, pacientes diversos com bagagem cultural, valores e crenças diferentes também.
No final das contas, mesmo com as diretrizes, o pilar essencial na prática médica é a relação médico-paciente, que é onde se estabelece um vínculo de respeito e confiança mútua para ajudar na escolha das melhores opções de tratamento.
Nos últimos anos, a medicina vem se transformando, principalmente com o crescimento da disponibilidade de informações na internet. O acesso às informações é mais democrático e os pacientes chegam mais preparados e com mais conhecimentos. Ainda assim é comum também os pacientes obterem informações falsas, desvirtuadas, truncadas ou alarmistas.
Cabe então aos médicos cada vez mais ter uma função indispensável de ajudar a esmiuçar as informações obtidas na internet, separar o conhecimento útil específico e apropriado para o paciente em questão e colaborar na melhor escolha de possíveis opções de tratamentos disponíveis pelo paciente, pesando os prós e contras das alternativas.
Temos caminhado ao longo dos últimos anos na renovação da relação médico-paciente. Saímos de uma relação antiga vertical de poder de autoridade, que determinava as decisões sem discussão ou participação por parte dos pacientes na escolha dos tratamentos para um cenário do que tem sido designado de “tomada de decisão compartilhada” entre médico e paciente.
Nos últimos anos, a medicina vem se transformando, principalmente com o crescimento da disponibilidade de informações na internet. O acesso às informações é mais democrático e os pacientes chegam mais preparados e com mais conhecimentos. Ainda assim é comum também os pacientes obterem informações falsas, desvirtuadas, truncadas ou alarmistas.
Cabe então aos médicos cada vez mais ter uma função indispensável de ajudar a esmiuçar as informações obtidas na internet, separar o conhecimento útil específico e apropriado para o paciente em questão e colaborar na melhor escolha de possíveis opções de tratamentos disponíveis pelo paciente, pesando os prós e contras das alternativas.
Temos caminhado ao longo dos últimos anos na renovação da relação médico-paciente. Saímos de uma relação antiga vertical de poder de autoridade, que determinava as decisões sem discussão ou participação por parte dos pacientes na escolha dos tratamentos para um cenário do que tem sido designado de “tomada de decisão compartilhada” entre médico e paciente.
A medicina baseada em evidências de forma direta e simplificada é a arte de aplicar o conhecimento científico na prática clinica. A evidência é uma ferramenta que podemos usar para cuidar dos pacientes. A prática baseada em evidências funciona melhor quando é individualizada, de modo que o diagnóstico e o tratamento sejam considerados juntamente com os valores e preferências de cada paciente e se encaixem em seu contexto pessoal e social. Uma maneira de adaptar o cuidado ao indivíduo é a tomada de decisão compartilhada.
A nova realidade de “tomada de decisão compartilhada” é, portanto, um método para individualizar o cuidado através de discussões entre médicos e pacientes que trabalham juntos avaliando as opções disponíveis como hipóteses e testando-as durante a consulta, até que fique claro como melhor cuidar e como o paciente quer ser cuidado. Podem ocorrer níveis variados de participação do paciente, sendo que indivíduos em condições mais graves podem preferir que os médicos tomem as decisões de tratamento em seu nome, enquanto o mesmo paciente em estado melhor de saúde pode ser o mais forte defensor de “nenhuma decisão sobre mim sem mim”.
Para quem chegou até aqui nesse texto, pode parecer que vou me posicionar sobre um dos temas polêmicos da atual pandemia - assunto que vem sendo discutido há semanas e em particular nos últimos dias sobre usar ou não a hidroxicloroquina associada a azitromicina para os pacientes com COVID-19.
Nesse debate, que tem ocorrido de forma passional e meio insana, eu não vou entrar, não me sinto ainda capaz como médico, mesmo tentando acompanhar as publicações científicas de me posicionar. Não consegui chegar ainda a uma conclusão definitiva sobre o assunto e existem bons argumentos para as duas alternativas. Diante dos conhecimentos atuais disponíveis sobre essa medicação, ainda não sei dizer qual o melhor caminho para minimizar o colapso do sistema hospitalar ou redução de mortes e, na verdade, ninguém no mundo neste momento sabe também.
Nesse debate, que tem ocorrido de forma passional e meio insana, eu não vou entrar, não me sinto ainda capaz como médico, mesmo tentando acompanhar as publicações científicas de me posicionar. Não consegui chegar ainda a uma conclusão definitiva sobre o assunto e existem bons argumentos para as duas alternativas. Diante dos conhecimentos atuais disponíveis sobre essa medicação, ainda não sei dizer qual o melhor caminho para minimizar o colapso do sistema hospitalar ou redução de mortes e, na verdade, ninguém no mundo neste momento sabe também.
Ainda assim o Conselho Federal de Medicina se posicionou em diretriz prévia sobre esse assunto, de modo que cada médico, com seu paciente individual, pode decidir qual a melhor opção, após avaliar de forma crítica e clínica sobre a prescrição dessa medicação.
O médico tem, portanto, a liberdade de analisar com seu paciente esta possibilidade terapêutica e o direito de optar ou não pela prescrição, mas ele tem o dever de antes discutir com o paciente os possíveis prós (informando toda a incerteza sobre a eficácia e como a literatura tem mostrado dados divergentes e do nível fraco de evidência) e os contras (riscos e efeitos colaterais).
O médico tem, portanto, a liberdade de analisar com seu paciente esta possibilidade terapêutica e o direito de optar ou não pela prescrição, mas ele tem o dever de antes discutir com o paciente os possíveis prós (informando toda a incerteza sobre a eficácia e como a literatura tem mostrado dados divergentes e do nível fraco de evidência) e os contras (riscos e efeitos colaterais).
Vale estabelecer aqui alguns conceitos mínimos de “eficácia”, sendo uma propriedade intrínseca de uma conduta médica e de um fármaco refere-se, frequentemente, à sua capacidade máxima de produzir um efeito. Já a “efetividade”, como resultado da interação do tratamento com o ambiente em que ele está sendo aplicado, mede o efeito de um medicamento na terapêutica, ou seja, em condições "reais" da população como um todo, ao contrário do que é avaliado durante os ensaios clínicos controlados. Por último o conceito de "eficiência", que é utilizado quando se avalia a relação custo-efetividade de um tratamento para o paciente ou a sociedade.
Ao analisar um medicamento, em primeiro lugar precisamos saber da sua eficácia e segurança. O melhor nível de evidência para responder esta pergunta são ensaios clínicos randomizados, que tenham eventos clínicos como desfecho. Uma vez isso demonstrado por ensaios clínicos de qualidade metodológica satisfatória, apenas outro ensaio clínico pode refutar a informação.
Uma droga com clara demonstração de eficácia e segurança pode então ser liberada para utilização clínica e aí entram os estudos de efetividade. Uma vez entrando na prática clínica, a droga deve ter seu efeito no mundo real monitorado para saber se em um número maior de indivíduos fora dos ensaios clínicos a medicação se mantêm segura.
Uma droga com clara demonstração de eficácia e segurança pode então ser liberada para utilização clínica e aí entram os estudos de efetividade. Uma vez entrando na prática clínica, a droga deve ter seu efeito no mundo real monitorado para saber se em um número maior de indivíduos fora dos ensaios clínicos a medicação se mantêm segura.
Se formos olhar esses conceitos de eficácia, efetividade e eficiência sobre as drogas hidroxicloroquina isolada ou em associação com a azitromicina, fica claro que ainda não temos na literatura condição de afirmar que ela seja eficaz ou efetiva. Pelo fato dessas drogas serem de baixo custo e sem patente, especula-se que talvez tivesse grande chance de ser eficiente mas também não temos dados para afirmar isso. Os diversos estudos sobre essa droga até o momento e as propostas de protocolos atuais ainda não se baseiam em estudos clínicos randomizados que todos almejam em ter para definir se a hidroxicloroquina funciona ou não.
Essa discussão ainda vai longe e não tenho a menor intenção de atirar pedras nem de defender algo sobre o qual ainda não tenho opinião clara formada. Estamos numa situação de possível tomada de decisão compartilhada entre médico e paciente mas sem ter dados científicos consistentes definitivos. Uma vez que a decisão tenha sido tomada de comum acordo entre as partes, é no mínimo necessário que o paciente assine um TCLE (termo de consentimento livre e esclarecido).
Concordo e compartilho a opinião de um editorial recente de uma das mais prestigiosas revistas acadêmicas, a Nature, de 14 de maio de 2020. “Uma emergência pandêmica é uma razão para trabalhar mais rápido, mas os pesquisadores não devem perder de vista o fato de que as intervenções experimentais trazem um risco inerente para o paciente. Para equilibrar esse risco, os ensaios clínicos devem ser tão robustos quanto possível. Alguns estudos precisam ser pequenos nas explorações iniciais de possíveis tratamentos; mas depois disso, os pesquisadores devem pensar grande. É importante mudar rapidamente para estudos clínicos randomizados maiores, colaborativos, aqueles que ultrapassam fronteiras e compartilham experiência, com maior chance de mostrar o que funciona mesmo”.
Coincidência ou não, no mesmo dia foi divulgado na página do National Institute of Health (NIH), dos EUA, o início de um estudo clínico randomizado de uso de hidroxicloroquina mais azitromicina comparado com placebo com dois mil pacientes com COVID-19.
Coincidência ou não, no mesmo dia foi divulgado na página do National Institute of Health (NIH), dos EUA, o início de um estudo clínico randomizado de uso de hidroxicloroquina mais azitromicina comparado com placebo com dois mil pacientes com COVID-19.
A página do NIH traz a opinião do Dr. Anthony Fauci,diretor do The National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID): “Precisamos urgentemente de um tratamento seguro e eficaz para o COVID-19. O reaproveitamento de medicamentos existentes é uma opção atraente, porque esses medicamentos foram submetidos a testes extensivos, permitindo que eles passem rapidamente para os ensaios clínicos e acelerem sua potencial aprovação para o tratamento com COVID-19 ”. Ele completa: “Embora haja evidências anedóticas de que a hidroxicloroquina e a azitromicina possam beneficiar as pessoas com COVID-19, precisamos de dados sólidos de um grande ensaio clínico controlado e randomizado para determinar se esse tratamento experimental é seguro e pode melhorar os resultados clínicos.”
O principal objetivo desse estudo será determinar se a hidroxicloroquina e a azitromicina podem prevenir a hospitalização e a morte devido ao COVID-19. Além disso, os pesquisadores avaliarão a segurança e a tolerabilidade do tratamento experimental para pessoas com infecção por SARS-CoV-2. Mas os resultados talvez somente teremos no final do ano. Ficamos por aqui aguardando ansiosamente a solução para esse dilema quando tivermos esses estudos científicos com nível de evidência forte.
Se você tem dúvidas sobre a coluna de hoje ou quer sugerir temas, envie email para arnaldoschainberg@terra.com.br