Tenho percebido que as pessoas estão cada vez mais atrás de algum recurso fácil e rápido para conseguir manter a boa saúde em dia. Seja através de um “remedinho milagroso”, um “suplemento em cápsula”, um “elixir da juventude”.
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Mas atitudes para poder prevenir doenças também envolvem outros cuidados importantes não medicamentosos, entre os quais a saúde bucal.
Estou cercado de dentistas há muitos anos, convivo com “a melhor dentista do mundo”, com quem estou casado há 30 anos. Tenho o prazer de ter grandes amigos queridos de uma vida inteira que são dentistas brilhantes e que, sem saber e sem perceber, têm me ensinado muito sobre o impacto da saúde oral na saúde geral dos pacientes. Há décadas escuto as discussões dos casos clínicos sendo resolvidos em cooperação interdisciplinar.
Durante anos na enfermaria do hospital onde trabalho, existiu um programa de atendimento com uma estreita participação dos dentistas no atendimento dos pacientes diabéticos internados. Todos eram submetidos a avaliação da saúde oral e encaminhados para educação de higiene bucal e agendados para intervenções dentárias mais imediatas e indispensáveis como extrações e limpeza mais agressiva de doença gengival severa ainda durante a internação. Testemunhei resultados impressionantes na melhora do controle desses pacientes diabéticos com a ajuda dos dentistas antecipando alta hospitalar.
A inflamação desempenha um papel importante no desenvolvimento do diabetes que é um importante problema de saúde global. A doença periodontal envolve reações inflamatórias que afetam os tecidos que circundam os dentes. A inflamação, por sua vez, é uma importante causa de diabetes por meio do aumento da resistência à insulina e disfunção endotelial. A doença periodontal também é comum na população em geral. Como a doença periodontal e a falta de higiene bucal podem provocar bacteremia transitória (bactérias na corrente sanguínea) e inflamação sistêmica, foi então criada a hipotese da possibilidade de que a doença periodontal e os indicadores de higiene bucal pudessem estar associados à ocorrência de diabetes de início recente.
Um estudo feito por autores que declararam não possuir conflitos de interesse foi realizado a partir de informações do banco de dados nacional de saúde da Coreia do Sul e publicado em 2020 na revista científica Diabetologia, que é a revista oficial da Associação Europeia para o Estudo da Diabetes.
Foram analisados dados de 188.013 indivíduos do Sistema Nacional de Seguro de Saúde da Coreia no Coorte de Rastreio de Saúde, que possuíam dados completos e não tinham diabetes no início (2003-2006).
Os comportamentos de higiene bucal, incluindo frequência de escovação e visitas ou limpezas dentárias foram coletados. Durante um acompanhamento médio de 10 anos, houve 31.545 novos casos de diabetes, com uma taxa global estimada de eventos em 10 anos de 16,1%. A taxa foi de 17,2% para aqueles com doença periodontal na linha de base versus 15,8% para aqueles sem, o que foi uma diferença significativa mesmo após ajustes para múltiplos fatores de confusão.
Comparado com a ausência de dentes, a taxa de eventos para diabetes de início recente aumentou de 15,4% para quando havia apenas um dente ausente; e para 21,4% para quando havia 15 dentes ausentes.
Quanto ao número de escovações diárias feitas pelo indivíduo, aqueles que escovaram três ou mais vezes ao dia tiveram um risco significativamente menor de diabetes de início recente comparado com quem fazia escovação apenas até uma vez ao dia.
Os autores do estudo concluíram então, baseados nesses dados, que a escovação frequente dos dentes pode ser um fator atenuante e a presença de doença periodontal e um número aumentado de dentes ausentes podem ser fatores que aumentam a ocorrência de diabetes de início recente.
Melhorar a higiene bucal pode estar associado a um risco reduzido de ocorrência de diabetes de início recente. Vamos repassar essa informação para o maior número de pessoas já que, muitas vezes, muitos indivíduos negligenciam os cuidados da saúde bucal achando ser uma questão menor e sem importância.
Para finalizar faço aqui uma analogia grotesca. No comércio de equinos, há muito tempo já se sabe que, para se precaver contra as manobras fraudulentas de algum vendedor querendo usar de métodos dolosos no mercado de cavalos, pode-se por meio do exame bucal e pelo estado da arcada dentária aferir o estado do animal. Um bom conhecedor de equinos consegue, pela saúde bucal, identificar a idade e saúde geral do animal com relativa precisão. Vem daí portanto aquele antigo provérbio, "a cavalo dado não se olha os dentes".
Se você tem dúvidas ou sugestão de temas, envie para arnaldoschainberg@terra.com.br