Saúde Plena

Perda rápida de peso pode liberar substâncias tóxicas no sangue; entenda

A obesidade vem se tornando um problema de saúde pública no mundo todo. Nos EUA, mais de 5% da população adulta agora tem obesidade mórbida, o que representa um universo superior a 16 milhões de pessoas.


No Brasil, temos dados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), divulgada em julho de 2019 pelo Ministério da Saúde. Esse levantamento foi feito em 26 capitais do país mais o Distrito Federal, com 52.395 pessoas maiores de 18 anos de idade.

Os últimos dados do Vigitel apontaram 55,7% da população brasileira com sobrepeso, o que representa um crescimento de 30,8% em 13 anos de análise.

Em 2006, a proporção de brasileiros com sobrepeso era de 42,6%. Ainda levando em conta os dados do Vigitel, a taxa de obesidade global no país passou de 11,8% para 19,8%, entre 2006 e 2018.

Esses indivíduos têm risco aumentado de múltiplas doenças crônicas, incluindo diabetes, hipertensão e vários tipos de câncer.


Em resposta à epidemia de obesidade, tem havido um aumento significativo da demanda por tratamento cirúrgico e os EUA já contabilizam mais de 200 mil procedimentos cirúrgicos bariátricos anualmente.

 

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Levantamento realizado pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM) mostram que o número de cirurgias bariátricas realizadas entre 2011 e 2018 aumentou 84,73% no Brasil, passando de 34.629 em 2011 para 63.969 procedimentos em 2018.

Nesse período de oito anos, foram contabilizados 424.682 pacientes submetidos a cirurgias para emagrecimento. Isso ainda corresponde a apenas 3,12% dos 13,3 milhões de obesos mais severos que se enquadram na indicação potencial para serem operados.

A consequência positiva da cirurgia bariátrica é a rápida perda de peso que, quando mantida, pode levar à remissão de condições como diabetes tipo 2 e hipertensão. Embora se saiba que as cirurgias bariátricas têm potenciais efeitos colaterais adversos, incluindo deficiências de micronutrientes, existe um outro potencial risco pouco explorado, o de liberação de substâncias tóxicas armazenadas na gordura, o que ainda não foi bem estudado.


Uma questão que recebeu muito menos atenção epidemiológica e clínica é o acúmulo ao longo de décadas de substâncias tóxicas ambientais lipofílicas no tecido adiposo. Essas substâncias tóxicas incluem um espectro de poluentes orgânicos persistentes (POPs), incluindo bifenilos policlorados (PCBs), éteres difenílicos polibromados (PBDEs), organoclorados pesticidas (OCPs) e perfluorquímicos (PFCs).

Embora promova uma vida mais saudável, a rápida perda de peso também pode ter um efeito adverso insidioso por causa da liberação desses POPs armazenados no tecido adiposo para a circulação, resultando em concentrações plasmáticas crescentes que podem desencadear vias de sinalização deletérias.

Sabe-se que muitos desses compostos têm efeitos de “desregulação endócrina”. Esses desreguladores endócrinos (EDCs) são substâncias químicas presentes no meio ambiente e no ambiente de trabalho que podem bloquear, mimetizar ou desregular a função hormonal normal.


O pesquisador Robert H. Brown e colaboradores da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg examinaram 26 pacientes obesos mórbidos que foram submetidos a cirurgia bariátrica em um estudo longitudinal. Cada paciente teve uma amostra de sangue colhida no momento da cirurgia e em 4 consultas de acompanhamento durante 6 meses.

A análise concentrou-se nos níveis sanguíneos de 41 POPs, incluindo 24 compostos de bifenil policlorado (PCB) e 5 pesticidas organoclorados detectáveis nas amostras iniciais. Os pesquisadores também classificaram os pacientes em 2 grupos: 17 pacientes nascidos antes de 1976 e 9 nascidos após este ano.

Os resultados mostraram que os pacientes nascidos antes de 1976 iniciaram o estudo com níveis séricos da maioria dos PCBs aproximadamente cinco vezes maiores, além de níveis mais altos de pesticidas organoclorados, em comparação com os pacientes nascidos após 1976.


Durante os seis meses de perda de peso após cirurgia bariátrica na qual os pacientes tiveram o peso inicial reduzido, em média, 23% (quase 30 kg cada), ambos os grupos de pacientes tenderam a mostrar aumento nos níveis séricos de POPs armazenados na gordura.

Os pesquisadores observaram que estudos com populações maiores precisam ser realizados para verificar os achados nesse estudo de amostra pequena. Pesquisas adicionais também poderiam determinar se existem efeitos biológicos, especialmente em órgãos sensíveis e ricos em gordura, como fígado e cérebro, da liberação na circulação dessas substâncias tóxicas envolvidas.

Segundo os autores da pesquisa, "há notavelmente pouca informação na literatura que relaciona os níveis sanguíneos desses compostos com efeitos nos tecidos", concluiu o Dr. Groopman. “Seria ótimo se fosse determinado que não é um problema e que pudesse não ser. Ao mesmo tempo, os dados podem sugerir que as pessoas devam perder peso mais lentamente ou que, de alguma forma, deveriamos encontrar maneiras de capturar esses compostos à medida que fossem liberados no sangue. Também precisamos reconhecer que os compostos liberados a partir da gordura representam acúmulo de substâncias tóxicas ao longo da vida e precisamos abordar essas exposições ao longo da vida para determinar os riscos à saúde.”


Conhecimento é um processo lento e gradual que se obtém através de metodologia científica e precisa o tempo todo de que os pesquisadores façam diferentes tipos de perguntas com levantamento de hipóteses que podem ou não ser descartadas. Portanto esses tipos de estudos exploratórios, como o neste artigo, levanta hipóteses e abre o caminho para uma intrigante linha de pesquisa.

 

A possibildade de existir um risco potencial de liberação de POPs da gordura corporal que possa levar a consequências a longo prazo ainda está longe de ser confirmada definitivamente, mas, caso essa hipótese se torne plausível, pode levar a possíveis intervenções que deveriam ser consideradas para aumentar a excreção e limitar o aumento da exposição a POPs quando forem planejadas intervenções para perda de peso.

 

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