A terapia de transferência de células T é um tipo de imunoterapia que torna as próprias células humanas imunes mais capazes de atacar o câncer. Existem dois tipos principais de terapia de transferência de células T: a terapia de linfócitos infiltrantes de tumor (ou TIL) e terapia de células CAR-T (receptor quimérico de antígeno de linfócitos T).
Ambos envolvem a coleta das próprias células imunológicas do paciente, seu cultivo em grande número em laboratório e, em seguida, a devolução das mesmas ao paciente, através de uma veia periférica. A terapia de transferência de células T também é chamada de terapia de células adotivas, imunoterapia adotiva ou terapia de células imunes.
O processo de cultivo das células T no laboratório pode levar de duas a oito semanas. Durante esse período, o paciente pode eventualmente ser submetido a tratamentos quimioterápicos para se livrar de outras células do sistema imunológico (considerados no caso de terapia TIL).
Reduzir a população de células imunológicas ajuda as células T transferidas a ser mais eficazes no seu combate às células cancerosas pois, após esses tratamentos, as células T que foram cultivadas no laboratório são então devolvidas ao paciente para que possam finalmente tratar o câncer.
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A ideia por trás dessa abordagem é que os linfócitos que estão dentro ou perto do tumor já demonstraram a capacidade de reconhecer suas células tumorais. Mas pode não haver o número de células suficiente para eliminar o tumor ou superar os sinais que o tumor está liberando para suprimir o sistema imunológico. A obtenção e posterior infusão de um grande número destes linfócitos, que reagem com mais eficiência e de forma específica ao tumor a ser tratado, é vital na superação dessas barreiras.
A terapia com células CAR-T é semelhante à terapia TIL, mas os linfócitos T nesse caso são alterados no laboratório para que produzam um tipo de proteína conhecida como CAR (CAR significa receptor de antígeno quimérico), antes de serem cultivados e devolvidos ao paciente a ser tratado.
Os CARs são projetados para permitir que as células T se conectem a proteínas específicas na superfície das células cancerígenas, melhorando sua capacidade de ataque específico e direcionado a essas células. No caso, por exemplo, de leucemias linfoblásticas e linfomas de células B, o antígeno específico é o CD19.
Após o linfócito ser obtido, vai para o laboratório e é incubado juntamente com um vetor viral. Esse vírus tem um gene que produz a proteína quimérica, a qual será transferida para o material genético do linfócito T. Em seguida, o novo gene combinado passa a ser expresso e vai para a superfície do linfócito, onde vai atuar.
Na parte externa dessa célula produzida em laboratório, encontra-se a molécula com a proteína quimérica, cujo papel é o de de reconhecer a célula tumoral. Já na parte interna da célula, há um ativador do funcionamento do linfócito T, que propicia por sua vez a destruição das células tumorais.
Quais cânceres são tratados com terapia de transferência de células T?
A terapia de transferência de células T foi estudada pela primeira vez para o tratamento de melanoma metastático, porque os melanomas geralmente causam uma forte resposta imune e muitas vezes têm muitos TILs. Além do melanoma, a terapia TIL tem se demonstrada eficaz e promissora em outros cânceres, como o carcinoma de células escamosas do colo do útero e no colangiocarcinoma. No entanto, este tratamento ainda é considerado experimental.
As terapias CAR-T aprovadas pela agência Food and Drug Administration (FDA) americana para cânceres hematológicos até o momento são: tisagenlecleucel (para leucemia linfoblástica e linfoma difuso de grandes células B), axicabtagene ciloleucel (para linfoma difuso de grandes células B e linfomas foliculares de células B), brexucabtagene autoleucel (para leucemia linfoblástica e linfoma de células do manto), lisocabtagene maraleucel (para linfoma difuso de grandes células B) e idecabtagene vicleucel (para mieloma múltiplo).
No Brasil, a agência regulatória Anvisa aprovou recentemente o tisagenlecleucel para o tratamento de pacientes pediátricos e adultos jovens (até 25 anos de idade) com leucemia linfoblástica aguda, refratária ou a partir da segunda recidiva. O tratamento está igualmente indicado para pacientes adultos com linfoma difuso de grandes células B recidivado ou refrata%u0301rio, apo%u0301s duas ou mais linhas de terapia siste%u0302mica.
A terapia com CAR-T também tem sido extensivamente estudada e testada no tratamento de tumores sólidos, incluindo cânceres de mama e cerebral, mas o uso em tais cânceres ainda é experimental.
Quais são os efeitos colaterais da terapia de transferência de células T? A terapia de transferência de células T pode causar diversos efeitos colaterais, que os pacientes experimentam de forma e intensidades diferentes, e que dependerão do tipo de terapia utilizada, do tumor a ser tratado, de seu estadiamento e, obviamente, das condições clínicas do paciente ao receber esta terapêutica.
A terapia com células CAR-T pode causar um efeito colateral grave conhecido como síndrome de liberação de citocinas. Essa síndrome é causada quando as células T transferidas, ou outras células imunes que respondem às novas células T, liberam uma grande quantidade de citocinas no sangue.
As citocinas são substâncias imunes que têm muitas funções diferentes no corpo. Um aumento repentino em seus níveis pode causar febre, náusea, dor de cabeça, irritação na pele, batimento cardíaco acelerado, queda nos níveis da pressão sanguínea e dificuldades respiratórias. A maioria dos pacientes apresenta uma forma leve de síndrome de liberação de citocinas. Mas, em uma minoria, uma forma mais grave pode ocorrer, o que obviamente exigirá pronto tratamento para reversai do quadro.
Embora as células CAR-T sejam projetadas para reconhecer proteínas encontradas apenas em células cancerígenas, às vezes elas também podem reconhecer células normais. Dependendo de quais células normais são reconhecidas, isso pode causar uma série de efeitos colaterais, incluindo danos aos órgãos atingidos (fenômeno de auto-imunidade).
A terapia TIL pode causar síndrome de extravasamento capilar. Essa síndrome faz com que fluidos e proteínas vazem de pequenos vasos sanguíneos e fluam para os tecidos circundantes, resultando em pressão arterial perigosamente baixa. A síndrome de vazamento capilar pode levar à falência de múltiplos órgãos e choque. Por isso, também precisa ser rápida e adequadamente reconhecida e revertida.