Quando você se submete a um teste genético para uma avaliação de predisposição hereditária a câncer, espera uma resposta binária: sim ou não. Se sim, você tem uma alteração anormal em um gene que aumenta o risco de câncer, ou não, você não tem.
Essa informação é preciosa pois, em caso positivo, vai determinar medidas preventivas e também exames de rastreamento apropriados para o diagnóstico precoce dos cânceres relacionados às variantes gênicas identificadas.
Mas, às vezes, você pode não receber um claro "sim" ou "não". Você pode apenas receber um "talvez". Isso é o que você ouvirá se tiver uma variante de significado incerto, ou VUS, para abreviar.
Ao contrário das mutações prejudiciais que causam câncer ou das benignas que não causam, as chamadas VUS são assim classificadas pois não reunimos ainda pela literatura médica informações seguras e suficientes sobre seu papel na gênese do câncer. Ou seja, os dados sobre as VUS que dispomos até o momento não são suficientes para considerá-las prejudiciais ou inofensivas.
As variantes genéticas de significado incerto (VUS) são comuns?
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Como surgem as variantes genéticas?
Nossos corpos contêm 70 trilhões de células. Todos os dias, células velhas morrem e dão origem a novas. Cada vez que isso acontece, as novas células copiam o DNA das células antigas. Com tantas células, há um grande potencial para ocorrer um erro genético. É assim que surge uma variante genética, ou mutação. Todos nós temos muitas variações em nossos genes, e a grande maioria é inofensiva.
Como as variantes genéticas são classificadas?
O American College of Medical Genetics and Genomics categoriza as variantes genéticas em cinco níveis de risco classificados do mais para o menos grave:
1. Patogênica (nociva)
2. Provavelmente patogênica
3. Variante de significado incerto
4. Provavelmente benigna
5. Benigna (inofensiva)
Variantes patogênicas são menos comuns. É muito mais provável que você tenha um VUS ou uma variante benigna.
As variantes de significado incerto (VUS) já foram reclassificadas?
Uma VUS pode ser reclassificada como benigna após pesquisas e levantamentos revelarem que inúmeras pessoas sem câncer na população em geral carregam essa variante, ou modelos computacionais mostram que não tem impacto significativo no funcionamento genético.
Uma VUS também pode ser reclassificada como patogênica, mas isso é raro. Um estudo recente descobriu que 91% das variantes reclassificadas foram rebaixadas para "benignas", enquanto apenas 9% foram atualizadas para patogênicas.
A reclassificação de uma VUS pode levar meses, anos ou décadas. Algumas podem nunca ser reclassificados se os laboratórios não tiverem dados suficientes para a obtenção de uma conclusão definitiva.
Nosso conhecimento sobre variantes mudou ao longo do tempo?
Os pesquisadores costumavam acreditar que todas as variantes genéticas eram amplamente prejudiciais. Mas, há cerca de 20 anos, quando as primeiras sequências do genoma humano foram publicadas, os cientistas perceberam que, ao invés de serem raridades que quase invariavelmente prejudicam a saúde, as variantes ocorrem com frequência em todo o genoma humano. O ser humano médio carrega cerca de 400 variantes únicas, e a maioria de nós não é doente por causa delas.
Como saberei se minha VUS foi reclassificada?
Quando uma VUS é reclassificada, o laboratório que realizou o teste deve enviar um relatório revisado ao médico solicitante, explicando como e por que a variante foi reclassificada.
O médico então entrará em contato com você para explicar os resultados atualizados e o que eles significam para você e sua família. Por esse motivo, é muito importante que os pacientes mantenham seu endereço de correspondência, endereço de email e número de telefone atualizados junto ao médico ou clínica solicitante do teste, que em geral é especializada em Genética e Oncogenética. Outra sugestão é que, se você tiver uma VUS, compareça anualmente à consulta médica com o especialista. Nessa consulta o mesmo terá a oportunidade de reconsultar os bancos de dados, para saber se a variante sofreu alguma reclassificação.
Se eu tiver uma VUS, meus familiares devem ser testados?
Como não entendemos sua variante, geralmente não seria útil que os membros de sua família fizessem o teste. Os testes não esclareceriam seus riscos de câncer e, portanto, não mudariam a maneira como seus médicos já estão gerenciando seus cuidados médicos. Em vez disso, as decisões médicas devem ser baseadas em seu histórico pessoal ou familiar de câncer.
Há situações em que vários membros de uma família afetada pelo câncer são testados para se determinar se a mesma variante está presente naqueles com câncer ou ausente naqueles sem. Seu especialista irá esclarecer a você se a testagem dos outros membros da família ajudará a classificar sua variante.
Como minha VUS altera meu tratamento médico?
As diretrizes emitidas pelo American College of Medical Genetics and Genomics especificam que "uma variante de significado incerto não deve ser usada na tomada de decisões clínicas". Rastreamentos mais intensivos ou precoces ou uma cirurgia redutora de risco (como uma mastectomia bilateral ou a retirada das tubas uterinas e ovários de forma profilática) podem ser desnecessários e potencialmente prejudiciais para pacientes cujas variantes são posteriormente descobertas como benignas. "Esperar para ver" é o consenso padrão entre os especialistas e oncogeneticistas.
Em alguns casos, seu médico pode lhe dizer se sua variante é menos preocupante ou mais preocupante do que o normal, com base em seu histórico familiar combinado com as informações disponíveis sobre sua variante específica.
Como a maioria das pessoas reage ao saber que tem uma VUS?
A maioria dos pacientes considera o diagnóstico de VUS mais tranquilizador do que preocupante. Eles estão aliviados por saber que nenhuma variante patogênica conhecida foi detectada. Alguns, no entanto, acham os resultados ambíguos e preocupantes. Eles têm dificuldade em lidar com a incerteza de um VUS.
Antes que os pacientes sejam submetidos a testes genéticos, eles devem ser orientados por um especialista sobre os riscos e limitações dos testes. Se eles estão particularmente ansiosos, podemos sugerir que eles abandonem completamente os testes ou testem menos genes para diminuir a chance de encontrarmos uma VUS. Lembramos a eles que a maioria das VUS é inofensiva. Mas mesmo com o aconselhamento genético correto, a incerteza pode acompanhar os portadores e causar-lhes angústia e mesmo fobia.
Como os especialistas podem aprender mais sobre VUS?
Para entender o papel de uma variante no câncer, os especialistas devem testar milhões de pessoas e compartilhar seus dados. Se uma VUS for encontrada em um número significativo de pessoas que têm câncer, mas ausente naquelas que não têm, há uma probabilidade maior de que ela possa estar associada a maiores riscos de câncer.
Mas, independentemente de quão extensos sejam os bancos de dados e quantas pessoas sejam submetidas a testes genéticos, a incerteza nunca desaparecerá completamente.
Sequenciando também o RNA
Mais recentemente, a análise (sequenciamento) germinativa combinada do DNA e do RNA demonstrou fornecer informações mais precisas e definitivas sobre o significado de uma VUS.
O sequenciamento de RNA começa a se mostrar promissor para se entender como uma variante de DNA pode interromper a transcrição normal para RNA, bem como as modificações pós-transcricionais ou a estrutura proteica codificada por aquele determinado gene e suas variantes.
Adicionalmente, o sequenciamento do RNA pode identificar variantes nos chamados sítios de emenda (splice site), que ocorrem em cerca de 11% das VUS já catalogadas. Os genes contêm seções codificantes (éxons) e não codificantes (íntrons) que são transcritas em mRNA (RNA mensageiro). Este mRNA é processado cortando-se as porções não codificantes e unindo-se as porções de codificação. Variantes patogênicas podem romper os sítios de splice em ambas as extremidades do éxon, criando novos sítios de splice, ou perturbar regiões regulatórias profundas dentro dos íntrons. Todos esses mecanismos afetam negativamente a expressão do gene.
Estudos mais recentes confirmaram a utilidade clínica da adição de sequenciamento de RNA a testes genômicos para coortes de indivíduos com doença mendeliana não diagnosticada, aumentando seu rendimento diagnóstico em cerca de 18%, pois consegue com precisão esclarecer a patogenicidade de inúmeras VUS encontradas através do sequenciamento do DNA.