Saúde Plena

ONCOLOGIA

É possível falar em cura para pacientes com câncer metastático de pulmão?



Nos Estados Unidos, a mortalidade baseada na incidência relacionada ao câncer pulmonar de células não pequenas diminuiu aproximadamente 3% a cada ano desde 2008 em homens;  durante o mesmo período, a mortalidade feminina diminuiu de 2% a 4% ao ano. 


Embora vários fatores sejam provavelmente responsáveis %u200B%u200Bpela redução da mortalidade, está claro que o advento de várias novas opções terapêuticas melhorou as perspectivas para pacientes com câncer de pulmão. 

Quando consideramos todos os estádios da doença, nos últimos anos, a taxa de sobrevivência de pacientes com câncer de pulmão aumentou a ponto de, agora, quase um quarto dos pacientes com câncer de pulmão estar vivo 5 anos após o diagnóstico. Essa nova estatística é destacada no relatório State of Lung Cancer da American Lung Association (ALA), publicado recentemente. 

O câncer de pulmão é altamente curável em seus estádios iniciais e, mesmo que não seja no estádio inicial, existem tratamentos que estão causando um impacto muito positivo na sobrevida dos pacientes, incluindo modernas técnicas de radioterapia, radiocirurgia, drogas alvo-moleculares e imunoterapia. 



O relatório observa que o risco de ser diagnosticado com câncer de pulmão varia consideravelmente nos Estados Unidos. Por exemplo, as taxas de diagnósticos de câncer de pulmão são quase 2,5 vezes maiores em Kentucky do que em Utah. No geral, a incidência está diminuindo. 

Nos últimos 5 anos, a taxa de casos novos diminuiu 10% nacionalmente, apontam os autores. No entanto, em quase metade dos casos, a doença é diagnosticada em fases tardias.

Atualmente, cerca de 24% dos casos de câncer de pulmão são diagnosticados em estádios iniciais, observa o relatório, mas, novamente, isso varia nos Estados Unidos. 

A taxa mais alta (30%) está em Massachusetts, e a taxa mais baixa (19%) está no Havaí. Mas podemos afirmar que a porcentagem de casos de câncer de pulmão diagnosticados precocemente tem aumentado constantemente, presumivelmente em parte por causa da introdução de exames de rastreamento com tomografia computadorizada de baixa dosagem para indivíduos de maior risco (como fumantes e ex-fumantes).


No entanto, em todo o país, apenas 5,7% dos indivíduos com alto risco de câncer de pulmão foram submetidos a exames anuais de tomografia computadorizada de baixa dosagem, observa o relatório.

Já quando avaliamos os casos mais avançados, o que observamos é que a sobrevida mediana vem aumentando progressivamente desde que novos tratamentos passaram a ser utilizados, como as terapias alvo-moleculares e, especialmente a imunoterapia. 

O câncer de pulmão em estádio  4 (também chamado de câncer de pulmão metastático) é o câncer de pulmão que se espalhou (metastatizou) para outras partes do corpo fora dos pulmões, como cérebro, ossos e fígado. 

Os cânceres de pulmão em estádio 4 são comuns e muito difíceis de tratar. Pacientes com câncer de pulmão metastático costumavam viver por meses;  agora, com imunoterapias, terapias direcionadas e terapias locais de baixo risco, esperamos que cada vez mais desses pacientes vivam anos.


Portanto, suponho que não devamos ficar surpresos  que os oncologistas possam agora se encontrar debatendo se o câncer de pulmão metastático ainda é uma doença categoricamente incurável.
 
Os resultados em alguns pacientes com câncer de pulmão avançado estão desafiando nossas expectativas, pois os pacientes estão quebrando as barreiras de sobrevivência de 5 anos. Por isso devemos considerar um subconjunto de pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas metastático efetivamente curado.

Uma preocupação é que respostas prolongadas, mesmo intervalos prolongados sem evidência de doença, não devem ser consideradas sinais de que o câncer não terá recidiva. 

Meus pacientes com câncer pulmão com uma alteração genômica alvo como EGFR, ALK, ROS1 ou BRAF agora rotineiramente atingem uma sobrevida mediana de vários anos e, ocasionalmente, 4 a 5 anos sem nenhuma evidência de doença. 

No entanto, sabemos que a grande maioria acabará por desenvolver resistência adquirida que torna o câncer mais difícil de tratar. 

Também sabemos que, se interrompêssemos a terapia direcionada, quase todos esses pacientes progrediriam em semanas a meses.  Além disso, muitos de nós temos pacientes que apresentam uma recaída tardia. Mas tenho alguns pacientes com câncer de pulmão metastático que não apresentam evidências da doença há mais tempo do que eu jamais pensaria ser possível. 


Alguns desses pacientes permanecem sem tratamento por anos e sem qualquer sinal de que o câncer vai voltar, especialmente os que submetem aos modernos imunoterápicos, associados ou não a quimioterápicos. Diante disso, devemos pelo menos considerar que esses pacientes possam efetivamente estar curados.

A imunoterapia atualmente consiste no emprego de anticorpos chamados de “ Inibidores de checkpoint” ou dia pontos de checagem imunológico. Eles utilizam o próprio sistema imunológico do paciente para combater as células tumorais, aumentando a ativação e a proliferação das células T (linfócitos de defesa que destroem as células tumorais), resultando assim em uma resposta antitumoral mais efetiva.

Na verdade, esta nova classe de imunoterapia desliga um complexo sistema de mascaramento imunológico que as células tumorais utilizam para não serem reconhecidas como invasoras pelo organismo, permitindo então que o sistema imune destrua estas células. 


Um estudo publicado no New England Journal of Medicine recentemente demonstrou  que um imunoterápico (pembrolizumabe) combinado com a quimioterapia pode ser mais eficaz do que a quimioterapia sozinha para o câncer de pulmão de células não escamosas metastático em estádio 4.

Sabemos  que o sistema imunológico pode trabalhar para controlar perpetuamente as doenças muito depois do término do tratamento, então não estamos sendo falsos quando transmitimos a esperança de que a vida de um paciente não seja interrompida pelo câncer. 

Para mim, essa é uma definição justa de cura, mesmo que haja um risco calculável, mas excepcionalmente baixo, de recaída em um paciente sem sinais de doença daqui a uma década. 

Reconheço que não temos dados longitudinais para dizer algo definitivo, mas me encontro na posição incomum de ser o otimista, de querer dar esperança aos pacientes ao mesmo tempo em que compartilho dessa incerteza.


Tenho sido testemunha ocular dos grandes e notáveis avanços no tratamento desta doença: de pacientes tratados com quimioterapia que sobreviviam em média 5 a 6 meses a partir do diagnóstico no fim da década de 80, hoje acompanho vários pacientes tratados com estas modernas e revolucionárias terapias que já ultrapassaram 3, 4 ou mesmo mais de 5 anos de sobrevida sem evidências de doença e com excelente qualidade de vida, a despeito da doença ter sido diagnosticada em um estádio avançado.

Para um oncologista que já ultrapassou três décadas de especialidade, tal feito me enche de satisfação, júbilo e sensação do dever médico cumprido. E as boas novas não deverão parar por aí!

Além das combinações de diferentes imunoterápicos entre si, eles também tem sido utilizados com sucesso em estádios mais precoces da doença, como tratamento pré-operatório ou complementar ao tratamento cirúrgico (adjuvante) ou quimioradioterápico (terapia de consolidação ou manutenção).