Em agosto passado, falei detalhadamente sobre os tipos de tecnologias empregadas para a produção de vacinas e sobre as que estavam em desenvolvimento contra a COVID-19.
Agora, com a divulgação dos resultados promissores da capacidade de imunização de algumas delas, abordarei novamente o tema para, assim, combater algumas informações equivocadas que circulam no mundo on-line.
saiba mais
A genômica e o desenvolvimento de vacinas para a COVID-19
Impactos da pandemia de coronavírus no aumento da mortalidade por câncer
Entenda como a genética individual influencia a gravidade e o prognóstico da COVID-19
Taxas de câncer crescem entre adolescentes e jovens adultos dos EUA
Protetor solar é ferramenta eficaz para prevenção do melanoma
Destacarei em especial as vacinas AZD1222, criada pela Universidade de Oxford/AstraZeneca; a Coronavac, desenvolvida no Brasil pela chinesa Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan, cujos resultados de fase III ainda não foram apresentados; e a vacina da Pfizer/BioNTech, feita com mRNA, sendo no momento considerada a mais eficaz e já em utilização no Reino Unido.
Vacina Oxford/AstraZeneca - AZD1222
A vacina AZD1222, desenvolvida pela Universidade de Oxford/AstraZeneca, teve estudo de fase III publicado na revista The Lancet. Os dados revisados confirmam que a eficácia do tratamento com duas doses alcança 70,4% após 14 dias de inoculação da dose complementar. Além disso, foi confirmado que a taxa de imunização subiu para 90% nos voluntários que receberam apenas meia dose na primeira injeção.
A vacina de Oxford é uma das vacinas desenvolvidas utilizando um adenovírus que infecta chimpanzés modificado para não produzir infecção nas pessoas vacinadas. Dentro desse adenovírus, os pesquisadores inseriram uma sequência genética da proteína S, que é utilizada pelo vírus para se conectar às células em nossas vesículas pulmonares.
Após a vacinação, é produzida a proteína de espícula (spike) de superfície do coronavírus. Em contato com ela, nosso sistema imunológico aprende a atacar o coronavírus, se mais tarde o corpo for infectado por um vírus ativo. Uma característica de extremo interesse é que a vacina de Oxford é dupla, ou seja, ela estimula tanto a imunidade humoral (produção de anticorpos) quanto a celular (Linfócitos T).
Além disso, não é vírus replicante, portanto, não pode causar uma infecção contínua no indivíduo vacinado. Isso também torna mais segura a vacinação de crianças, idosos e qualquer pessoa com uma condição preexistente, como diabetes.
Já existe, inclusive, um pré-acordo com o Brasil para a aquisição dessa vacina. O problema é que os resultados da fase III ficaram confusos: as doses plenas ofereceram uma taxa de imunização inferior à imunização com meia dose.
Então, acredito que serão necessários estudos complementares para definir qual é a dose correta. Mas é uma vacina extremamente promissora. Seus resultados foram os primeiros a serem divulgados em uma revista de porte. Mesmo com média de taxa de imunização em 70%, trata-se de um número espetacular.
Poderá ser uma boa opção, principalmente, se considerarmos as vantagens de não precisar de refrigeração especial, gelo seco etc. para conservação e transporte.
Poderá ser uma boa opção, principalmente, se considerarmos as vantagens de não precisar de refrigeração especial, gelo seco etc. para conservação e transporte.
Vacina Coronavac da Sinovac/Butantã
Outra vacina que tem rendido muita discussão é a Coronavac. Desenvolvida no Brasil pela chinesa Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan, não teve ainda os dados dos estudos de fase III apresentados.
Contudo, pelo que foi apresentado nas fases anteriores, acredito que, após serem apresentados resultados positivos na última fase, a vacina terá todos os predicados para ser utilizada por nossa população. Sua logística é a mais simples, não precisa de refrigeração tão forte, como a vacina de RNA da Pfizer, por exemplo.
Contudo, pelo que foi apresentado nas fases anteriores, acredito que, após serem apresentados resultados positivos na última fase, a vacina terá todos os predicados para ser utilizada por nossa população. Sua logística é a mais simples, não precisa de refrigeração tão forte, como a vacina de RNA da Pfizer, por exemplo.
A Coronavac é uma vacina de vírus inativado. Ou seja, contêm vírus que foram mortos, inteiros ou em pedaços. Quando nosso sistema imunológico detecta esses ’’corpos estranhos’’, mais especificamente a proteína S do vírus da COVID-19, ele aprende a reconhecer o risco do invasor.
Se formos infectados pela versão ativa do vírus no futuro, nosso sistema imunológico reconhecerá a ameaça e responderá mais rapidamente para nos proteger da infecção - portanto, não ficaremos doentes.
Se formos infectados pela versão ativa do vírus no futuro, nosso sistema imunológico reconhecerá a ameaça e responderá mais rapidamente para nos proteger da infecção - portanto, não ficaremos doentes.
Vacina de mRNA da Pfizer/BioNTech
Por fim, temos a vacina da Pfizer/BioNTech. Feita com mRNA, ela apresentou uma taxa de imunização de até 95% na fase III dos estudos. Esses resultados foram publicados na última quinta-feira (10/12) no NEJM - The New England Journal of Medicine, confirmando a segurança e eficácia da vacina que já está em processo de aprovação emergencial na Agência de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA - Food and Drug Administration). A distribuição da vacina já está ocorrendo no Reino Unido e em breve estará no Canadá.
Trata-se da vacina mais promissora, porém, que enfrenta aqui no Brasil as dificuldades de armazenamento ideal, pois é necessária uma refrigeração de -70%, o que pode ser difícil num país tão vasto como o nosso. Além da Pfizer/BioTeck, a farmacêutica americana Moderna também produziu sua vacina com o mesmo conceito de mRNA, conseguindo 94,5% de taxa de imunização.
Além da Pfizer/BioTeck, a farmacêutica americana Moderna também produziu sua vacina com o mesmo conceito de mRNA, conseguindo 94,5% de taxa de imunização. As vacinas de mRNA contra COVID-19 inovam a medicina ao utilizarem pedaços da fita de RNA do vírus da COVID-19. Estes pedaços de RNA fornecem instruções para que nossas células sintetizem um tipo inofensivo de proteína S do vírus. A proteína de espícula ou “spike”(S) é encontrada na superfície do vírus que causa a COVID-19 (o SARS-CoV-2).
Uma vez que as instruções (mRNA) estejam dentro das células musculares do braço humano, as células as usam para fazer o pedaço de proteína.
Como agem no nosso organismo
Depois que o pedaço de proteína é feito, as células decompõem as instruções e se livram delas. Em seguida, as células passam, então, a exibir essa proteína em sua superfície.
Com isso, nosso sistema imunológico desenvolve a capacidade de reconhecer que a proteína não pertence a esse local e começa a construir uma resposta imunológica e a produzir anticorpos, como o que acontece na infecção natural contra COVID-19, assim como linfócitos do tipo T que também vão combater os vírus que porventura ameacem nos infectar. Todas estas etapas fazem, então, com que nosso organismo aprenda como se proteger contra infecções futuras.
Com isso, nosso sistema imunológico desenvolve a capacidade de reconhecer que a proteína não pertence a esse local e começa a construir uma resposta imunológica e a produzir anticorpos, como o que acontece na infecção natural contra COVID-19, assim como linfócitos do tipo T que também vão combater os vírus que porventura ameacem nos infectar. Todas estas etapas fazem, então, com que nosso organismo aprenda como se proteger contra infecções futuras.
Fatos relevantes sobre as vacinas de mRNA COVID-19
As vacinas de mRNA não podem causar a infecção por COVID-19 nos vacinados, pois não usam o vírus vivo ou mesmo inativado que causa a COVID-19. De maneira alguma afetam ou interagem com nosso DNA, pois nunca entram no núcleo das nossas células, onde fica o nosso DNA (material genético). As células se quebram e se livram do mRNA logo depois de terminar de usar as suas instruções.
Pelas informações apresentadas, é possível já adiantar que, após a aprovação dessas vacinas pelos órgãos reguladores, não precisaremos escolher entre uma ou outra vacina. Todas elas poderão ser utilizadas, pois, temos uma população muito grande a ser imunizada. Será necessária uma somatória de esforços e tecnologias na luta contra o coronavírus.
*André Murad é oncologista, pós-doutor em genética, professor da UFMG e pesquisador. É diretor-executivo na clínica integrada Personal Oncologia de Precisão e Personalizada e diretor Científico no Grupo Brasileiro de Oncologia de Precisão: GBOP. Exerce a especialidade há 30 anos, e é um estudioso do câncer, de suas causas (carcinogênese), dos fatores genéticos ligados à sua incidência e das medidas para preveni-lo e diagnosticá-lo precocemente.
Quer falar com o colunista? Envie um e-mail para andremurad@personaloncologia.com.br