Com qual idade devo procurar um geriatra?

Hoje pela manhã, em uma conversa despretensiosa na academia, minha colega de horário perguntou minha profissão. Sou médica geriatra, respondi. Ela logo se entusiasmou, parou seus abdominais e fez a pergunta que mais ouço na vida: com qual idade devo procurar um geriatra? Na verdade, essa pergunta só perde para: posso assistir TV, mamãe?

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Resolvi escrever aqui a minha resposta, mas para isso terei que explicar um pouco mais sobre a geriatria. A geriatria é uma especialidade médica que cuida da saúde e das doenças dos idosos. A forma que o médico geriatra exerce seu trabalho é avaliando seu paciente de uma forma ampla e ao mesmo tempo única.

Em uma consulta geriátrica, perguntamos a respeito do que mais incomoda nosso paciente, buscamos seu histórico de saúde, listamos os medicamentos usados e analisamos os exames, como todos os médicos fazem. Então. nós somos um clínico de idoso? Não, definitivamente não somos.

Toda vez que um geriatra olha para o paciente à sua frente, ele pensa: o que posso fazer para que essa pessoa seja a melhor versão de si mesma? Como posso interferir agora para que ele possa usufruir sua vida com maior liberdade e felicidade? Não vou entrar aqui no conceito de felicidade, pois certamente eu correria um grande risco de ser superficial, deixo isso aos filósofos e estudiosos da psiquê humana.

Para que uma pessoa seja a melhor versão de si mesma, é preciso que ela tenha autonomia (capacidade de tomar suas decisões) e independência (capacidade de realizar suas atividades), além de estar com suas doenças bem controladas e suas prevenções em dia. É importante também que ela tenha um bom capital social, seja através de sua inserção familiar, sua participação na comunidade ou seu engajamento na sociedade. Encontrar os amigos semanalmente, como faz minha sogra, aumenta o capital social e caminhar pelo bairro e conversar com a dona da farmácia diariamente, como faz meu pai, também. Estudos mostram que quanto maior o capital social maior será a longevidade.

Cuidamos da autonomia de nossos pacientes quando procuramos e tratamos problemas como depressão, ansiedade, demência e outras doenças que comprometem sua capacidade de tomar decisões. Cuidamos da independência das pessoas quando avaliamos sua capacidade de andar e realizar suas atividades sozinhas e receitamos exercícios físicos específicos para cada situação e dietas (muitas vezes para ganho muscular). Quando encaminhamos aos colegas encarregados da reabilitação (fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais), ou quando indicamos tratamentos para problemas que pioram a capacidade das pessoas se comunicarem, como os auditivos e visuais, também estamos ajudando nossos pacientes a serem mais independentes.

O produto de uma consulta geriátrica não é uma receita e alguns pedidos de exames, é um Plano de Cuidados que inclui: remédios, exames, exercícios físicos, alimentação, vacinas e atitudes. Então, com qual idade devo procurar um geriatra?

A maioria dos pacientes dos médicos geriatras tem mais de 60 anos e são portadores de doenças graves ou limitantes, como demência de Alzheimer, doença de Parkinson, artrose, glaucoma, diabetes e hipertensão. É muito comum as pessoas terem várias doenças ao mesmo tempo e usar diversos medicamentos após os 60 anos.

Quanto mais frágil é uma pessoa, mais ela precisa desse olhar abrangente sob sua saúde e mais está indicado um acompanhamento com um médico geriatra. A periodicidade desse acompanhamento depende da gravidade de cada caso. O médico geriatra atua como uma maestro em uma orquestra, ele harmoniza o cuidado do idoso e não deixa que este se faça de forma segmentada.

Então, o geriatra é para depois dos 60? Não! Você deve procurar um geriatra aos 30, aos 40, aos 50 ou quando você perceber e desejar realizar mudanças que te ajudarão a ser a melhor versão de você mesmo, hoje, amanhã ou depois dos 60 anos.

E agora quem faz a pergunta sou eu: e você, o que você quer ser quando envelhecer?

Ficou com alguma dúvida? Terei o prazer de respondê-la

julianacicluz@gmail.com

Geriatra, especialista em cuidados paliativos