Nos últimos tempos, circulam na internet pelo menos três alertas que relacionam o hábito de roer ou de aplicar unhas postiças a doenças no aparelho ungueal, incluindo o câncer e o aumento de alergias. O mais grave diz respeito ao quadro da jovem australiana Courtney Whithorn, de 20 anos, que tinha o hábito de roer unhas e precisou amputar o polegar da mão direita após diagnóstico positivo para um tipo raro de câncer de pele, o melanoma acrolentiginoso subungueal. Outro é o da miss Illinois, Karolina Jasko. Ela também descobriu um melanoma e o relacionou à ampla exposição ao longo dos anos à luz UVA de um aparelho utilizado para secar a cola durante a fixação de unhas postiças.
Há, ainda, um alerta geral da Associação Britânica de Dermatologistas de que produtos químicos acrílicos, os principais ingredientes em unhas postiças (de acrílico, unhas de gel e unhas de polimento de gel), estão causando uma epidemia de alergia de contato no Reino Unido e na Irlanda. No Brasil, país cuja população tem a cultura de fazer a unha em salão de beleza, especialistas também temem o aumento de casos de alergia, entre outros problemas. Mas é preciso distinguir mitos e fatos para avaliar o que realmente é motivo de atenção do que é alarmismo.
Atenta ao que circula na web a respeito da saúde das unhas, Tatiana Gabbi, médica dermatologista filiada à Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), publica vídeos explicativos no Instagram a respeito de casos polêmicos, como o ocorrido na Austrália (https://www.instagram.com/dratatianagabbi/). Em conversa com o Bem Viver, ela explica: “De fato, roer as unhas não é um hábito saudável, uma vez que, segundo a literatura e a experiência clínica, existe uma relação cada vez mais discutida entre traumatizar a unha e desenvolver melanoma ungueal. No entanto, não é possível afirmar que o fato de roer as unhas tenha provocado a doença”, afirma.
CASOS RAROS
A dermatologista publicou estudo em que relata 21 casos de melanoma ungueal a que atendeu no consultório durante 10 anos, em pacientes de ambos os sexos. Em nenhum deles, frisa, é possível relacionar a doença a algum hábito reincidente, como roer as unhas ou fazer uso de material sintético para cobri-las. “O melanoma na região é bastante raro. Mas pode ocorrer e, no futuro, talvez seja possível determinar as causas. Por enquanto, o que se sabe é que provocar traumas na região não é indicado. E isso inclui tanto o hábito de roer quanto os relacionados à vaidade, como tirar as cutículas, lixar, aplicar unhas postiças. Todos eles provocam trauma e retiram a proteção natural do aparelho ungueal, o que pode precipitar infecções, inflamações, machucar e encravar.”
Na análise do caso da miss Illinois, a dermatologista também descarta a relação direta entre a luz UVA do aparelho para secagem das unhas postiças ao desenvolvimento do melanoma. “Já existem trabalhos científicos mostrando que a luz aplicada para secagem não causa mais insolação que o Sol. Ou seja, a irradiação é menor que a solar. Então, não podemos afirmar que o mecanismo de surgimento do câncer de unha está relacionado à exposição à luz violeta. Até porque, há duas proteções naturais envolvidas aí, a matriz e a dobra ungueal. Nesse caso, acredito se tratar de alarmismo.”
Já as alergias provocadas pelo uso de produtos químicos nas unhas é real e também merecem atenção. “É preciso ficar atento a sinais de vermelhidão e coceira nessas regiões”, aponta.
Aos pacientes, a médica não indica o uso prolongado de esmaltes, de unhas postiças e nem a retirada da cutícula. “o uso contínuo de unhas postiças pode mascarar o surgimento de infecções, bactérias, fungos ou outras lesões. Quanto às cutículas, indico apenas a hidratação local”, insiste.
Ela ensina a identificar sinais que podem estar relacionados a doenças das unhas, que devem ser observados com atenção. “Alterações na textura, quebra recorrente (principalmente na direção da faixa) e o surgimento de manchas verticais e escuras, inclusive em crianças, merecem investigação clínica.”
As unhas merecem atenção!
A dermatologista Tatiana Gabbi diz que fazer as unhas no salão com esmaltação não é proibido. Porém, indica alguns cuidados:
» deixe a cutícula ou retire apenas o excesso, mantendo a proteção natural da unha;
» lixar em excesso desorganiza as camadas de queratina, com risco para lesões na estrutura da unha;
» prefira esmaltes com base em água (menos reativos) e removedores livres de toxinas;
» nunca arranque o esmalte por fricção, o que pode causar lesão na queratina natural das unhas;
» em intervalos regulares, deixe a unha sem cobertura de esmalte ou base; aproveite para observar seu aspecto e fique atento a sinais de alterações;
» por fim, evite, sempre, qualquer tipo de trauma na região.
Veja quem pode usar unhas postiças
“O uso não é indicado para pessoas com doenças na pele ou nas unhas. Por exemplo: alérgicos aos componentes do adesivo, pessoas com a pele sensível, com psoríase da unha e infecção devem evitar, pois o trauma pode piorar a doença da pele e unhas”, explica Valéria Marcondes, dermatologista, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD).
Alergias x unhas artificiais
A também dermatologista Cláudia Marçal explica que as reações alérgicas podem envolver o afrouxamento das unhas ou uma vermelhidão com comichão, não apenas nas pontas dos dedos, mas potencialmente em qualquer parte do corpo que tenha entrado em contato com as unhas, incluindo as pálpebras, face, pescoço e região genital. Muito raramente, podem ocorrer sintomas como problemas respiratórios. “Além da alergia, todas as formas de alongamento trazem algum dano à unha original.”
“Muitas vezes, a retirada de unhas artificiais deixa a lâmina natural mais fina e quebradiça. Assim, só faça e retire o material com auxílio profissional”, indica a médica. Entre aplicações, preste atenção a sinais de bactérias – pontos esverdeados nas unhas –, e fungos, pontos amarelados e pretos. “Sempre que aparecerem esses sintomas, deve-se retirar o material. Para recuperar as unhas, é necessário ficar, no mínimo, seis meses sem reaplicar o produto e deixá-las curtas, além de seguir a orientação médica.”