Game ensina jogadores a evitar o consumo de doces e a comer com saúde

Game criado por americanos ensina jogadores a evitar o consumo de doces e a fazer as melhores escolhas nutricionais. Testes mostram que voluntários perdem até 3,1% do peso após dois meses de treinamento cerebral

por Correio Braziliense 18/05/2019 16:54
(foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press)
(foto: (foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press))
Um jogo de computador poderá ser usado para reduzir a ingestão de açúcar. O sistema desenvolvido por cientistas americanos é baseado em um tipo de treinamento cerebral que visa atingir uma parte do cérebro que inibe os impulsos alimentares. Partidas regulares, portanto, resultam em benefícios fisiológicos aos jogadores. “Eliminar o açúcar da dieta de uma pessoa resulta em perda de peso e redução do risco à saúde”, resume Evan Forman, diretor do Center for Weight, Eating and Lifestyle Science (WELL Center), da Drexel University, e principal autor do estudo, divulgado na revista Journal of Behavioral Medicine. 

Para o cientista, ensinar exercícios físicos e sugerir os alimentos não são cuidados suficientes para ajudar na redução das medidas. O professor de psicologia explica que o cérebro humano é programado para desejar doces e, por isso, muitas pessoas sentem dificuldade em tirar esses alimentos da dieta. Foi por esse motivo que ele iniciou a pesquisa em 2016. Desde então, vem realizando experimentos para aperfeiçoar o projeto. A pesquisa é a primeira a examinar o impacto desse tipo de controle inibitório altamente personalizado usando treinamentos repetidos para a perda de peso em casa.

Forman e a equipe resolveram personalizar um jogo baseado em treinamento cognitivo já existente, o Diet Dash. Na versão ajustada, aparece na tela do computador um carrinho de supermercado, com prateleiras ao lado. O jogador tem que escolher os alimentos saudáveis à disposição na mercearia. Compras erradas resultam em perdas de ponto. A dificuldade vai aumentando de acordo com a resistência do jogador.

Cento e nove pessoas, com idade entre 18 e 65 anos, participaram de testes com o jogo. Os voluntários também estavam acima do peso e eram viciados em doces. Antes de iniciar os testes, eles assistiram a um workshop para ajudá-los a entender por que o açúcar é prejudicial à saúde e para aprender quais alimentos devem ser evitados e quais métodos podem ser usados em prol do emagrecimento.

“Orientações como essas dão estratégias para os participantes seguirem uma dieta sem açúcar. No entanto, levantamos a hipótese de que eles precisariam de uma ferramenta extra para ajudar a administrar os desejos de doces. Por isso, pensamos em criar o jogo”, explica Forman. O trabalho contou com a ajuda de Michael Wagner, professor e chefe do Departamento de Mídia Digital do Westphal College of Media
Arts & Design, e de um grupo de estudantes de Mídia Digital da Drexel University.

Com distração

Os participantes do experimento jogaram por alguns minutos, diariamente, durante seis semanas. Depois, as partidas passaram a ser semanais, durante 15 dias. Enquanto faziam compras na mercearia, eram distraídos com imagens de fundo, sons distintivos e música. “Nós construímos um jogo de computador em que as pessoas tinham que praticar a mudança de pensamento e parar de se movimentar em direção aos alimentos doces. Essa capacidade cerebral é chamada controle inibitório”, explica Forman.

Mais da metade dos participantes relatou que o jogo os ajudou a perder até 3,1% do peso corporal em oito semanas. Eles também confessaram que o treinamento diário foi satisfatório e passou a fazer parte da rotina. “Os resultados do estudo oferecem suporte qualificado para o uso de um treinamento cognitivo computadorizado para
facilitar a perda de peso”, acredita o pesquisador.

Aprendizagem

De acordo com os cientistas, os treinamentos diários preparam o cérebro para não reagir aos impulsos de ingerir doce. De acordo Mariana Morais, professora de psicologia da Faculdade Estácio de Macapá, a base de um treino cognitivo está na aprendizagem, isto é, acontece a partir da mudança gradual de algum padrão de
comportamento. “Na prática, o indivíduo torna-se capaz de estabelecer novas relações entre informações que anteriormente podiam não ter relevância ou não eram conhecidas”, explica.

Emílio Takase, professor-associado de psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), ressalta que a prática é fundamental para a mudança de pensamento. “A pessoa vai tomando consciência da alimentação para buscar a mudança comportamental. Mas, para afirmar que o estudo funciona, é preciso provar cientificamente após o término das sessões.”

O estudo também constatou que poucos homens reduziram o consumo de açúcar e
perderam peso em comparação com as mulheres. Agora, a equipe de Forman realiza testes só com homens, em busca de identificar as razões dessa diferenciação. Além disso, desenvolve uma adaptação do jogo para realidade virtual e pretende lançar a solução no mercado em um ano.

Palavra de especialista

Sem exagerar na dose
“De uma maneira geral, esse tipo de tecnologia deve ser usado com limites. Apesar de o jogo ajudar as pessoas com o hábito de comer menos doce, há riscos no uso do computador de forma exagerada. Esse jogo é usado para beneficiar os usuários, pois trabalha a concentração, a memorização, a agilidade e várias outras habilidades. Seu uso consciente e equilibrado é fundamental.” 

Anna Lucia Spear, professora colaboradora da pós-graduação sobre Dependência Digital e Temas Relacionados do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

* Estagiária sob supervisão de Carmen Souza