Mulheres obesas precisam de mais cuidados na prevenção do câncer de mama, segundo um estudo sueco do Instituto Karolinska, apresentado no encontro anual da Sociedade Radiológica da América do Norte. O trabalho mostrou que aquelas com índice de massa corporal (IMC) acima de 30 correm o risco de descobrir os tumores apenas quando eles já estão grandes e, portanto, mais difíceis de tratar e curar. Assim, os pesquisadores sugerem que pessoas com o perfil realizem a mamografia com mais frequência. Médicos brasileiros, porém, questionam essa recomendação.
Para realizar o estudo, os cientistas coletaram dados de mais de 2 mil mulheres diagnosticadas com câncer de mama em Estocolmo, na Suécia, entre 2001 e 2008. “Realizamos essa pesquisa para entender por que algumas mulheres não são diagnosticadas até que o tumor esteja grande”, afirma Fredrik Strand, principal autor do trabalho. “Examinamos muitas possíveis causas e descobrimos que o índice de massa corporal e a densidade mamográfica estão relacionadas a isso”, explica. Segundo o pesquisador, a descoberta de que o IMC elevado torna difícil a detecção dos tumores, mesmo nos exames, foi uma novidade.
Densidade
Os pesquisadores acompanharam as pacientes até 2015 e concluíram que tumores em mulheres com IMC elevado ou com a mamária densa não foram detectados até que já tivessem chegado a 2cm, o tamanho de um amendoim. Esse parâmetro é importante, pois é o que separa o estágio 1 do 2 da doença. Além disso, trata-se do tamanho em que o nódulo se torna palpável, o que favorece o diagnóstico precoce.
O mastologista José Roberto Filassi, chefe do Setor de Mastologia da Divisão de Clínica Ginecológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), esclarece que a densidade da mama é o que dificulta o diagnóstico da doença e lembra que algumas mulheres não obesas também podem apresentar esse problema. “A mama densa não tem sensibilidade, assim fica mais difícil rastrear o tumor. Então, quem precisa de uma vigilância maior são mulheres com a mama densa, sendo elas obesas ou não”, diz.
Por outro lado, já se sabe que o peso excessivo e o sedentarismo são fatores de risco para o câncer de mama, o que aumenta o alerta para mulheres que estão com índice de massa corporal elevado. “A recomendação é que a pessoa tenha um peso corporal adequado para diminuir o risco do câncer”, diz Arn Migowski, epidemiologista e chefe da Divisão de Detecção Precoce do Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Estrogênio
A associação entre obesidade ou sobrepeso com o câncer de mama acontece porque a gordura transforma outros hormônios em estrogênio, ou seja, quanto mais gordura, maior concentração do hormônio. “O estrogênio é um dos fatores que precisam estar presentes para que ocorra o câncer”, esclarece José Roberto Filasse.
Segundo o Inca, a necessidade de fazer a mamografia é de uma vez a cada dois anos entre 50 e 69 anos, o que se aplica também às pessoas obesas. Entretanto, aquelas que fazem parte de grupos de risco precisam começar o rastreamento mais cedo e com maior frequência, de acordo com a recomendação médica. Mulheres com histórico familiar da doença (parentes de primeiro grau), aquelas com determinadas mutações genéticas e que já foram diagnosticadas com outros tumores malignos estão entre as com risco aumentado.
Frequência deve ser mantida
Rodrigo Pepe, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, diz que é preciso mais estudos para comprovar a necessidade da mamografia em intervalos mais curtos, no caso de mulheres obesas. “É preciso mostrar os benefícios e comprovar que esse diagnóstico está relacionado à qualidade de vida das pacientes”, explica.
Outra observação que ele faz sobre a pesquisa sueca está relacionada ao número, que considera pequeno, de mulheres envolvidas no estudo. Para Pepe, os argumentos não são fortes o suficiente para mudar a recomendação na frequência dos exames.
O médico argumenta que alterar a rotina de rastreamento não resolveria, porque a mutação celular acontece muito lentamente, e a possibilidade de encontrar qualquer mudança é muito pequena. “Se não tem nada no exame hoje, pode ser que já haja tumor, mas que ele não está grande o suficiente para ser visto. Com 6 meses de exame de intervalo, é quase impossível ver qualquer alteração, então, não tem necessidade da mamografia”, alega. Contudo, o mastologista diz que quando o tumor alcança um determinado tamanho, começa a crescer mais rápido a cada ano.
Pepe recomenda que, para as mulheres obesas ou com sobrepeso, a melhor dica é manter o equilíbrio da massa corporal. Ao mesmo tempo, o epidemiologista Arn Migowski, do Instituto Nacional do Câncer (Inca), diz que é preciso desconstruir a ideia de que a mulher obesa precisa fazer mais exames. “A densidade dificulta, mas não quer dizer que tenha que fazer a mamografia com mais frequência.”
Quanto ao autoexame, Migowski recomenda cautela. É preciso conhecer a mama e saber reconhecer o que está certo ou errado. “O autoexame é uma questão complicada, porque a mama é cheia de alterações e saber procurar direito não é fácil”, concorda José Roberto Filasse, da Universidade de São Paulo.
* Estagiária sob a supervisão da subeditora Carmen Souza