Caroço do abacate pode ser usado na medicina e em soluções industriais

Semente pode ser aplicada na produção de plásticos, anticancerígenos e remédios para tratar problemas cardíacos, indica estudo norte-americano. Outra pesquisa vincula a polpa da fruta a melhoras cognitivas e visuais depois dos 50 anos

Correio Braziliense

Os pesquisadores detectaram 132 componentes químicos no abacate: na casca da semente está concentrada a maior quantidade de componentes benéficos à saúde - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press


A semente do abacate é geralmente jogada fora após o consumo da fruta. Um desperdício, alertam pesquisadores da Sociedade Americana de Química (ACS, pela sigla em inglês). Os caroços e a casca que os envolve podem ser usados na produção de substâncias com aplicações diversas, da medicina a soluções industriais. A descoberta soma-se aos já conhecidos benefícios da fruta para a saúde, como a grande quantidade de potássio e fibras, além da diminuição dos níveis de colesterol e triglicerídeos no sangue, e a uma recente constatação relacionada à melhora cognitiva na meia-idade.

No caso da equipe norte-americana, a proposta é usar as toneladas de sementes desperdiçadas na produção de medicamentos antivirais, suplementos alimentares, plásticos e cosméticos. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, cerca de 5 milhões de toneladas de abacate foram produzidas no mundo em 2014. Na maioria dos casos, apenas a polpa tem aproveitamento. Mesmo para os produtores que usam o caroço para extrair o óleo de abacate, a casca é descartada antes do processamento.

“É possível que as cascas das sementes de abacates sejam, na verdade, uma grande preciosidade, pois os componentes medicinais dentro delas podem eventualmente ser usados para tratar cânceres, doenças cardíacas e outras complicações para a saúde.
Nossos resultados também sugerem que as cascas são uma fonte em potencial de substâncias usadas em plásticos e outros produtos industriais”, diz Debasish Bandyopadhyay, da Universidade do Texas no Vale do Rio Grande e participante do estudo, apresentado no Encontro e Exposição Nacional da Sociedade Americana de Química, em Washington.

- Foto: Barbara Cabral/Esp. CB/D.A Press - 29/4/17Para chegar às conclusões, Bandyopadhyay e a equipe moeram 300 cascas secas do fruto, o que rendeu em torno de 595 gramas de pó, transformado no equivalente a três colheres de chá de óleo e 28 gramas de cera. Usando duas técnicas de análise - cromatografia gasosa e espectrometria de massa -, os investigadores detectaram 116 componentes químicos no óleo e 16 na cera. Muitos deles, inclusive, não foram encontrados nas próprias sementes.

Entre os achados do óleo estavam ácido behênico, usado em cosméticos e medicamentos antivirais; heptacosano, com potencial para inibir o crescimento de células tumorais; e ácido dodecanoico, que aumenta o colesterol bom e reduz o risco de aterosclerose. Na cera, foram descobertas substâncias usadas na produção de plásticos, cosméticos e aditivos alimentares. Bandyopadhyay conta que a equipe trabalha, agora, manipulando os componentes descobertos a fim de otimizar o seu uso, como no desenvolvimento de remédios com menos efeitos colaterais.

Cérebro turbinado

Os admiradores da polpa do fruto também têm mais um motivo para apreciá-lo. Pesquisa publicada em agosto, na revista Nutrients, mostrou que o consumo diário de abacate aumentou seus efeitos benéficos para quem chegou aos 50 anos. São os reflexos da ação da luteína, um pigmento encontrado em frutas e vegetais que se acumula no sangue, nos olhos e no cérebro e pode agir como um agente anti-inflamatório e antioxidante.

Segundo estudo da Universidade Tufts, nos Estados Unidos, os participantes que seguiram a dieta proposta tiveram aumento da concentração da substância nos olhos em 25%, além de melhora significativa na memória de curto prazo e na habilidade de resolver problemas. “Os resultados desse estudo sugerem que as gorduras monoinsaturadas, as fibras, a luteína e outros componentes do abacate tornam a fruta especialmente eficaz em enriquecer os níveis neurais de luteína, o que pode trazer benefícios não só para a saúde dos olhos, mas também para a do cérebro”, enfatiza Elizabeth Johnson, principal pesquisadora do estudo.

A investigadora conta que os experimentos indicam que é melhor comer a fruta.
Os níveis de luteína nos olhos mais do que dobraram nos participantes que fizeram isso se comparados aos que ingeriram suplemento. “Logo, uma dieta balanceada que inclui essa fruta pode ser uma estratégia efetiva para a saúde cognitiva”, ressalta. Participaram da pesquisa 40 adultos saudáveis, com média de 50 anos, que comeram um abacate fresco por dia durante seis meses. Os pesquisadores monitoraram o aumento gradual da quantidade de luteína nos olhos dos voluntários e a melhora em testes de memória, velocidade de processamento e nível de atenção.

No lugar do abacate, o grupo de controle comeu uma batata ou um copo de grão-de-bico por dia, que possuem o mesmo nível de calorias, mas não contêm luteína. Esse grupo apresentou melhora mais tímida na capacidade cognitiva. Segundo os autores, como os resultados se baseiam no consumo de um abacate inteiro por dia, são necessárias novas pesquisas a fim de determinar se os benefícios podem ser replicados com o consumo da porção diária recomendada: um terço da fruta, que contém 136 microgramas de luteína.

“Enquanto as conclusões de um único estudo não podem ser generalizadas para todas as populações, o resultado da pesquisa ajuda a reforçar e a avançar o corpo de publicações sobre os benefícios do abacate no dia a dia”, diz Nikki Ford, diretora de nutrição do Conselho do Abacate Hass, grupo que promove o consumo da fruta nos Estados Unidos. “Abacates são nutritivos e sem colesterol, com gorduras naturalmente boas. Por isso, são uma forma fácil e deliciosa de se somar mais frutas ao consumo diário saudável de plantas.”

Enquanto isso...
Cacau pode ajudar a tratar o diabetes

Composto presente no fruto melhora a produção de insulina - Foto: Eduardo Soteras/AFP - 15/11/16

Um composto presente no cacau, base para um dos maiores inimigos da dieta, o chocolate, poderá ser usado para o tratamento justamente de quem deve evitar o açúcar: os diabéticos.

O efeito inusitado foi detalhado por pesquisadores da Universidade Brigham Young, nos Estados Unidos, na última edição do Journal of Nutritional Biochemistry. Segundo os autores, os monômeros de epicatequina ajudam na produção de insulina, cuja ação é comprometida em decorrência da doença metabólica.

No diabetes tipo 2, o corpo para de produzir insulina ou não processa adequadamente o açúcar ingerido. O problema ocorre por um colapso das células beta, responsáveis pela produção do hormônio. Segundo Jeffery Tessem, um dos autores do estudo, as produtoras de insulina funcionam melhor e ficam mais fortes quando se aumenta a quantidade de monômeros de epicatequina no corpo. “Eles tornam mais fortes a mitocôndria nas células beta, o que produz mais ATP (fonte de energia de uma célula), resultando em maior liberação de insulina”, resume o também professor de nutrição, dietética e ciência alimentar na universidade norte-americana.

A equipe chegou à conclusão após um experimento com ratos. Inicialmente, as cobaias seguiram uma dieta rica em gordura e sofreram as consequências dela, como o aumento do peso. Quando o composto do cacau foi adicionado à alimentação dos animais, houve redução da obesidade e aumento da capacidade de lidar com a elevação dos níveis de glicose no sangue. “Os monômeros de epicatequina protegem as células, aumentando a capacidade delas de lidar com o estresse oxidativo”, diz Tessem.

O pesquisador ressalta, porém, que a descoberta não avaliza a ingestão de barras de chocolate. “Você provavelmente terá que comê-las em grande quantidade e não vai querer ingerir o tanto de açúcar inerente a esse processo. É o composto no cacau que você está procurando”, explica.

A intenção da equipe é fazer com que os monômeros de epicatequina sejam ingeridos de forma mais saudável e viável. “Esses resultados nos ajudarão a nos aproximar da ideia de usar esse composto de forma mais eficaz, em alimentos ou suplementos, para manter o controle normal de glicose no sangue e até potencialmente o aparecimento do diabetes tipo 2”, cogita Andrew Neilson, coautor do estudo.

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