O homem mudou – por dentro e por fora. Se antes a sociedade era definida pelo modelo patriarcal, as mudanças do século passado e o fortalecimento dos movimentos de igualdade de gênero atingiram diretamente o seu comportamento, o fizeram repensar seu papel e suscitaram um questionamento difícil de ser respondido: afinal, quem é o homem moderno?.
“Não existe mais ‘um’ homem. O homem de hoje é tão esfacelado como tudo que a gente vive”, responde a filósofa Viviane Mosé. “(Todas as mudanças) romperam com o paradigma de referência para os homens e permitiu um novo modelo baseado nos valores estabelecidos pelos padrões civilizados e não mais pela virilidade”, afirma o sociólogo Juracy Amaral.
O tradicional e sisudo deu lugar a um homem vaidoso, antenado nas tendências da moda, que geraram mudanças na própria sociedade de consumo – a nova onda de barbearias é um exemplo –, menos preconceituoso e que divide as tarefas de casa. Mas nem tudo são flores.
Embora os papéis sociais sejam cada vez mais divididos, o machismo ainda encontra terreno fértil na internet e em muitas regiões do Brasil – sobretudo longe das metrópoles –, onde há a resistência dos homens em perder seu status quo. Enfim, o homem moderno é um abacaxi difícil de descascar por si mesmo.
Uma inquietação particular fez o barbeiro Elias Torres da Silva, de 30 anos, dar o passo mais arrojado e certeiro da sua carreira. Em julho de 2013, ele percebeu que sua barbearia, no Bairro Ouro Preto, Região Noroeste de Belo Horizonte, embora fosse point de jogadores de futebol e homens de negócios, não atendia à sua própria mudança de comportamento. No ramo desde os 13 anos, Elias sentiu que ele próprio havia mudado nos últimos anos: roupas mais bem alinhadas, vaidade com cabelo e barba, interesse por produtos de qualidade – do gel de cabelo à cerveja que consumia em casa com os amigos. Em julho de 2013, ele inaugurou a Seu Elias, uma das pioneiras na capital mineira de um dos negócios que melhor reflete os gostos dos homens modernos: as novas barbearias, que resgataram a velha tradição da toalha quente e navalha, aliada aos anseios de homens cada vez mais antenados e exigentes.
ANTENADO “O homem moderno, para mim, está antenado nas tendências do que há de melhor e que não aceita qualquer serviço. Esse é o perfil dos nossos clientes”, conta Seu Elias. “Trabalho com cabelo masculino há 17 anos e notei essa mudança: antes, o cliente chegava, sentava na cadeira e abria a revista. Hoje, ele chega com uma ideia pronta do que quer. Alisa o cabelo, faz camuflagem dos fios brancos, gosta da barba bem desenhada.” Elias ganhou notoriedade por ser o barbeiro preferido de vários jogadores de futebol – cortou o cabelo de diversos jogadores da Seleção Argentina, entre eles Lionel Messi, em novembro, antes da partida contra a Seleção Brasileira, pelas Eliminatórias Sul-Americanas antes da Copa do Mundo. Hoje, além do espaço com mais de 500 metros quadrados no Ouro Preto, tem filiais na Savassi e no Hotel Ouro Minas.
Para Elias, o homem sempre se preocupou com a aparência, mas tinha vergonha de chegar ao salão e pedir algo além do tradicional corte de cabelo. “Acabou aquele tabu, que homem só quer cortar cabelo e não importa com mais nada. Hoje, ele se preocupa com a música, com a revista, se tem café, água gelada. Se a toalha é descartável, a qualidade da lâmina. Se o barbeiro está bem vestido, se a casa está limpa, se a recepcionista o atendeu bem. O homem moderno quer o melhor.”
Em 2014, o estilista mineiro Célio Dias lançou a marca LED, a primeira do estado a adotar o conceito de agender ou free gender – moda livre e sem gênero. O estilo se desenvolveu nos últimos anos em polos como Nova York e Londres, reflexo direto da luta por liberdade e igualdade de gênero, e chegou ao Brasil recentemente, sendo a marca criada pelo mineiro uma das referências do país. Em pouco mais de dois anos em funcionamento no Bairro Prado, Região Oeste de Belo Horizonte, a aceitação de um público específico surpreendeu Célio. “A gente achou que ia atingir, sobretudo, o público gay e feminino, mas a adesão de homens héteros foi surpreendente. A aceitação foi quase instantânea”, conta o estilista. “São homens que buscam roupas mais confortáveis e que se sentem bem, independentemente do que estão vestindo: macacão, calça ou saia. Ou seja, a aceitação foi mais uma das provas de que roupa não tem gênero”, conta.
A adesão de homens levou a marca a fazer adaptações nas últimas coleções. Algumas peças ganharam bolsos, uma vez que homens não costumam carregar bolsas. “Muitos passaram a sugerir mudanças e melhorias nas peças e fomos adaptando para atender ainda mais a todos, sem distinção.”
A moda acompanhou as mudanças do último século – das calças para as mulheres à minissaia. Estilistas, artistas e grandes atores e atrizes, desde a primeira metade do século passado, ajudaram a quebrar tabus com roupas que iam além do gênero. A francesa Coco Chanel revolucionou a moda feminina, adotando peças mais confortáveis e alinhadas ao corpo, como calças e ternos.
Algumas das grandes atrizes da era de ouro de Hollywood, como a alemã Marlene Dietrich e Katherine Hepburn, também eram adeptas de calças e camisas de botão. Na música, David Bowie quebrou todos os conceitos de gênero com uma personagem andrógina.
Para Célio, a emergência da moda agender é um reflexo da sociedade atual. “Nossa proposta faz parte de um movimento maior, da busca pelo respeito e pelo direito de a pessoa viver e se vestir da forma que ela se sente melhor e mais confortável. A base do preconceito é a falta de informação e a gente, por meio da moda, está discutindo e combatendo o preconceito.”
“O homem moderno é um homem em conflito.” É o que afirma a filósofa e psicanalista Viviane Mosé, doutora em filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para ela, a mudança na organização da sociedade – do modelo patriarcal para uma realidade em que as mulheres assumem cada vez mais protagonismo em diversas áreas –, quebrou a identidade do homem tradicional.
“O homem de hoje é tão esfacelado como tudo que a gente vive. Antes a gente tinha um modelo: o homem que não chorava, dominador, que trabalhava e mantinha a casa. Esse homem foi quebrado”, comenta. “A gente tem muitos homens, inclusive o machista. Mas eu vejo os homens hoje muito preocupados com as meninas. Claro que tem uma parcela que odiou perder esse poder e fica lutando com as mulheres que não querem mais se submeter às suas vontades.”
Para o sociólogo Juracy Amaral, doutor em sociologia e professor da PUC Minas, as mudanças do comportamento social vêm ocorrendo ao longo do tempo, principalmente a partir do século 19. Ele cita como momentos marcantes o ingresso das mulheres nas universidades, os estudos da psicanálise, os reflexos das duas guerras mundiais, a invenção da pílula anticoncepcional, os movimentos encadeados na França em 1968 e a discussão sobre a questão dos gêneros, que também foi perturbadora das práticas sociais em geral.
“Tudo isso rompeu com o paradigma de referência para os homens e permitiu um novo modelo baseado nos valores estabelecidos pelos padrões civilizados e não mais pela virilidade”, afirma. “Nesse sentido, os papéis masculinos e femininos foram aos poucos se tornando semelhantes e os homens, em parte, se adaptaram a essas práticas por necessidade de se integrar ao padrão civilizado”, afirma.
EXPECTATIVAS Para Viviane, embora ainda haja um passivo de séculos de machismo, o homem mudou seu comportamento a partir da expectativa profissional das mulheres. “Hoje, quem tem 30, 35 ou 40 anos são homens que se casaram com mulheres que trabalham, ou melhor, que têm expectativa profissional, que querem mais, ir além. Eles se casaram com mulheres assim, há esse acordo desde o início”, conta. “Dessa forma, é natural que esse homem tenha que arrumar a casa, cuidar dos filhos, ficar mais em casa.”
Quem é esse homem moderno?
Pode-se afirmar que, no geral, o homem contemporâneo é jovem, com menos 40 anos, com nível de escolaridade elevado, que vive nas grandes metrópoles, que se comunica e utiliza as novas tecnologias e é cosmopolita. Mas, em muitas sociedades pouco se mudou e na sociedade brasileira é notável em muitas regiões resistências a essa mudança.
A insurgência de movimentos de igualdade de gênero ajudou a provocar essa mudança no comportamento do homem?
As discussões iniciadas pelo casal Simone Beauvoir e Jean-Paul Sartre foram fundamentais no desenvolver das ideias sobre o casamento tradicional, e sobretudo do papel de cada um dos gêneros na instituição família, inclusive sobre o papel de ser pai e mãe. Atualmente, o homem não tem papel de provedor do lar e a mulher de doméstica, ambos compartilham tarefas que antes desses movimentos jamais seriam admitidas pela cultura patriarcal da época. Essa concepção de casal se inicia com um grupo de mulheres na Alemanha, sob a liderança de Marianne Weber, mas foi o casal de filósofos franceses que aprofundou as discussões e contribuiu para pensar o modelo de comportamento contemporâneo.
Por ter sido criado em uma sociedade patriarcal, o homem tem aceitado com facilidade essa nova configuração?
Penso que a aceitação pelo homem brasileiro da igualdade de gênero não é espontânea, e depende de cada contexto cultural. Uns aceitam com menos resistência e outros não. De qualquer forma, a igualdade de gênero vai evoluir, mesmo com as barreiras culturais que ainda persistem.
E o que dificulta essa aceitação?
A adaptação dos indivíduos a qualquer tipo de comportamento ou costume depende da capacidade desenvolvida por cada um, e isso está relacionado com escolaridade (educação). As mídias e as influências dos formadores de opinião têm papel relevante na formação de valores, mas os valores culturais predominantes no imaginário social do brasileiro ainda têm forte presença de passado, marcadamente, patriarcal. Nesse sentido, o patriarcalismo é reproduzido no núcleo familiar, e pode ser notado na prática de crimes passionais, muito comum nas regiões predominantemente de cultura patriarcal.
Os fóruns e redes sociais na internet têm se mostrado um campo fértil para a proliferação de discurso de ódio. Por que muitos aproveitam a internet para disseminar ódio e preconceito?
Manuel Castells (sociólogo espanhol) referiu-se à agressividade e à falta de civilidade do brasileiro nas redes sociais. Parece que o comportamento hostil do brasileiro não é de agora e nem é causado pelas redes sociais, mas uma característica cultural que encontrou um meio eficiente para se manifestar. As questões relacionadas ao comportamento sexual e frustrações produzidas pelos relacionamentos amorosos mal-sucedidos é de muito tempo problemático na sociedade brasileira. Assim, penso que a internet (redes sociais) apenas se tornou um instrumento eficiente para se praticarem atos de crueldade e hostilidade, utilizada por pessoas que se sentem anônimas e dessa forma descarregam todas as frustrações e descontrole comportamental porque sabem que podem não ser descobertas e punidas.
“Não existe mais ‘um’ homem. O homem de hoje é tão esfacelado como tudo que a gente vive”, responde a filósofa Viviane Mosé. “(Todas as mudanças) romperam com o paradigma de referência para os homens e permitiu um novo modelo baseado nos valores estabelecidos pelos padrões civilizados e não mais pela virilidade”, afirma o sociólogo Juracy Amaral.
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Embora os papéis sociais sejam cada vez mais divididos, o machismo ainda encontra terreno fértil na internet e em muitas regiões do Brasil – sobretudo longe das metrópoles –, onde há a resistência dos homens em perder seu status quo. Enfim, o homem moderno é um abacaxi difícil de descascar por si mesmo.
Mudança de comportamento
Uma inquietação particular fez o barbeiro Elias Torres da Silva, de 30 anos, dar o passo mais arrojado e certeiro da sua carreira. Em julho de 2013, ele percebeu que sua barbearia, no Bairro Ouro Preto, Região Noroeste de Belo Horizonte, embora fosse point de jogadores de futebol e homens de negócios, não atendia à sua própria mudança de comportamento. No ramo desde os 13 anos, Elias sentiu que ele próprio havia mudado nos últimos anos: roupas mais bem alinhadas, vaidade com cabelo e barba, interesse por produtos de qualidade – do gel de cabelo à cerveja que consumia em casa com os amigos. Em julho de 2013, ele inaugurou a Seu Elias, uma das pioneiras na capital mineira de um dos negócios que melhor reflete os gostos dos homens modernos: as novas barbearias, que resgataram a velha tradição da toalha quente e navalha, aliada aos anseios de homens cada vez mais antenados e exigentes.
ANTENADO “O homem moderno, para mim, está antenado nas tendências do que há de melhor e que não aceita qualquer serviço. Esse é o perfil dos nossos clientes”, conta Seu Elias. “Trabalho com cabelo masculino há 17 anos e notei essa mudança: antes, o cliente chegava, sentava na cadeira e abria a revista. Hoje, ele chega com uma ideia pronta do que quer. Alisa o cabelo, faz camuflagem dos fios brancos, gosta da barba bem desenhada.” Elias ganhou notoriedade por ser o barbeiro preferido de vários jogadores de futebol – cortou o cabelo de diversos jogadores da Seleção Argentina, entre eles Lionel Messi, em novembro, antes da partida contra a Seleção Brasileira, pelas Eliminatórias Sul-Americanas antes da Copa do Mundo. Hoje, além do espaço com mais de 500 metros quadrados no Ouro Preto, tem filiais na Savassi e no Hotel Ouro Minas.
Para Elias, o homem sempre se preocupou com a aparência, mas tinha vergonha de chegar ao salão e pedir algo além do tradicional corte de cabelo. “Acabou aquele tabu, que homem só quer cortar cabelo e não importa com mais nada. Hoje, ele se preocupa com a música, com a revista, se tem café, água gelada. Se a toalha é descartável, a qualidade da lâmina. Se o barbeiro está bem vestido, se a casa está limpa, se a recepcionista o atendeu bem. O homem moderno quer o melhor.”
Quebra de tabus nas roupas
Em 2014, o estilista mineiro Célio Dias lançou a marca LED, a primeira do estado a adotar o conceito de agender ou free gender – moda livre e sem gênero. O estilo se desenvolveu nos últimos anos em polos como Nova York e Londres, reflexo direto da luta por liberdade e igualdade de gênero, e chegou ao Brasil recentemente, sendo a marca criada pelo mineiro uma das referências do país. Em pouco mais de dois anos em funcionamento no Bairro Prado, Região Oeste de Belo Horizonte, a aceitação de um público específico surpreendeu Célio. “A gente achou que ia atingir, sobretudo, o público gay e feminino, mas a adesão de homens héteros foi surpreendente. A aceitação foi quase instantânea”, conta o estilista. “São homens que buscam roupas mais confortáveis e que se sentem bem, independentemente do que estão vestindo: macacão, calça ou saia. Ou seja, a aceitação foi mais uma das provas de que roupa não tem gênero”, conta.
A adesão de homens levou a marca a fazer adaptações nas últimas coleções. Algumas peças ganharam bolsos, uma vez que homens não costumam carregar bolsas. “Muitos passaram a sugerir mudanças e melhorias nas peças e fomos adaptando para atender ainda mais a todos, sem distinção.”
A moda acompanhou as mudanças do último século – das calças para as mulheres à minissaia. Estilistas, artistas e grandes atores e atrizes, desde a primeira metade do século passado, ajudaram a quebrar tabus com roupas que iam além do gênero. A francesa Coco Chanel revolucionou a moda feminina, adotando peças mais confortáveis e alinhadas ao corpo, como calças e ternos.
Algumas das grandes atrizes da era de ouro de Hollywood, como a alemã Marlene Dietrich e Katherine Hepburn, também eram adeptas de calças e camisas de botão. Na música, David Bowie quebrou todos os conceitos de gênero com uma personagem andrógina.
Para Célio, a emergência da moda agender é um reflexo da sociedade atual. “Nossa proposta faz parte de um movimento maior, da busca pelo respeito e pelo direito de a pessoa viver e se vestir da forma que ela se sente melhor e mais confortável. A base do preconceito é a falta de informação e a gente, por meio da moda, está discutindo e combatendo o preconceito.”
Identidade esfacelada
“O homem moderno é um homem em conflito.” É o que afirma a filósofa e psicanalista Viviane Mosé, doutora em filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para ela, a mudança na organização da sociedade – do modelo patriarcal para uma realidade em que as mulheres assumem cada vez mais protagonismo em diversas áreas –, quebrou a identidade do homem tradicional.
“O homem de hoje é tão esfacelado como tudo que a gente vive. Antes a gente tinha um modelo: o homem que não chorava, dominador, que trabalhava e mantinha a casa. Esse homem foi quebrado”, comenta. “A gente tem muitos homens, inclusive o machista. Mas eu vejo os homens hoje muito preocupados com as meninas. Claro que tem uma parcela que odiou perder esse poder e fica lutando com as mulheres que não querem mais se submeter às suas vontades.”
Para o sociólogo Juracy Amaral, doutor em sociologia e professor da PUC Minas, as mudanças do comportamento social vêm ocorrendo ao longo do tempo, principalmente a partir do século 19. Ele cita como momentos marcantes o ingresso das mulheres nas universidades, os estudos da psicanálise, os reflexos das duas guerras mundiais, a invenção da pílula anticoncepcional, os movimentos encadeados na França em 1968 e a discussão sobre a questão dos gêneros, que também foi perturbadora das práticas sociais em geral.
“Tudo isso rompeu com o paradigma de referência para os homens e permitiu um novo modelo baseado nos valores estabelecidos pelos padrões civilizados e não mais pela virilidade”, afirma. “Nesse sentido, os papéis masculinos e femininos foram aos poucos se tornando semelhantes e os homens, em parte, se adaptaram a essas práticas por necessidade de se integrar ao padrão civilizado”, afirma.
EXPECTATIVAS Para Viviane, embora ainda haja um passivo de séculos de machismo, o homem mudou seu comportamento a partir da expectativa profissional das mulheres. “Hoje, quem tem 30, 35 ou 40 anos são homens que se casaram com mulheres que trabalham, ou melhor, que têm expectativa profissional, que querem mais, ir além. Eles se casaram com mulheres assim, há esse acordo desde o início”, conta. “Dessa forma, é natural que esse homem tenha que arrumar a casa, cuidar dos filhos, ficar mais em casa.”
Cinco perguntas para Juracy Amaral
Quem é esse homem moderno?
Pode-se afirmar que, no geral, o homem contemporâneo é jovem, com menos 40 anos, com nível de escolaridade elevado, que vive nas grandes metrópoles, que se comunica e utiliza as novas tecnologias e é cosmopolita. Mas, em muitas sociedades pouco se mudou e na sociedade brasileira é notável em muitas regiões resistências a essa mudança.
A insurgência de movimentos de igualdade de gênero ajudou a provocar essa mudança no comportamento do homem?
As discussões iniciadas pelo casal Simone Beauvoir e Jean-Paul Sartre foram fundamentais no desenvolver das ideias sobre o casamento tradicional, e sobretudo do papel de cada um dos gêneros na instituição família, inclusive sobre o papel de ser pai e mãe. Atualmente, o homem não tem papel de provedor do lar e a mulher de doméstica, ambos compartilham tarefas que antes desses movimentos jamais seriam admitidas pela cultura patriarcal da época. Essa concepção de casal se inicia com um grupo de mulheres na Alemanha, sob a liderança de Marianne Weber, mas foi o casal de filósofos franceses que aprofundou as discussões e contribuiu para pensar o modelo de comportamento contemporâneo.
Por ter sido criado em uma sociedade patriarcal, o homem tem aceitado com facilidade essa nova configuração?
Penso que a aceitação pelo homem brasileiro da igualdade de gênero não é espontânea, e depende de cada contexto cultural. Uns aceitam com menos resistência e outros não. De qualquer forma, a igualdade de gênero vai evoluir, mesmo com as barreiras culturais que ainda persistem.
E o que dificulta essa aceitação?
A adaptação dos indivíduos a qualquer tipo de comportamento ou costume depende da capacidade desenvolvida por cada um, e isso está relacionado com escolaridade (educação). As mídias e as influências dos formadores de opinião têm papel relevante na formação de valores, mas os valores culturais predominantes no imaginário social do brasileiro ainda têm forte presença de passado, marcadamente, patriarcal. Nesse sentido, o patriarcalismo é reproduzido no núcleo familiar, e pode ser notado na prática de crimes passionais, muito comum nas regiões predominantemente de cultura patriarcal.
Os fóruns e redes sociais na internet têm se mostrado um campo fértil para a proliferação de discurso de ódio. Por que muitos aproveitam a internet para disseminar ódio e preconceito?
Manuel Castells (sociólogo espanhol) referiu-se à agressividade e à falta de civilidade do brasileiro nas redes sociais. Parece que o comportamento hostil do brasileiro não é de agora e nem é causado pelas redes sociais, mas uma característica cultural que encontrou um meio eficiente para se manifestar. As questões relacionadas ao comportamento sexual e frustrações produzidas pelos relacionamentos amorosos mal-sucedidos é de muito tempo problemático na sociedade brasileira. Assim, penso que a internet (redes sociais) apenas se tornou um instrumento eficiente para se praticarem atos de crueldade e hostilidade, utilizada por pessoas que se sentem anônimas e dessa forma descarregam todas as frustrações e descontrole comportamental porque sabem que podem não ser descobertas e punidas.