A vontade de criar um tecido que resfrie o corpo humano é um antigo sonho dos pesquisadores, que começou a tomar forma quando um material de uso comum em laboratórios se mostrou promissor alvo de investigação. “Ocorreu-nos que a matéria-prima do separador das baterias de íons de lítio que usamos todos os dias teria esse potencial. Elas são feitas de polietileno, que não absorve a radiação infravermelha”, explica ao Correio Yi Cui, professor de ciência de materiais e engenharia da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, e um dos autores do estudo.
A não absorção do infravermelho é a principal vantagem do material, uma vez que o corpo humano emite grande parte de seu calor por meio dessa radiação — em forma de uma onda invisível, é ela que torna os organismos visíveis quando observados por meio de óculos de visão noturna. “Entre 40% e 60% do calor do nosso corpo é dissipado na forma de radiação infravermelha quando estamos sentados em um escritório”, esclarece, em um comunicado, Shanhui Fan, professor de engenharia elétrica em Stanford e também criador do nanoPE.
Sem ventilador
Para aprimorar o polietileno, a equipe modificou o material por meio de produtos químicos misturados com nanotecnologia e fotônica.
Em testes comparativos com um tecido de algodão, a invenção conseguiu deixar uma superfície até 4ºC mais fresca. Para os pesquisadores, essa diferença significa que uma pessoa vestida com a malha de polietileno poderia dispensar o uso de um ventilador ou do ar-condicionado. “Se você pode esfriar a pessoa em vez de o edifício onde ela trabalha ou mora, você poupará energia”, ressalta Yi.
Roberto Ribeiro de Avillez, coordenador de Engenharia de Materiais e Nanotecnologia do Departamento de Engenharia Química e de Materiais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), considera que o aspecto mais interessante da pesquisa foi a escolha da matéria-prima. “Chama a atenção o uso de um material que não é utilizado com essa função, mas que realmente é muito versátil. Esses pesquisadores transformaram um produto relativamente impermeável em permeável”, explicou o especialista, que não participou do estudo.
Avillez também destaca que as características de nanoPE seriam ideais para países de clima quente, como o Brasil. “Nosso corpo é quente, sempre estamos emitindo calor. A sensação de mal-estar, que nós brasileiros conhecemos bem, acontece quando sentimos o abafamento do calor produzido por nosso corpo. Temos algumas roupas criadas para amenizar isso, mas elas são mais leves e vazadas. O que esses pesquisadores fizeram foi um material que permite a uma roupa mais fechada mandar o calor para fora.”
Cores
Os cientistas adiantam que nanoPE precisa passar por mais testes antes de se tornar um produto comercializável. A próxima etapa é encontrar uma forma de conferir diferentes cores e texturas ao material. “Para ser mais ‘usável’, ele precisa parecer com um pano tradicional.
Avillez também acredita que o novo material precisa ser aprimorado. “O plástico não é um material feito para ser costurado. Ele pode rasgar ao passar por esse processo. Talvez, esses cientistas possam pensar em outro tipo de costura em vez da clássica”, sugere.
Mesmo com alguns obstáculos a serem superados, os autores estão convencidos de que a pesquisa abre portas para achados na área de novos tecidos. “O que fizemos é até muito simples, mas poucos realmente têm pesquisado características de radiação de têxteis”, diz Shanhui..