Apelidado de “PL da Prematuridade”, um bebê que nasce de cesariana antes de 39 semanas tem grandes chances de nascer prematuro e com baixo peso. Para sensibilizar a comunidade e os deputados que irão votar o projeto de lei, pesquisadores de diferentes instituições científicas publicaram uma carta aberta afirmando que o PL “contraria todas as evidências científicas que apontam prejuízos para a saúde da mãe e, principalmente, do bebê”.
A resolução do CFM segue normas do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) e tem o objetivo de reduzir o nascimento de crianças imaturas, denominadas de termo precoce, que nascem entre 37 e 38 semanas e seis dias gestacionais. “As últimas semanas de vida da criança dentro do útero e o trabalho de parto são fundamentalmente dedicados à preparação fina do bebê para sua convivência com o mundo exterior. Isso inclui adaptações à pressão atmosférica, mudanças de temperatura, ruídos, luz, bactérias e a necessidade de respirar e se alimentar. A interrupção abrupta desse processo de amadurecimento, na 37ª semana, gera perdas múltiplas. A literatura científica tem mostrado que esse grupo de recém-nascidos apresenta maiores riscos para a sua saúde a curto, médio e longo prazo”, diz a carta assinada por 22 entidades.
Realizada com 24 mil mulheres entre 2011 e 2012, a pesquisa Nascer no Brasil mostra que 35% dos recém-nascidos brasileiros nasceram a termo precoce, índice que corresponde a mais de um milhão de bebês imaturos.
Segundo os pesquisadores, os dados brasileiros são coerentes com a literatura científica, que aponta não somente riscos para a saúde dos recém-nascidos imediatamente após o nascimento como também nos primeiros meses de vida. “A literatura científica internacional também descreve danos a longo prazo, como maior risco de morte e hospitalização na infância e maiores chances de desenvolver obesidade, hipertensão, diabetes, asma e alergia na vida adulta. As pesquisas identificaram também prejuízos ao aprendizado de línguas e de matemática e pior desempenho escolar”, salienta o documento.
O texto diz inda que “o Projeto de Lei nº 5687 é um retrocesso e um desserviço ao esforço que o país tem feito nos últimos anos para promover a saúde, principalmente no período de gestação e de nascimento, e reduzir doenças e mortes maternas e infantis”. O Brasil é campeão mundial de cesariana com taxas que chegam a 85% na rede privada frente a uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de apenas 15%.
Autonomia da mulher
Sobre a sustentação de que a cesariana a pedido é para preservar a autonomia da mulher, os pesquisadores também rebatem o argumento que sustenta o projeto de lei: “É importante ressaltar que somos defensores da autonomia ampla da mulher, desde que ela seja exercida por meio da escolha informada, consciente e baseada em evidências científicas. Acreditamos que repassar exclusivamente para a gestante a decisão sobre o momento e tipo de parto significa isentar de responsabilidade o profissional que realiza o pré-natal e o parto. Essa decisão deve ser uma escolha consciente e compartilhada entre família e equipe de saúde.
Além disso, consideramos que é preciso investir na qualidade do atendimento à mulher no pré-natal, durante e depois do parto com um cuidado centrado em suas necessidades. Isso elimina o excesso de intervenções obstétricas desnecessárias que acabam por funcionar como propaganda para as cesarianas, que somente deveriam ser realizadas por justificada indicação clínica”.
Por fim, os pesquisadores e profissionais de saúde encerram a carta ressaltando que é papel deles defender os direitos de todos os bebês brasileiros de completarem seu desenvolvimento intrauterino e terem assegurada uma assistência adequada no nascimento e uma vida futura saudável, com capacidade de atingir todo o seu potencial de crescimento, desenvolvimento e inserção social. “A privação desses direitos é eticamente inadmissível”, afirmam.
Veja quem assina a carta:
Ana Paula Esteves - ENSP – Fiocruz (RJ)
Antonio Fernandes Moron – Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP-SP)
Bernardo Jefferson de Oliveira – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG-MG)
Carmen Gracinda Silvan Scochi – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (USP-SP)
Iná S. Santos – Universidade Federal de Pelotas (UFPel-RS)
João Guilherme Alves - Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP)
José Guilherme Cecatti – Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP-SP)
José Maria Lopes – Instituto Fernandes Figueira (IFF-RJ)
José Simon Camelo Júnior – Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP-SP)
Luiz Roesch – Universidade Federal do Pampa (Unipampa-RS)
Marcos Augusto Bastos Dias – FIOCRUZ (RJ)
Maria da Conceição do Rosário – Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP-SP)
Maria do Carmo Leal – Escola Nacional de Saúde Pública/FIOCRUZ (RJ)
Maria Elizabeth Moreira - Instituto Fernandes Figueiras –Fiocruz (RJ)
Maria Yury Travassos Ichihara - Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz/FIOCRUZ (BA)
Mauricio Lima Barreto – Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz/FIOCRUZ (BA)
Paulo Saldiva – Universidade de São Paulo (USP-SP)
Renato Soilbelmann Procianoy – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS-RS)
Rita de Cássia Silveira – Hospital das Clínicas de Porto Alegre – (HCPA-RS)
Ricardo Tavares Pinheiro – Universidade Católica de Pelotas-RS
Rodolfo de Carvalho Pacagnella – Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP-SP)
Sergio H Martins-Costa- Hospital das Clínicas de Porto Alegre – (HCPA-RS)
Silvia Regina Dias Medici Saldiva – Instituto de Saúde (IS-SP)
Sonia Isoyama Venancio – Instituto de Saúde de São Paulo (SP)
Sônia Lansky – Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte (SMSA-BH),
Tania Maria Ruffoni Ortiga – Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-RJ)
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Thaíla Corrêa Castral – Faculdade de Enfermagem Universidade Federal de Goiás (FEN-UFG).