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Essa pesquisa é um exemplo de como os vestíveis se tornaram a aposta da vez na área da saúde, uma vez que possibilitam que médicos façam diagnósticos mais precisos e acompanhem a eficácia dos tratamentos prescritos.
A pulseira inteligente usada pelos pesquisadores da Unicamp, tecnicamente chamada de actígrafo, possui sensores de movimento que detectam quando uma pessoa entra em sono profundo. Se os braços e as pernas começam a se mexer mais devagar, o dispositivo entende que a pessoa dormiu e começa a calcular o tempo total de horas em repouso. Estas informações ficam armazenadas em um software desenvolvido para o aparelho e são coletadas pelos pesquisadores em tempo real.
"Uma pesquisa completa sobre o sono exigiria que a pessoa dormisse no laboratório", explica a pesquisadora do Departamento de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, Tânia Marchiori. "O aparelho complementa nosso estudo." A pesquisa já está em seu segundo estágio, quando os pesquisadores selecionam casos de pessoas com sono irregular para realizar uma análise mais profunda e iniciar tratamentos. "Todo mundo aprovou. As pessoas estão receptivas a soluções práticas de tratamento", diz a pesquisadora.
Esse tipo de estudo, que une uma das principais tendências do mercado de tecnologia ao tratamento de doenças, não está em prática só em Campinas. Em todo o mundo, hospitais, startups e universidades começam a desenvolver métodos e tratamentos de saúde com a ajuda de vestíveis.
No Hospital Sírio-Libanês, localizado na cidade de São Paulo, um concurso de inovação, realizado no ano passado, deu origem a um sistema que pode detectar surtos de epilepsia com até 25 minutos de antecedência. O algoritmo deve ser, em breve, embarcado em um vestível. Os sensores do acessório vão monitorar dados como batimentos cardíacos, respiração e nível de atividade neurológica dos pacientes. A previsão dos ataques será resultado do cruzamento desses dados.
"Esse aparelho pode trazer mais qualidade de vida para o portador de epilepsia. Ele poderá tomar seu medicamento antes do surto ou parar alguma atividade de risco", afirma a pesquisadora da startup Epistemic e uma das responsáveis pelo projeto, Paula Renata Gomez.
"O uso de vestíveis não é a solução para casos graves, mas será essencial para o dia a dia de pessoas com doenças crônicas. É o futuro."
Recursos
A substituição de exames invasivos por um simples acessório inteligente traz diversos benefícios para pacientes e médicos. Se para o paciente o uso do dispositivo resulta em menos visitas ao hospital, para o médico trata-se do acesso a um novo mundo gigantesco de informações. "Dados que eram coletados apenas em momentos específicos já podem ser monitorados 24 horas, com o paciente em casa", afirma o fundador da Carenet, empresa que desenvolve softwares para vestíveis, Immo Paul.
Nos Estados Unidos, há uma série de experiências em andamento em hospitais e clínicas que envolvem o uso de vestíveis. No centro médico Cedars-Sinai, na cidade de Los Angeles, médicos selecionaram 30 pacientes em estado avançado de câncer para usar pulseiras inteligentes. Os dados coletados permitem que eles avaliem quais pacientes estão aptos a receber quimioterapia.
Barreiras
Apesar de promissor, o uso de vestíveis na área de saúde ainda precisa vencer uma série de desafios para se tornar realidade. O principal deles é o alcance da tecnologia, que chegou ao mercado no fim de 2012.
Até agora, somente em mercados maduros, como Estados Unidos e Europa, os usuários entendem o que são pulseiras e relógios inteligentes. "As pessoas já sabem para que serve um vestível nesses lugares", diz Paul.
O mercado ainda é pequeno. De acordo com a consultoria IDC, 80 milhões de equipamentos vestíveis foram vendidos em 2015 no mundo - um número baixo, se comparado ao mercado de smartphones, que alcançou 1,4 bilhão de unidades no mesmo período.
"O mercado de vestíveis ainda é muito novo", afirma o consultor da IDC Brasil, Pedro Hagge. "Existe uma boa perspectiva para o futuro, mas o crescimento será num ritmo mais modesto que o esperado."
No Brasil, o mercado é insignificante: foram comercializados apenas 133 mil unidades, entre pulseiras e relógios inteligentes em 2015. "O Brasil é irrelevante com relação a mundo", diz Hagge. A estimativa da IDC é de que o País chegue a um mercado de 375 mil vestíveis até 2020 - apenas uma fração dos 213,6 milhões de acessórios inteligentes que devem ser vendidos em todo o mundo.
O preço dos produtos é o principal motivo que atrasa a adoção dos equipamentos no Brasil. Enquanto nos Estados Unidos as pessoas encontram uma pulseira básica para monitorar o sono por até US$ 20, a mais barata à venda por aqui custa R$ 95. No caso dos relógios inteligentes mais avançados, a diferença é ainda mais gritante: o Apple Watch, por exemplo, custa US$ 299 - a mesma versão é vendida no Brasil por R$ 4,6 mil. Um dos motivos é a alta carga tributária. "Porque as pessoas pagariam caro por algo que elas nem sabem como funciona?", questiona Paul.
Desafios
Para a diretora de pesquisas do Gartner, Annette Zimmermann, há outros desafios a serem superados para que esses dispositivos sejam adotados em larga escala na medicina. "Infraestrutura, problemas de regulamentação, segurança, privacidade de dados e desenvolvimento de protocolos são alguns deles", diz.
No Brasil, a situação é mais crítica: faltam investimentos em pesquisas que mostrem a utilidade dos equipamentos para o trabalho dos profissionais de saúde. "Falta investimento em pesquisa e componentes para os produtos", diz a pesquisadora da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Lúcia Nobuyasu. "Acabamos sempre atrás dos outros países."
No longo prazo, o cenário geral deve melhorar. "Está acontecendo uma transformação enorme que vai ajudar todas as partes", afirma o diretor de marketing da fabricante de processadores Intel, José Bruzadin. "A medicina vai se transformar." Quem sabe, ao mostrar os resultados positivos na saúde, o setor de vestíveis possa, finalmente, decolar.