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Congresso mundial sobre câncer apresenta tendências em diagnóstico e tratamento

Algumas mudanças já devem começar a ser adotadas

Carolina Cotta
A estimativa do INCA é de 596 mil novos casos de câncer no Brasil em 2016 - Foto: Valf / EM / D.A Press
Trinta mil especialistas reunidos no maior congresso de oncologia do mundo: assim é o American Society of Clinical Oncology (Asco). A cada ano, o Asco dita os modos de tratar a doença, que, em 2016, deve ter 596 mil casos no Brasil, de acordo com estimativas do Instituto Nacional do Câncer José Alencar da Silva (Inca). É durante a reunião anual da sociedade americana de oncologia clínica que são apresentados os principais estudos e novidades na área. Segundo o oncologista Israel Vilaça, da Oncomed-BH e do Instituto Mario Penna, diferentemente da edição do ano passado, quando pesquisas sobre o uso da imunoterapia no tratamento do câncer de pulmão revolucionaram a abordagem desse tipo de câncer, a edição de 2016 aprofundou essas pesquisas e, claro, trouxe novos estudos e mudanças nos modos de tratar os tumores.

“Há várias avanços no conhecimento da biologia do câncer, além de novos exames e medicamentos para os vários tipos de tumores”, afirma Israel, que destaca quatro estudos em especial. Um deles avaliou o uso da hormonoterapia para evitar a recidiva de câncer de mama. Até então, eram indicados cinco anos de hormonoterapia, mas o estudo mostrou que dobrar esse período resultou em redução de 34% do risco de recorrência da doença quando comparado com placebo, confirmando dados de estudos anteriores. Foram estudadas 1.918 pacientes em uso do letrozol. O tratamento é indicado após a cirurgia para mulheres com câncer de mama inicial na pós-menopausa e que tenham receptor hormonal positivo, para que a medicação faça efeito.
“Precisamos orientar que prolongar o tratamento pode reduzir ainda mais a recidiva, mas, sempre que possível, devemos pesar o risco/benefício. Nenhuma medicação é isenta de efeitos colaterais”, diz o oncologista. O Asco também trouxe avanços na abordagem do câncer de pâncreas. “Foi apresentado um estudo, também de fase 3, que é um marco histórico para esse tipo de câncer porque implica mudança de conduta. Trata-se de uma doença de prognóstico muito reservado.

Na maioria dos casos, o diagnóstico ocorre em estágios avançados”, explica Israel. Antes, o paciente, mesmo com doença avançada, fazia o tratamento com o quimioterápico gencitabina após a cirurgia. Esse, que é um dos maiores estudos já realizados, concluiu que adicionar outra quimioterapia oral, a capecitabina, ao tratamento-padrão prolongou a sobrevida dos pacientes sem aumentar muito a toxicidade. “A sobrevida global mediana foi de 28 meses para quem usou a terapia combinada, e de 25,5 meses para quem recebeu só um medicamento. É um ganho de 12% de sobrevida global em cinco anos. Um resultado significativo”, comemora o médico.  

Sobrevida

Um tumor do sistema nervoso central, o glioblastoma multiforme (GBM), também tem novidades. Já se sabia o beneficio da droga temozolomida em associação com a radioterapia depois da intervenção cirúrgica, mas não se sabiam os efeitos desse tratamento na população idosa, que representa cerca de metade dos casos. “Esse estudo fornece a primeira evidência de que a quimioterapia com temozolomida em associação à radioterapia com um fracionamento mais curto aumenta significativamente a sobrevida sem prejudicar a qualidade de vida, com uma redução do risco de morte em torno de 33%.
Antes não tínhamos uma diretriz clara para tratar esse grupo de pacientes”, explica. Mas um dos estudos mais comentados foi o que testou a adição do anticorpo monoclonal daratumumab a um regime de duas drogas, bortezomibe e dexametasona. “Esse é o primeiro anticorpo monoclonal aprovado para o tratamento do mieloma múltiplo e tem como alvo uma proteína presente na superfície das células tumorais. Quando adicionamos esse anticorpo, o tumor responde mais rápido e permite maior controle de dor, em curto espaço de tempo, e possibilita melhor qualidade de vida. O estudo mostrou melhora na resposta do paciente com mieloma múltiplo recorrente. A combinação reduziu o risco de progressão em 70%”, explica o especialista.

DIAGNÓSTICO

Também há mais perspectivas em relação aos exames e métodos diagnósticos. Está em evidência, por exemplo, a biópsia líquida, usada principalmente no câncer de pulmão. É um método que pode ser utilizado periodicamente para avaliar a progresso da doença, a resposta à terapia e o desenvolvimento de resistência ao tratamento. Comparando resultados da biópsia líquida, por meio da coleta de material de sangue e urina, com a tradicional análise do tecido tumoral, observou-se que 57% dos pacientes coincidiram na positividade.
“Isso mostra que não se pode substituir um método pelo outro, e que eles são métodos complementares. Às vezes, temos um paciente idoso que não consegue fazer biópsia do tumor pelo risco cirúrgico do procedimento invasivo. Nesses pacientes podemos usar amostras do próprio sangue para avaliar se com aquele material é possível detectar e fazer o diagnóstico. Se por ali já for possível identificar o tumor, não é preciso recorrer ao método invasivo”, acrescenta Israel Vilaça.

Acupuntura atua como complemento
A acupuntura tem efeitos no sistema nervoso periférico além dos já conhecidos impactos no sistema nervoso central. Em estudo publicado recentemente na revista Nature Neuroscience, pesquisadores da Universidade de Rochester mostraram como as terapias complementares produzem efeitos positivos, agindo de maneira integrada aos tratamentos contra o câncer. No artigo, os estudiosos nova-iorquinos explicam o mecanismo da acupuntura contra a dor. Esse tipo de terapia complementar se destaca como o mais estudado cientificamente. A pesquisa avança ao identificar que a terapia atinge tecidos mais profundos da pele.

Outras pesquisas americanas já revelavam que de 2% a 31% dos pacientes oncológicos nos EUA se submetem a sessões de acupuntura para tratar sintomas e condições associadas ao câncer, e também os efeitos colaterais do seu tratamento. Famosos hospitais, como o Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, de Nova York; Anderson Cancer Center, de Houston; e o Dana-Farber Cancer Institute, de Boston, oferecem a terapia. Segundo Daniela Boaventura de Moraes, médica acupunturista e antroposófica, responsável pelas terapias complementares do Oncocentro BH, a acupuntura estimula o próprio organismo a melhorar seu funcionamento, levando ao equilíbrio de forma global, por meio da aplicação de agulhas ultrafinas em pontos específicos do corpo.

Agressão global

“O tratamento contra o câncer acaba agredindo todo o organismo, e a acupuntura ajuda a reequilibrar as energias, além de fortalecer e estimular as defesas do indivíduo”, diz a especialista. Náusea, vômitos, transpiração excessiva, queda da imunidade, depressão, tristeza e ondas de calor são incômodos bem controlados com a acupuntura. A técnica também ajuda a reduzir a dor, além de aumentar os hormônios do prazer, a serotonina e a endorfina. O recurso, contudo, deve ser usado como coadjuvante ao tratamento convencional, uma vez que colaboram para o bem-estar do paciente e isso tem profunda influência nas respostas do organismo.

As técnicas aplicadas no tratamento oncológico são as mesmas utilizadas tradicionalmente nos demais procedimentos. As agulhas são inseridas nos pontos determinados e permanecem no corpo por 20 minutos. É comum que o paciente durma nesse período, devido ao relaxamento proporcionado pelo equilíbrio orgânico. Os pontos são selecionados conforme a queixa de cada paciente e por isso é fundamental que o tratamento seja acompanhado pelo médico responsável. O ideal é que seja realizada de duas a três vezes por semana. Em casos graves, a frequência pode ser maior. A aplicação de acupuntura em pacientes oncológicos deve ser oferecida por um profissional com formação adequada, que tenha conhecimento do diagnóstico médico da causa dos sintomas.

IMUNOTERAPIA
Relatos sobre os benefícios da imunoterapia existem desde o final do século 19. Sabia-se que alguns tumores regrediam completamente depois de uma infecção bacteriana, devido a uma resposta imunológica no organismo. Ou seja, quando estimulado por um micro-organismo, o corpo desenvolvia mecanismos de defesa para combater o tumor. Desde 1976, esse tipo de terapia é usado no tratamento do câncer superficial da bexiga, com o bacilo da tuberculose. E a partir disso, inúmeras tentativas de tratar o câncer com medicamentos que atuam no sistema imunológico têm sido feitas. Somente nos anos 1980, com a identificação de receptores celulares (PD1 e CTLA4) capazes de inibir ou estimular essa defesa do organismo, foi possível o desenvolvimento de novos medicamentos capazes de atuar nesses receptores. Assim, os imunoterápicos, ao se ligar aos receptores celulares, permitem que o sistema imunológico reconheça as células do câncer como uma ameaça e provoque sua destruição. Desde 2013, com os resultados dos estudos da imunoterapia no tratamento do melanoma cutâneo com o ipilimumabe (primeiro imunoterápico aprovado no Brasil), e posteriormente os resultados com o nivolumabe no câncer de pulmão, novas drogas estão sendo testadas e se mostrado ativas para vários tipos de tumores, como rim, bexiga, intestino grosso, entre outros, com resultados animadores. Hoje, a sociedade médica reconhece que a imunoterapia vai se tornar o objeto de desenvolvimento do tratamento do câncer nos próximos anos e traz ótimas perspectivas futuras. 

ENCONTRO CIENTÍFICO 
A Oncomed-BH promove neste sábado (09/07) encontro científico para abordar os principais temas apresentados no último Asco. Palestras, mesas-redondas e debate de casos clínicos estão previstos na programação. Entre os assuntos abordados estão prevenção, diagnóstico e, principalmente, novidades no tratamento dos diversos tipos da doença. As inscrições são gratuitas e abertas a toda a comunidade científica. Interessados podem se inscrever pelo telefone (31) 2516-4356 ou pelo site www.oncomedbh.com.br. As vagas são limitadas. O evento será na Rua Bernardo Guimarães, 3.106, Barro Preto, das 8h às 12h20..