O fato de o rastreamento do câncer colorretal ser indicado para as pessoas com mais de 50 anos, ainda que sejam assintomáticos e sem história familiar, alerta para a gravidade do problema. Com chances de cura quando detectado inicialmente, o que mais preocupa é a alta incidência desse tipo de neoplasia. O câncer colorretal, popularmente conhecido como câncer de intestino, é o segundo mais frequente entre as mulheres, e o terceiro entre os homens. É também o tumor mais prevalente do aparelho digestivo. Só para 2016, o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) estima 34.280 novos casos. E é com ele que o Estado de Minas começa, hoje, uma série de matérias mensal sobre como tratar o câncer.
Segundo o endoscopista Vítor Arantes, coordenador do Serviço de Endoscopia do Hospital Mater Dei Contorno e do Hospital das Clínicas da UFMG, onde é professor da Faculdade de Medicina, os principais métodos utilizados para rastreamento do câncer de intestino são a pesquisa do sangue oculto nas fezes, utilizada em maior escala na população; e a colonoscopia, um exame empregado de modo mais selecionado quando o sangue oculto é positivo ou quando o paciente tem história familiar de câncer colorretal, antecedentes de pólipo intestinal ou sintomas como sangramento anal ou alteração do hábito intestinal. É consenso entre as sociedades médicas que indivíduos que tenham as condições acima sejam submetidos à colonoscopia.
O risco de uma pessoa desenvolver câncer colorretal é de aproximadamente 5%. Cerca de dois terços dos tumores de intestino grosso se instalam no cólon, enquanto um terço tem origem no reto. Homens e mulheres são acometidos de forma parecida, geralmente depois dos 65 anos de idade. Mais de 90% dos casos ocorrem em pessoas com mais de 50 anos. Segundo o oncologista Enaldo Melo de Lima, coordenador do Hospital Integrado do Câncer Mater Dei, o que mais tem contribuído para a incidência da neoplasia, em todo o mundo, são os maus hábitos, algo em torno de 60%. “É um câncer muito influenciado pela alimentação e pelo hábito intestinal. A constipação intestinal colabora muito, assim como o sobrepeso e a obesidade, sedentarismo e a dieta rica em proteína animal e alimentos defumados.”
Mas algumas pessoas têm risco aumentado por causa de mutações genéticas herdadas de família que favorecem o câncer colorretal. De 5% a 10% dos casos de câncer de intestino grosso são hereditários. A Síndrome de Lynch também associada a outras neoplasias, e a Polipose Familiar Polipônica, mais rara, são duas doenças que podem desencadear o câncer colorretal. “A Polipose, felizmente, é rara. Esse paciente tem que fazer um acompanhamento desde a infância e muitas vezes é preciso retirar o intestino antes que tantos pólipos evoluam para tumores. Mas a maioria dos os casos hereditários estão relacionados ao Lynch. O sequenciamento do DNA trouxe grande contribuição também para o câncer de intestino.
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Câncer colorretal pode ser prevenido e tem alta chance de curaCafé não está mais na lista da OMS de alimentos que podem causar câncerDiagnóstico precoce aumenta as chances de cura do câncer de intestinoGrupo de cientistas lança novo modelo de estudo do câncerCongresso mundial sobre câncer apresenta tendências em diagnóstico e tratamentoPesquisa sugere que nem todas as células tumorais circulantes são cancerígenasDIAGNÓSTICO A colonoscopia é o método mais confiável para detecção do câncer de intestino e, na grande maioria dos casos, a suspeita é confirmada pela coleta de biópsias durante o procedimento e análise microscópica pelo patologista. Segundo Vítor, a imagem endoscópica das lesões tumorais costuma ser bem característica, mas sempre é necessária a biópsia confirmatória para a definição do tratamento. “Além disso, sempre que um câncer é diagnosticado é importante realizar exames de imagem para estadiamento, inclusive com avaliação de outros órgãos. Isso ajuda a definir o estágio em que se encontra a doença e estabelece a melhor estratégia de tratamento.”
Nos últimos anos, o especialista reconhece uma conscientização progressiva da população em relação à necessidade de se realizar exames preventivos para o intestino. “A procura pela colonoscopia, que e o exame mais confiável para detectar os tumores intestinais, ainda que seja um exame invasivo, tem aumentado expressivamente nos últimos 10 anos. O grande benefício em termos de prevenção do câncer é justamente o encontro e a retirada dos pólipos intestinais que são os agentes precursores do câncer de intestino na maioria dos casos. É desta forma que se previne o câncer intestinal”, alerta.
Já a observação de tumores intestinais em fase mais avançada predomina em indivíduos com sintomas como anemia crônica, sangramento nas fezes, mudança do habito intestinal, cólicas intestinais frequentes e emagrecimento. “Em situações mais raras, encontramos tumores ou pólipos, de maior tamanho, ocultos em indivíduos completamente assintomáticos. Por essa razão algumas diretrizes tem recomendado rastrear a população assintomática e de baixo risco”, explica. Mas não se trata de um exame simples. A colonoscopia é um procedimento invasivo e é justamente isso que dificulta que seja usado em larga escala.
Uma das mais importantes limitações da colonoscopia como método de rastreamento é justamente o fato de ser um exame com riscos inerentes ao método, e que requer um preparo intestinal muito rigoroso para que o exame seja conduzido de forma bem-sucedida a com qualidade”, afirma. É necessária, por exemplo, uma avaliação médica antes do procedimento para ver a condição clínica do paciente, eventuais cuidados pré-procedimento e para orientar sobre o uso dos medicamentos laxativos requeridos para realizar o preparo intestinal. Pessoas que retiraram pólipos, segundo Enaldo, devem repetir o exame depois de um ano.
AVANÇOS A colonoscopia tem avançado com o desenvolvimento de aparelhos de alta resolução que permitem fazer a ampliação das imagens como se fosse um microscópio interno. Esse recurso, associado ao uso de corantes e a um endoscopista experiente e treinado, é capaz de avaliar se determinada lesão intestinal ou pólipo encontrado está em estágio inicial ou não. Entretanto, são equipamentos caros e, portanto, disponíveis apenas em centros de referência que investem na área.
Outro importante avanço foi o desenvolvimento de técnicas especializadas para retirada, em bloco, dos tumores do intestino que se encontrem em estágio inicial. “Em casos bem selecionados, segundo certos critérios que foram definidos sobretudo na literatura japonesa, a retirada dos tumores e pólipos pode ser feita totalmente por via endoscópica, sem necessidade de realizar incisões no abdome, extração do órgão ou uso de bolsas de colostomia. A cirurgia endoscópica quando corretamente indicada possibilita o tratamento eficaz de forma menos invasiva e com recuperação mais rápida do paciente. Mas esse tipo de tratamento também requerem seleção rigorosa dos casos, feita por especialista experiente e com atuação em hospitais com toda a infra-estrutura necessária e equipamentos de última geração”, explica.
TIPOS DE CÂNCER DE CÓLON E DE RETO
Adenocarcinoma: é responsável por mais de 95% dos casos. Dos tumores do cólon, aproximadamente dois terços dos adenocarcinomas localizam-se no lado esquerdo; os demais, no lado direito do cólon.
Tipos mais raros: são os tumores neuroendócrinos, o tumor estromal do trato gastrintestinal (GIST), e os linfomas. Eles são responsáveis por apenas 5% dos casos.
Nova opção terapêutica
Pacientes com tumor estromal gastrointestinal (GIST), ou câncer gastrointestinal inoperável ou metastático, têm agora uma nova opção de tratamento. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o uso do regorafenibe para adultos intolerantes a outros tratamentos. Os estudos clínicos revelaram que o medicamento obteve uma taxa significativa de controle da doença e redução de 73% do risco de progressão ou morte. Segundo Tulio Pfiffer, oncologista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, o tratamento depende de quando foi o diagnóstico. Em fases iniciais, o ideal é a retirada cirúrgica do tumor. Em fases tardias, ou quando a doença volta, há poucas opções de tratamento sistêmico, daí a importância do novo medicamento. O GIST é um tumor relativamente raro, representando cerca de 1% dos tumores do aparelho digestivo. “É uma variação de sarcoma, uma família de tumores raros com mais de 50 tipos. Ele se diferencia por ter uma via biológica específica que permite usar a terapia-alvo como tratamento. O regorafenibe, já usado em mais de 100 países, passa a ser a terceira opção terapêutica. Esse câncer, em fase metastática, é uma doença crônica e incurável.