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Bater papinha no liquidificador virou pecado. Bebê de andador, absurdo. Em muitos casos, as consultas de rotina com o pediatra já esclarecem pequenos detalhes, mas, tanto na alimentação quanto em outros hábitos, aparecem dúvidas. Não raramente, há discordância entre o que os pais intuem e o que os médicos recomendam. Alguns desses pontos polêmicos são abordados nesta edição, sempre respeitando a visão de cada lado.
Estímulos desde cedo
Para brincar com o bebê, tem que ter disposição, criatividade para inventar histórias, interpretar papéis, fazer vozes e também memória para relembrar as canções da infância. Luana D’Amico, 33 anos, servidora pública, conta que já não se lembrava de muitas músicas de ninar quando o filho, Cadu, 7 meses, nasceu. Ele faz aula de natação, psicomotricidade e musicalização. “Eu aprendo as músicas e levo pra casa”, conta. Além de o bebê ser estimulado nas aulas, Luana continua o aprendizado fora dali.
Ela tinha acabado de pegar o ritmo no exercício físico quando descobriu a gravidez. Na academia em que malhava, havia um programa para gestantes que inclui o pós-parto. Grávida, entrou para o grupo rapidamente, mas, depois do parto, não se apressou. Algumas mães voltam com 30 dias; Luana, orientada pelo pediatra, preferiu esperar 90, até que Cadu estivesse com todas as vacinas tomadas.
Às terças-feiras, ele tem aula de natação; às quintas, de psicomotricidade; às sextas, de musicalização. A preferida, segundo a mãe, parece ser a de natação. “Ele vai às raias da loucura e volta para casa desmaiado no carro. Acho que se cansa e relaxa”, conta. O interessante para Luana é que, dessa forma, ele não precisa ir à creche para ter contato com outros bebês, ao mesmo tempo que é um momento de mãe e filho.
Pesquisas indicam que a linguagem musical na educação infantil seria tão importante quanto a aprendizagem da linguagem oral e escrita, da matemática e das ciências humanas e naturais. Os estudos dos cientistas Gottfried Schlaug, da Escola de Medicina de Harvard, e Christian Gaser, da Universidade de Jena, na Alemanha, confirmam que o cérebro dos músicos apresenta maior quantidade de massa cinzenta, particularmente nas regiões responsáveis pela audição, pela visão e pelo controle motor.
Pesquisadores da Universidade de Wisconsin submeteram alunos da 2ª série a aulas de piano. Em testes de proporções e frações, elas apresentaram resultados de 15% a 41% superiores aos de outras crianças. Em outra investigação da universidade, verificou-se que alunos da 2ª série que faziam aulas de piano duas vezes por semana apresentaram desempenho superior em matemática ao de alunos da 4ª série que não estudavam música.
A fonoaudióloga Ana Bancillon explica que a musicalização ajuda no aprendizado de melodia, ritmo e prosódia, que é a correta emissão de palavras quanto à posição da sílaba tônica. Além disso, a longo prazo, ajuda na linguagem escrita da criança. Mas ela alerta: “Nenhuma estimulação extra substitui o tempo junto, o contato visual, o responder quando a criança fala ou balbucia, o conversar de frente, na altura dela, para que ela veja o movimento da boca”. Brincar com a criança é importante e um estímulo por si só.
Quando meu filho deve falar?
Muitos pais ficam na dúvida se o filho já deveria estar falando, ou se está atrasado. A comparação com outras crianças é inevitável. É claro que cada um tem seu tempo, mas, segundo a fonoaudióloga Ana Bancillon, é temerário esperar demais sem procurar ajuda especializada, seja para eliminar qualquer dúvida, seja para começar um tratamento. “A intervenção precoce é mais efetiva, tem um custo menor e funciona como profilaxia”, afirma.Muitas crianças têm distúrbio de fala e acabam sendo diagnosticadas com autismo. “A criança tenta se comunicar e não consegue, então, grita, chora e se isola. Daí vem a confusão no diagnóstico”, explica. A apraxia da fala é um distúrbio ainda pouco estudado e, por isso, é um dos que mais são confundidos. Trata-se de uma alteração motora da fala. O problema não é na musculatura do rosto, mas no envio da mensagem do cérebro para os músculos.
Desenvolvimento esperado
0 - 6 semanas
Receptivo: assusta-se e aquieta ao som da voz.
Expressivo: choros diferenciados e sons primitivos. Aparecem os sons vogais.
3 meses
Receptivo: vira-se para o som da voz e observa com atenção fatos e objetos do ambiente.
Expressivo: primeiras consoantes ouvidas são p/b e k/g. Inicia balbucio.
6 meses
Receptivo: responde com tons emotivos à voz materna.
Expressivo: balbucio. Faz sequência de consoantes - vogais - consoantes - vogais sem trocar as consoantes. Exemplo: “dudadá”.
9 meses
Receptivo: entende pedidos simples com dicas por meio de gestos. Entende “não” e “tchau”.
Expressivo: imita sons. Jargão.
12 meses
Receptivo: entende muitas palavras familiares e ordens simples associadas a gestos.
Expressivo: começa a dizer as primeira palavras como “mamá”, “papá”, “dadá”.
18 meses
Receptivo: conhece algumas partes do corpo. Acha objetos a pedido. Brincadeira simbólica com miniaturas.
Expressivo: poderá ter de 30 a 40 palavras. Começa a combinar duas palavras.
24 meses
Receptivo: segue instruções envolvendo dois conceitos. Exemplo: “Coloque o copo na caixa”.
Expressivo: vocabulário de cerca de 150 palavras. Usa a combinação de duas ou três.
30 meses
Receptivo: segue instruções envolvendo até três conceitos. Exemplo: “Coloque a boneca grande na cadeira”.
Expressivo: usa habitualmente linguagem telegráfica. Exemplo: “Mamã vai papá; Papá pão”.
36 meses
Receptivo: conhece diversas cores. Reconhece plurais, pronomes que diferenciam os sexos, adjetivos.
Expressivo: inicia o uso de artigos, plurais, preposições e verbos auxiliares.
48 meses
Receptivo: começa a aprender conceitos abstratos (liso, mole). Linguagem usada para raciocínio. Entende “se”, “por que”, “quanto”. Compreende 1.500 a 2.000 palavras.
Expressivo: formula frases corretas, faz perguntas, usa a negação, fala de acontecimentos no passado ou antecipa outros no futuro.
Fonte: Rosa Neto (1996)
Cama compartilhada
Léo tem 2 anos e 8 meses e um lugar cativo no coração e na cama da mamãe, Adi de Faria Leite, 42, empresária. Ela colocava o recém-nascido para dormir em um moisés no quarto dela. Com cerca de três meses, ele foi para o berço. A partir de então, foi Adi que se mudou para o quarto dele. Ela abriu mão da própria cama para estar perto dele a noite toda.
Cama compartilhada
Léo tem 2 anos e 8 meses e um lugar cativo no coração e na cama da mamãe, Adi de Faria Leite, 42, empresária. Ela colocava o recém-nascido para dormir em um moisés no quarto dela. Com cerca de três meses, ele foi para o berço. A partir de então, foi Adi que se mudou para o quarto dele. Ela abriu mão da própria cama para estar perto dele a noite toda.
Por um processo natural, aos sete meses, Léo voltou para o quarto da mãe. Adi se levantava cerca de três vezes por noite para amamentar e já estava tão cansada que sentia medo de deixá-lo cair do colo. O dia em que o moisés ficou apertado demais para ele, passou a ocupar um espaço na enorme cama da mãe. Separados, os pais não tiveram a intimidade incomodada pelo bebê, mas Adi tem certeza de que isso jamais seria um problema.
Embora a configuração funcione para a família, não é o que a Sociedade Brasileira de Pediatria e a maioria das academias especializadas recomendam, devido ao risco de morte súbita do recém-nascido. Um estudo publicado no jornal americano Pediatrics revelou que, entre 2004 e 2012, nos Estados Unidos, 69% dos bebês que morreram dessa forma dormiam com os pais. Publicada no British medical journal, outra pesquisa apontou um risco cinco vezes maior de ocorrências fatais quando os filhos dividiam o leito com o casal. Apesar da gravidade dos casos, eles correspondem a apenas 4,5 a cada 10 mil bebês, segundo levantamento da PUC do Rio Grande do Sul.
O neuropediatra e presidente da Sociedade de Pediatria do Distrito Federal, Christian Müller, afirma que o risco de morte súbita é maior abaixo de 12 meses. “Muitos pais acabam levando os bebês para a cama deles por comodismo, sem perceber que estão colocando as crianças em perigo”, afirma.
Adi está ciente da contraindicação dos pediatras, mas acredita que, além de o filho já estar fora de perigo, amor e carinho nunca são demais. “Por mim, ele só sai da minha cama quando quiser”, admite. Todo dia, por volta das 20h, os dois já estão na cama. Ela lê algumas histórias para ele. “Minha preferida é a do porco que se suja”, Léo revela timidamente. Antes das 21h, os dois já caíram no sono. Como ele ainda mama, o lado prático também é interessante. “Seria pior se eu tivesse que me levantar para ele mamar”, imagina.
No extremo oposto dessa atitude, há os pais que tentam separar os ambientes desde os primeiros meses de vida. Alguns chegam a usar métodos polêmicos para que o bebê durma a noite toda. Um deles é o chamado “nana nenê”, que consiste em deixar que o bebê chore por alguns intervalos. A duração deles deve aumentar progressivamente, até que o bebê não queira mais chorar.
Eliane Volchan, professora no Laboratório de Neurobiologia do Instituto de Biofisica Carlos Chagas Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lamenta esse tipo de atitude. “Filhotes têm um sistema de alarme que se manifesta bem cedo e sinaliza sempre que eles se separam dos adultos. Estudos mostraram que a dor da separação ativa as mesmas áreas cerebrais da dor física, ou seja, está demonstrado cientificamente que, quando um bebê chora ao perceber sinais de separação, seu cérebro está acionando o recurso máximo de alarme para uma ameaça à sua sobrevivência”, explica.
Já a psicanalista Tânia Baptista não acredita que o hábito de dormir com os pais seja saudável. Segundo ela, uma criança precisa da medida certa de amor e de limite. A proteção excessiva geraria uma criança dependente e insegura, que necessita sempre de alguém que a complete. “Ela pode se tornar um adulto fixado a uma fase infantil na qual recebeu excesso de aconchego”, afirma.
De dependente, Léo não tem nada. Ele entrou na escola este ano. A mãe até estava preparada para ter que buscá-lo mais cedo ou enfrentar um período de adaptação, mas, no primeiro dia de aula, ele já deu tchau, virou as costas e foi brincar como se já pertencesse ao lugar. Faz também pouco tempo que dormiu fora de casa pela primeira vez, na casa da madrinha. No dia seguinte, já queria marcar a próxima vez.
Novos posicionamentos
O desenvolvimento infantil sempre será foco de pesquisas. Com o avanço dos estudos, algumas informações passam a ser ultrapassadas e outras, adaptadas à realidade contemporânea. Mas há quem ainda prefira seguir os conselhos da bisavó que teve uma prole numerosa. Alguns temas da criação são mais polêmicos que outros, por isso, a dica é sempre estar atento às recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria para não pecar pela falta de conhecimento.
Chupeta
Antes: a Lei nº 11.625, de janeiro de 2006, proibiu a propaganda de chupetas. O acessório era banido pela Academia Norte-Americana de Pediatria. A justificativa seria de que o acessório deformaria os ossos da boca e estimularia o desmame precoce.
Hoje: a chupeta, atualmente, é recomendada, ainda que com ressalvas. Para a hora de dormir, ela até traria benefícios. Há pelo menos cinco pesquisas que concluem que o uso dela é capaz de reduzir em até 90% os casos de mortes súbitas. “Não dar chupeta é melhor, mas usá-la com moderação pode trazer benefícios”, explica a pediatra Vera Bezerra. Além disso, considera-se melhor que o bebê use chupeta do que chupar o próprio dedo, pois é mais fácil os pais limitarem o uso do bico.
Primeiras papinhas
Antes: recomendava-se que os primeiros alimentos do bebê fossem batidos no liquidificador para facilitar a ingestão e evitar engasgos. Outra estratégia muito usada era passar a papinha em uma peneira. Ainda há quem bata a papinha, seja por falta de informação, seja pela não aceitação do bebê.
Hoje: a indicação é que o alimento seja apenas amassado. O pediatra Gustavo Augusto Nicolas César de Medeiros explica que, quando se introduz comidas sólidas à dieta do bebê, a intenção principal não é a de que ele se alimente, mas de que se acostume com a textura dos alimentos e aprenda a engoli-los sem engasgar. Uma forma alternativa de introdução de refeições é o BLW (Baby Led Weaning), que consiste em oferecer os alimentos ao bebê e deixar que ele os leve à boca, com suas próprias mãos.
Berço
Antes: o uso de almofadas específicas para esconder as grades do berço era recomendável. A ideia é que elas ofereceriam segurança à criança, que poderia ficar com braços e pernas presos entre os vãos.
Hoje: os protetores de berço não são recomendados pela comunidade médica. O problema é que qualquer objeto (almofada, travesseiro, bicho de pelúcia etc.) oferece risco de sufocamento. Para a pediatra Vera Bezerra, até o berço pode ser descartado se a família morar em apartamento. “O ideal é que a criança durma na superfície mais lisa possível. Poderia ser só um colchonete de borracha no chão, desde que não haja insetos na casa.” Não é à toa que está cada vez mais na moda os quartos montessorianos, em que os móveis são bem baixos e a cama se limita a um colchão no chão.
Andador
Antes: acreditava-se que ele ajudaria no desenvolvimento motor da criança e faria com que ela aprendesse a andar mais cedo. Supostamente, o andador daria liberdade ao bebê e impediria que ele caísse ao tentar andar sozinho.
Hoje: em 2007, a comercialização de andadores foi proibida no Canadá. Em 2012, foram registrados 850 acidentes com crianças, entre 7 e 15 meses, sendo que 60% dos machucados atingiram a cabeça. Um ano depois, uma liminar determinou a proibição da comercialização também no Brasil, mas os fabricantes recorreram. Segundo o Comitê de Prevenção de Acidentes e Envenenamento, da Academia Norte-Americana de Pediatria, a velocidade que o andador dá ao bebê impede que os pais reajam a possíveis acidentes. A pesquisadora sueca, Ingrid Emanuelson, publicou uma análise dos casos de traumatismo craniano moderado em crianças menores de 4 anos e definiu o andador como o produto infantil mais perigoso.