Principal causa de morte por infecção no mundo, afetando 19 milhões por ano, a sepse não tem tratamento específico e, com a crescente resistência aos antibióticos, resulta em alto índice de letalidade. Para combater diretamente esse processo inflamatório, no qual o corpo passa a destruir os próprios tecidos e órgãos em resposta a um agente infeccioso, pesquisadores do Instituto Avançado Samsung de Tecnologia, na Coreia, desenvolveram um anticorpo que, em vez de focar no patógeno ou na inflamação, tem como alvo os vasos sanguíneos. Em ratos, eles conseguiram reverter o processo. O resultado do estudo foi publicado na edição mais recente da revista Science Translational Medicine.
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Você sabe o que é sepse? Síndrome mata mais de 360 mil pessoas por ano no Brasil Infecções Hospitalares: por que as pessoas não fazem o óbvio?Infecção hospitalar. Entenda a origem do problemaEle ajuda a barreira do endotélio a se proteger da inflamação vascular e, consequentemente, evita o rompimento dos vasos sanguíneos. Contudo, compostos que estimulam a produção do TIE2 ou inibem a ANG2 — uma proteína que bloqueia esse receptor — até agora foram apenas parcialmente efetivos ou impraticáveis para uso clínico.
Na nova pesquisa, a equipe da pesquisadora coreana Sangyeul Han desenvolveu um anticorpo incomum, que se liga à ANG2, formando um complexo que ativa, em vez de inibir, tanto a proteína quanto o receptor. Em diversos modelos de ratos com sepse, ele prolongou a sobrevivência mais do que o tratamento usual, que apenas bloqueia a ANG2.
Quando combinado a antibióticos, o tratamento foi ainda mais eficaz. Os testes mostraram que o anticorpo estabiliza os vasos sanguíneos, fortalecendo a barreira que impede a fragilidade dos mesmos e, consequentemente, o vazamento de líquidos para o organismo. Seug Jun Lee, cientista que participou do estudo, diz que o método fortalece os vasos sanguíneos, de forma que o corpo se mantém estável para lutar contra a infecção, o que previne mais danos. “Esse método provavelmente se tornará um tratamento terapêutico para a sepse e, aparentemente, mortes por essa causa não serão mais inevitáveis”, acredita. “No passado, tratar a sepse significava lutar contra a infecção, mas o sistema imunológico continuava a atacar o próprio organismo, e as pessoas morriam”, recorda.
Outras doenças
De acordo com a pesquisadora, o anticorpo poderá, inclusive, se tornar um tratamento em potencial para outras doenças que envolvem o rompimento vascular, como malária e antrax. “O uso dessa técnica para o tratamento de sepse pode ser apenas o início. Como ataques cardíacos também causam estresse no corpo, que resulta na produção de ANG2, ao reduzir essa produção, nosso método poderia aliviar a severidade dos ataques e aumentar o índice de sobrevivência”, afirma Lee. Além disso, os pesquisadores acreditam que será possível utilizar essa abordagem como parte da cura de infecções graves, como ebola e Mers, pois ambos causam desintegração devastadora do sistema vascular.
Em um artigo de análise do trabalho publicado na Science Translational Medicine, Samir M. Parikh, do Centro de Pesquisa de Biologia Vascular da Faculdade de Medicina de Harvard, destacou a importância de se buscar uma nova abordagem de enfrentamento da sepse. “Ao descrever uma forma inovadora de estimular (o receptor) TIE2, Han e equipe não apenas elucidaram aspectos da biologia única desse receptor, como também renovaram o foco, ao procurar modos de estabilizar o corpo, à medida que ele luta contra a infecção”, avaliou.