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Na guerra contra essa epidemia, cientistas reconhecem que precisam conhecer melhor o inimigo. Para tanto, eles buscam na genética e no comportamento de regiões distintas do cérebro pistas que ajudem a esclarecer a propensão ao distúrbio, incluindo possíveis alterações metabólicas que dificultam a queima de gordura e mecanismos associados à eterna sensação de fome. O entendimento da ciência é de que, diante do aumento expressivo da doença em todo o mundo — há tempos, a obesidade deixou de ser um problema apenas dos países ocidentais e desenvolvidos —, já não basta dizer aos pacientes que gastem mais e consumam menos calorias. “Essa equação é simplista. Se nos basearmos apenas nela, vamos perder a batalha contra a obesidade”, acredita Nadia Pietrzykowska, fundadora do Weight & Life, um centro de estudos sobre obesidade da Flórida.
O que se sabe bem é que a ingestão alimentar é regulada por regiões específicas do cérebro. Sinais enviados e recebidos por células localizadas no órgão e em outras partes do corpo, como intestino, pâncreas e tecido adiposo, compõem o sistema. O balanço desse processo, explica Pietrzykowska, leva à homeostase, que governa a sensação de fome e regula o peso corporal. “O elemento-chave desse mecanismo está localizado em uma região do cérebro chamada hipotálamo, que é considerado o centro do apetite e da energia. Os sinais que chegam lá informam ao cérebro se estamos com fome, por meio do hormônio grelina, ou se estamos satisfeitos, por meio de uma variedade de outros hormônios”, explica. Uma alteração nesse processo, seja por questões biológicas, seja por ambientais (disponibilidade e preço de alimentos e incentivo para consumir porções super-sizing, por exemplo), está diretamente associada ao ganho de peso.
Pesquisadores da Universidade de Columbia, em Nova York, anunciaram a descoberta de uma variação genética que pode aumentar a suscetibilidade individual à obesidade, justamente por perturbar o balanço nesse sistema. Desde 1986, Rudolph Leibel, que liderou o estudo, investiga em ratos e em humanos a fisiologia e o DNA do excesso de peso. “As causas da obesidade variam de monogênicas, caso de mutações no gene MC4R, a poligênicas. A base genética para a maior parte dos casos de obesidade ainda não foi identificada. É provável que a interação de diversos genes, cada um com efeitos individualmente modestos, determine a predisposição à doença”, observa.
Saciedade
Um desses genes é a proteína de obesidade e de massa de gordura associada (FTO), cuja variante já foi associada, em estudos anteriores, ao aumento de ingestão alimentar e, consequentemente, do peso corporal. Até agora, porém, não se sabia como a mutação provocava esses efeitos. No laboratório de Leibel, os pesquisadores descobriram que uma alteração na FTO afeta um gene localizado próximo a ela, o RPGR1P1L. Em ratos, a redução da expressão do gene fez com que os animais comessem mais e ficassem mais gordos.
O mecanismo é um pouco mais complexo: ao estudar os neurônios desses roedores, os cientistas constataram que eles produziam pouca resposta ao hormônio leptina, o que sinaliza a saciedade. “Isso pode ser responsável pelo aumento da ingestão de alimentos, mas precisamos aprofundar mais o estudo. A maioria dos tratamentos disponíveis para obesidade não funciona. Nós temos de continuar a buscar as bases da doença para encontrarmos meios mais eficazes de enfrentá-la”, defende o médico.
Efeito sanfona
Um dos focos do trabalho de Leibel também é o estudo de mecanismos que impeçam ex-obesos de recuperar o peso. “Emagrecer não é um processo difícil. Se você pega um adulto com índice de massa corporal acima do normal e o coloca em um regime de 800 calorias por dia, ele vai perder peso. O que vai acontecer depois disso, porém, nós todos sabemos. Ao voltar à dieta normal, a pessoa vai recuperar o peso rapidamente”, observa.
Na Universidade de Copenhague, pesquisadores buscam uma solução para esse problema. E garantem que é possível — mas, para tanto, precisa-se de persistência. Um ano após o início do processo de emagrecimento, caso o indivíduo continue a perder peso ou consiga mantê-lo, os níveis dos hormônios do apetite ficam normais. Em um estudo publicado no European Journal of Endocrinology, os cientistas dinamarqueses mostraram que, comparadas ao começo do programa de perda de peso, as taxas dos hormônios inibidores da fome (GLP-1 e PYY) aumentam.
A grelina, que estimula o apetite, também se normaliza, evitando que as pessoas acabem comendo demais. “O estudo mostrou que, se uma pessoa acima do peso é capaz de manter a perda inicial — nesse caso, por um ano —, o corpo, no fim, vai aceitar esse novo peso e não lutar contra ele, como geralmente faz quando você está em um estado de deficit calórico”, disse, em nota, Signe Sorensen, principal autora do trabalho.
Juízos de valor diferenciados
Outra pesquisa recente - publicada no International Journal of Obesity - encontrou uma pista da epidemia na estrutura cerebral dos obesos. Segundo os autores, ela é diferente da dos demais indivíduos em regiões-chave envolvidas no processo de juízo de valor. Os cientistas da Universidade de Cambridge descobriram que, quando têm de fazer escolhas alimentares hipotéticas, obesos e não obesos optam por alimentos saudáveis. Contudo, frente à realidade, os que estão acima do peso tendem a escolher pratos gordurosos e calóricos. Isso foi verificado por meio da atividade cerebral dos participantes do estudo.
Os cientistas pediram a 23 pessoas com peso normal e 40 indivíduos com sobrepeso/obesidade para dar notas a 50 alimentos que apareciam na tela de um computador. De 0 a 5, eles precisavam apontar o quanto aquela iguaria era saudável e também o quanto parecia gostosa. Fazia parte do teste um alimento neutro — uma barra de cereal —, usado para fazer trocas hipotéticas com os voluntários. Enquanto mediam a atividade cerebral por meio de ressonância magnética, os pesquisadores perguntavam se o participante trocaria um alimento bem avaliado do ponto de vista do gosto ou dos valores nutricionais pela barra de cereal.
Em ambos os grupos, o paladar guiava as escolhas: eles diziam que trocavam caso a comida ofertada parecesse mais apetitosa que a barra, mas preferiam o cereal, caso a oferta não aparentasse ser gostosa. O desejo de trocar o alimento foi associado a níveis maiores de atividade em uma região-chave do cérebro, o córtex pré-frontal ventromedial, relacionado ao grau de valor que as pessoas atribuem a uma recompensa.
Tentações
Esse fenômeno foi observado nos dois grupos. Tudo mudou, porém, quando os participantes ficaram frente a frente com comida de verdade. Na etapa seguinte do experimento, eles foram para uma sala em que havia uma grande mesa cheia de sanduíches, doces, bebidas e petiscos. Para cada grupo alimentar, havia escolhas mais ou menos saudáveis, como sanduíche de frango e de bacon, ou refrigerante normal e diet.
Novamente, eles deram notas para os pratos, baseados no gosto e nos valores nutricionais. Depois disso, podiam comer o quanto quisessem. Nesse momento, as diferenças entre os grupos ficaram bastante evidentes. Embora as notas tivessem sido semelhantes, os indivíduos com sobrepeso/obeso consumiram muito mais alimentos não saudáveis e em maior quantidade.
“Saber que um alimento não faz bem e dizer, hipoteticamente, que não vai consumi-lo não quer dizer nada. Isso porque, quando confrontado com essas comidas, o juízo de valor vai mudar e você vai ceder à impulsividade”, observa Nenad Medic, pesquisadora do Departamento de Psiquiatria de Cambridge e uma das autoras do estudo. Ela conta que, em um experimento posterior, ao medir a estrutura cerebral de 200 indivíduos saudáveis, aqueles com índice de massa corporal maior apresentaram massa cinzenta mais reduzida na região do córtex pré-frontal ventromedial.