Até recentemente, acreditava-se que o útero era um ambiente completamente estéril. Como uma bolha protetora, ele impediria a entrada de qualquer germe materno. Em 2007, porém, pesquisadores do Hospital Infantil do Texas, nos Estados Unidos, começaram a desconfiar dessa teoria. Afinal, com sete dias de vida, o bebê já carrega no intestino uma vasta e complexa flora bacteriana. Mesmo entrando em contato com micro-organismos no momento do parto, isso não seria o suficiente para colonizá-lo tão efetivamente — ainda mais considerando que uma boa parte das crianças vem ao mundo por cesária, não entrando em contato com a pele e os fluidos maternos.
A confirmação de que o útero não é tão livre de micróbios assim veio dois anos atrás, em uma pesquisa da Universidade de Nashville, também norte-americana.
Foi o que constataram, agora, os cientistas suíços. Embora o trabalho, publicado na revista Science, tenha sido realizado em ratos, eles acreditam que os mecanismos observados sejam os mesmos que se passam com as pessoas. Outros animais e mesmo insetos, como baratas, compartilham a microbiota materna ainda antes de nascer, não havendo, de acordo com Mercedes Gomez de Agüero, principal autora do artigo, motivos para isso não ocorrer em humanos.
Micróbios programados
Na pesquisa, a equipe da gastroenterologista infectou fêmeas gestantes com uma cepa da bactéria E. coli programada para desaparecer do organismo na época do nascimento dos ratos. Isso porque a ideia era justamente descartar que a cria havia sido contaminada no momento do parto. Comparado aos animais cujas mães não foram infectadas, os recém-nascidos tinham, em seu intestino, níveis maiores de células linfoides e mononucleares, que são componentes do sistema imunológico.
“Isso aconteceu mesmo com os ratos tendo nascido e sido mantidos em um ambiente estéril, sem contato com germes que poderiam estimular o desenvolvimento dessas células”, observa Agüero. A explicação para eles apresentarem uma proporção maior de estruturas imunes que os do grupo de controle é que, tendo sido exposto à bactéria, o corpo se protege, organizando seu exército de defesa.
Em um segundo experimento, a equipe liderada por Gomez de Agüero colonizou — também temporariamente — as fêmeas gestantes com um coquetel composto por oito espécies de micróbios. Ao nascer, os ratos apresentavam uma atividade maior de diversos genes, como os implicados com a divisão e a diferenciação celular, o metabolismo e o sistema imunológico. Todas essas funções estão associadas à microbiota intestinal, nota a pesquisadora. “Não temos como ignorar mais o fato de que a exposição a micróbios no útero é a primeira inoculação de micróbios benéficos, mesmo antes do nascimento”, acredita a pesquisadora.
Contudo, ela admite que só agora a ciência está começando a entender melhor as funções da microbiota intestinal em adultos. “Então, ainda não está claro o papel que ela desempenha no recém-nascido.