Depois de anos de estudo em roedores, os pesquisadores das universidades de Tóquio, de Osaka e de Medicina Dentária de Tóquio observaram que a droga proposta estabiliza a pressão dos vasos sanguíneos por mais tempo e também protege os neurônios, o que diminui as sequelas e mortes decorrentes do derrame cerebral (veja infográfico). “A vacina é duradoura, tem efeito anti-inflamatório e se mostra capaz de proteger o cérebro após o bloqueio de um vaso sanguíneo. Tem o potencial de ser uma terapia para a pressão alta e uma prevenção do AVC”, afirmou o time de cientistas em nota sobre a pesquisa.
A descoberta sobre a capacidade da droga de proteger o cérebro do AVC veio de uma curiosidade sobre os efeitos da vacina nessa região. Em princípio, ela foi elaborada para diminuir a atividade do hormônio angiotensina II, um pivô no tratamento da hipertensão e também associado ao AVC isquêmico. “Embora haja estudos que apliquem a vacina para tratar a hipertensão, até o momento, não foi dada atenção à sua eficácia sobre o AVC isquêmico”, destacaram os cientistas. Para sanar essa lacuna, eles dividiram ratos hipertensos em dois grupos: um com 53 roedores que receberam a vacina, o outro com 41 que receberam compostos de sal.
Os cientistas provocaram derrame em todas as cobaias.
Os benefícios da vacina foram comemorados por especialistas brasileiros, que apostam em mais análises para confirmar os mesmos resultados em humanos. “A equipe japonesa trouxe um protótipo com menos efeitos colaterais e mais duradouro em animais. A expectativa é de que a vacina se mostre como uma nova modalidade no tratamento da hipertensão, o que também previne os desfechos dessa doença, que são o infarto e o derrame”, avalia o cardiologista Marcus Bolívar Malachias, presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia e professor da Faculdade de Ciências Médicas da Fundação Lucas Machado, em Belo Horizonte.
Sistemas ligados O cardiologista lembra que, há aproximadamente cinco anos, foi desenvolvida e testada em humanos outra vacina para o tratamento da hipertensão. Segundo Malachias, a droga mostrou-se eficaz em uma pequena quantidade de voluntários, mas não chegou a ser liberada devido à curta durabilidade dos efeitos – seriam necessárias aplicações mensais – e pelo fato de pouco se saber sobre os efeitos colaterais a longo prazo. “O sistema angiotensina interage com outros, como o nervoso e o renal. Quando tomo um medicamento, ele não age apenas em um sistema. Por isso, é necessário todo o cuidado para aperfeiçoar esses protótipos”, ressalta.
Com opinião semelhante, José Francisco Kerr Saraiva, professor de cardiologia da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) e coordenador de Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia, observa que os resultados apresentados pela equipe do Japão são um alento para o controle da hipertensão e a prevenção do AVC, porém são necessários mais estudos. “São resultados gratificantes e auxiliam para que se chegue ao uso em humanos. Desenvolver produtos que possam acrescentar nas terapias é essencial, especialmente porque a hipertensão é o principal fator de risco associado ao AVC.”
Anticoagulante Em outro estudo apresentado na Conferência Internacional da Associação Americana do Derrame, pesquisadores do Northwestern Memorial Hospital em Chicago, nos Estados Unidos, confirmaram a eficácia da substância idarucizumab, que reverte os efeitos do anticoagulante à base de dabigatrana. O resultado oferece mais segurança a quem sofre de fibrilação atrial e trombose, pessoas que geralmente precisam ingerir anticoagulantes para evitar, por exemplo, a formação de coágulos no sangue – principal causa do AVC isquêmico.
Há, porém, um grave efeito colateral dessas substâncias: ao “afinar” o sangue, elas podem provocar hemorragias, externas ou internas, levando até mesmo ao AVC hemorrágico. Para evitar os sangramentos, estudiosos desenvolveram um antídoto, o idarucizumab, que está na terceira fase de testes, focados em eficiência e segurança.
Os resultados foram estimulantes: os pacientes apresentaram total reversão do efeito de “afinar” o sangue provocado pelo anticoagulante, uma forma imediata de pôr fim à hemorragia. “O que esperamos com esse estudo é que, ao reverter o efeito de promover o sangramento evitemos também a ocorrência de todos os tipos de sangramentos associados à dabigatrana”, explicou, em entrevista ao Estado de Minas o líder do estudo e diretor do programa de derrame do Northwestern Memorial Hospital em Chicago, Richard A. Bernstein.
De acordo com o cardiologista José Francisco Kerr Saraiva, os dados obtidos trazem importante avanço no tratamento da fibrilação atrial e da trombose, doenças medicadas com dabigatrana.
“Esse anticoagulante é mais eficaz na prevenção do AVC isquêmico e mais seguro do que a substância usada antes, a varfarina. Com a dabigatrana, o risco de sangramento cerebral caiu em 70%, mas ainda existe”, ressalta o especialista. “A partir do idarucizumab, o paciente tem segurança para ingerir o anticoagulante, porque, se sofrer um acidente e precisar de uma cirurgia urgente, terá como diminuir o sangramento”, compara.
Regulador
A angiotensina II é um potente hormônio vasoconstritor, que age na contração dos vasos sanguíneos. Trata-se de um importante sistema de regulação da pressão sanguínea e das funções do organismo, mas pode se tornar nocivo quando desregulado por outras substâncias ou por causas genéticas.
Fórmula básica de proteção
Cientistas do Centro Médico de Langone, da Universidade de Nova York (EUA), chegaram a uma fórmula para evitar o acidente vascular cerebral (AVC). Segundo eles, dormir de sete a oito horas por noite e se exercitar por 30 minutos a uma hora de três a seis vezes por semana reduz significativamente as chances de um adulto sofrer um derrame. A receita preventiva também foi apresentada na Conferência Internacional da Associação Americana de Derrame. Para chegar a esse resultado, os pesquisadores fizeram uma análise computadorizada relacionando saúde, estilo de vida, demografia e outros fatores relativos a 288 mil adultos. Os cientistas analisaram dados de 2004 a 2013 e concluíram que aqueles que dormiam entre sete e oito horas por noite tinham 25% menos chances de sofrer um derrame.