A partir da investigação de estudos anteriores, o grupo liderado por Mara Mather oferece novas reflexões sobre alterações relacionadas ao envelhecimento em um neuromodulador chamado norepinefrina (NE). Conhecido pelo papel na excitação comportamental, no controle da frequência cardíaca e na pressão arterial, essa substância também regula a memória, a atenção e a cognição. Experimentos feitos com ratos mostraram que, quando liberado no LC, o NE protege os neurônios de fatores que matam as células e aceleram o Alzheimer, como a inflamação e a estimulação excessiva de outros neurotransmissores — substâncias químicas produzidas pelos neurônios.
Do tamanho de um grão de arroz, o LC é a estrutura cerebral de maior densidade de neurônios noradrenérgicos — que interagem com a norepinefrina e outros neurotransmissores — e parece ser a primeira região em que surge o Alzheimer. Isso porque, diz Mather, a patologia tau — caracterizada por emaranhados de proteína encontrados em neurônios que sofrem a degeneração — se manifesta primeiro nessa região da cabeça. Embora nem todas as pessoas com esse acúmulo desenvolvam o tipo mais comum de demência, os resultados da autópsia indicam que quase todos os adultos têm indicações iniciais da patologia no LC.
“Durante muito tempo, falou-se que o Alzheimer começava no córtex entorrinal, área do hipocampo mediada por neurônios que trabalham com a acetilcolina, substância relacionada ao funcionamento da memória.
O achado também explica por que uma classe mais moderna de antidepressivos que atua nos noradrenérgicos oferece melhorias na memória e como esses medicamentos podem ter efeitos mais relevantes em pacientes com Alzheimer que os tradicionais. “Hoje, a maioria dos remédios para DA trabalha nas vias de acetilcolina. Até aqui, os médicos diziam que o problema era nessa substância, e isso é uma verdade, mas não completa: há problema também na noradrenalina. Isso significa que novos estudos de tratamentos podem ter como alvo regiões que não são tradicionalmente contempladas — o que, na prática, já está sendo feito. Esse estudo reforça essa percepção”, acrescenta Castello.
Reserva cognitiva
Os noradrenérgicos são liberados durante atividades mentais desafiantes, como aprender uma língua. “Educação e carreiras estimulantes promovem a reserva cognitiva, ou seja, o desempenho eficaz do cérebro durante o envelhecimento, apesar da invasão da patologia tau”, alerta Mather. “A ativação do sistema LC-NE pela novidade e pelo desafio mental ao longo da vida pode contribuir para essa reserva.”
Bruna Mendonça Lima, neurologista do Hospital Santa Luzia, em Brasília, considera estudos como o norte-americano interessantes porque, apesar de não baterem o martelo, oferecem observações relevantes para o desenvolvimento de medicamentos e até mesmo exames que sejam preditores da doença. “Poderíamos, a partir desse conhecimento, desenvolver formas de diagnóstico precoce. Hoje, só podemos dizer se uma pessoa tem Alzheimer tardio quando ela já apresenta os sintomas”, opina a também membro da Academia Brasileira de Neurologia.
Essa realidade, contudo, é distante, na visão de Cláudio Roberto Carneiro, coordenador de Neurologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília. “Tudo é muito teórico. A gente já sabia dessa região e, agora, viram que ela sofre antes com a patologia.