Há diferentes modalidades de estimulação sendo utilizadas comercialmente ou de forma experimental. Uma, em particular, está chamando a atenção de pesquisadores porque se mostra eficaz em estudos sobre o tratamento de uma variedade de condições, como depressão, deficit de atenção e transtorno do estresse pós-traumático (TEPT). Um experimento recente, feito com um pequeno número de pacientes que sofriam consequências de traumas há três décadas, constatou que a chamada estimulação do nervo trigêmeo (TNS, sigla em inglês) é capaz de amenizar significativamente os sintomas de forma não invasiva.
Desenvolvida pela Universidade da Califórnia em Los Angeles (Ucla), a TNS é feita com o paciente dormindo. Basta encostar na testa dele um eletrodo que tem formato e textura de um adesivo curativo. O sensor fica conectado a um aparelho do tamanho de um celular, programado pelo médico e alimentado por uma bateria comum de 9V. Durante oito horas, o equipamento manda sinais elétricos para o cérebro através do nervo trigêmeo, que tem várias ramificações, inclusive na testa. Como ele fica muito próximo da pele, consegue captar bem os impulsos e enviá-los para diversas estruturas cerebrais associadas a ansiedade, medo e humor, entre outras.
Idealizada em 1987, a técnica passou por aprimoramentos e, em 2003, a Ucla publicou as primeiras evidências científicas de sua eficácia para epiléticos resistentes ao tratamento medicamentoso tradicional.
Revivência extrema
O psiquiatra Andrew Leuchter, professor de psiquiatria e diretor de neuromodulação do Instituto de Neurociência e Comportamento Humano Semel, na Ucla, explica que, de forma geral, boa parte dos pacientes de transtorno do estresse pós-traumático se beneficia dos tratamentos existentes, mas a grande maioria convive com os sintomas por muitos anos. “Para essas pessoas, uma nova terapia como a TNS seria um ganho enorme porque, no caso delas, é impossível imaginar a vida sem esses sintomas debilitantes”, observa.
Decorrente de situações extremamente negativas, como ter sido vítima ou testemunha de um estupro, um ataque terrorista ou uma tragédia natural, por exemplo, o transtorno do estresse pós-traumático caracteriza-se pela repetição frequente dos sentimentos vivenciados naquele momento, um processo chamado de revivescência. A pessoa torna-se hipervigilante, ansiosa, deprimida e costuma buscar o afastamento social. Hoje, o tratamento consiste em terapia cognitivo-comportamental, que pode vir associada de medicamentos.
Leuchter organiza testes no Instituto de Neurociência com pacientes que sofrem desse problema e tem obtido bons resultados. No último experimento, realizado com 12 pessoas, o efeito da neuroestimulação elétrica, segundo ele, foi animador. “Nós estamos falando de pessoas que convivem há 30 anos com sintomas como pesadelos, insônia, irritabilidade, depressão e hipervigilância. São pacientes que passam por isso praticamente durante toda a sua vida”, ressalta, acrescentando que, para elas, o tratamento convencional não conseguiu contornar os sintomas do transtorno.
De acordo com o médico, pessoas com o distúrbio têm seis vezes mais risco de cometer suicídio, além de serem mais propensas a abandonar os estudos e a se divorciar. “O TEPT as acompanha em todos os aspectos. Quem sofre de transtorno pós-traumático geralmente tem dificuldade de trabalhar em grupo, educar os filhos e manter um relacionamento saudável. Devido ao medo de reviver a situação, acaba relutante em se socializar ou sair de casa, preferindo se isolar”, descreve.
Terapia conjunta
Os voluntários que participaram do experimento da Ucla foram recrutados no programa de atendimento a vítimas de estresse pós-traumático vinculado ao Departamento de Psiquiatria da universidade norte-americana. São sobreviventes de estupro, acidentes de carro e abuso doméstico, entre outros.
“Posso dizer que o efeito foi realmente incrível para todos eles”, assegura o psiquiatra, que apresentou resultados preliminares do experimento recentemente em três conferências médicas nos Estados Unidos. “Eles chegavam e diziam: ‘Pela primeira vez em muitos anos, dormi a noite toda’. Ou então falaram que conseguiram dormir sem ter pesadelos. Foi extraordinariamente poderoso”, diz Leutcher. Agora, o especialista conduz a segunda fase do trabalho, feita com 74 veteranos do Exército que serviram no Iraque após os atentados às Torres Gêmeas de Nova York em 11 de setembro de 2001. Para esse estudo, metade dos participantes vai usar o equipamento real, enquanto os outros usarão um sensor falso. Dessa forma, será possível fazer uma comparação da eficácia da TNS.
Aposta também contra o déficit de atenção
O equipamento para a estimulação do nervo trigêmeo (TNS, sigla em inglês) só está disponível na Europa e no Canadá. Segundo James McGough, que também pesquisa esse tipo de estimulação cerebral na Universidade da Califórnia em Los Angeles (EUA), nesses lugares, o procedimento recebeu aprovação dos órgãos regulatórios, com indicação para o tratamento da epilepsia e da depressão. Contudo, ele acredita que, em breve, os Estados Unidos liberem a TNS no país não apenas para essas duas condições, mas para o transtorno de deficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e o estresse pós-traumático.
No ano passado, McGough apresentou os resultados do ensaio clínico de fase II da tecnologia realizado com 90 crianças de 8 a 12 anos que apresentavam impulsividade, dificuldade de concentração e hiperatividade, os três principais sintomas de TDAH.
Segundo o médico, houve melhoras significativas após oito semanas de tratamento feito em casa, enquanto as crianças dormiam.
“Para crianças e adolescentes com deficit de atenção e hiperatividade, a estimulação do nervo trigêmeo é uma alternativa a medicamentos. Elas tiveram uma melhora muito grande sem precisar recorrer a psicotrópicos”, diz. “Essa condição afeta por volta de 9,5% das crianças em idade escolar e 4,4% dos adultos, e, atualmente, o que existe de tratamento é terapia comportamental e remédios estimulantes. Há uma grande demanda por abordagens não medicamentosas para o TDAH e poucas opções nesse sentido com comprovação científica”, afirma. Outra vantagem apontada por McGough é que, por não ser invasiva nem farmacológica, a tecnologia é bem-aceita por pais e pacientes, garantindo a adesão ao tratamento..