Eles compararam esses resultados com os de voluntários que receberam placebo e observaram que não houve, no primeiro grupo, um ganho de peso significativo — um dos efeitos colaterais da droga. “Durante anos, o lítio foi prescrito para crianças com transtorno bipolar sem dados cientificamente rigorosos sobre a efetividade e os riscos dele. Agora, temos essa comprovação a curto prazo. O próximo passo é fazer um estudo a longo prazo para observar os efeitos colaterais da droga”, destaca Robert Findling, especialista em psiquiatria e comportamento, e coordenador do estudo norte-americano publicado recentemente na revista Pediatrics.
Os efeitos no corpo humano do lítio ainda não foram totalmente comprovados, mas há indícios de que esse carbonato tenha uma ação neurológica. Quando ingerido durante muito tempo, porém, provoca diversas complicações.
Boechat diz que a substância ainda é considerada a melhor droga para o tratamento de transtornos. “Trata-se da primeira opção para pacientes adultos, mas deve haver muita cautela. Precisam ser feitas muitas avaliações, o peso tem que ser mantido com dietas. É um tratamento complexo para evitar os efeitos colaterais. Em crianças, o rigor tem que ser ainda maior”, ressalta.
O psiquiatra pondera também que, apesar de arriscado, é importante diagnosticar e tratar ainda na infância o transtorno bipolar para evitar complicações graves na adolescência e na vida adulta, como o uso de alucinógenos e até mesmo o suicídio. “A vida do bipolar começa muito prejudicada. Há grandes chances de o adolescente com o transtorno se tornar um usuário químico ou cometer crimes. É provável que ele se transforme em um adulto problemático, compulsivo, com hábitos sexuais anormais e problemas sociais”, alerta.
Humor
O diagnóstico do transtorno bipolar em crianças é recente. No fim da década de 1190, a ciência começou a perceber a manifestação da bipolaridade logo na infância. Mesmo com alguns avanços científicos, os especialistas seguem tendo dificuldade para identificar o problema. “Os desafios ocorrem devido à falta de especificidade dos sintomas.
Nessa mesma linha, Boechat considera importante que familiares e pedagogos fiquem atentos a mudanças frequentes no humor dos pequenos e que não tenham preconceito em procurar um profissional para diferenciar os traços de personalidade de uma manifestação bipolar. “A criança deve ser avaliada em comparação com ela mesma. Se ela muda de comportamento facilmente e há prejuízos graves, precisa-se consultar um especialista. Ela pode ser apenas uma criança tímida, mas esses comportamentos devem ser observados”, ressalta. “Não devemos rotular os comportamentos das crianças, mas ficar atentos às alterações de humor sem motivo aparente e prolongadas. Boa parte dos adolescentes problemáticos talvez teria uma vida mais tranquila se tivesse sido tratada na infância.”
Contra o Parkinson
O lítio também é um atenuador de efeitos colaterais provocados por um conhecido tratamento de Parkinson, um medicamento composto por levodopa e carbidopa. Outro estudo norte-americano, conduzido pelo Instituto Buck e publicado em julho na revista Brain Research, mostrou, em ratos, que baixas doses de lítio diminuem os movimentos involuntários causados quando o remédio antiparkinsoniano é ingerido durante pelo menos por seis anos.
Tardio
4,2 milhões de brasileiros sofrem de transtorno bipolar, de acordo com o último levantamento da Associação Brasileira de Psiquiatria, feito em 2012. Na maioria dos casos, o paciente é diagnosticado após 10 anos da primeira manifestação do transtorno, pois há sintomas semelhantes aos da depressão, do deficit de atenção (TDAH) e da esquizofrenia.
Manejo delicado
“O lítio foi um marco divisório no século passado no tratamento da bipolaridade.
Sônia Palma, vice-presidente da Associação Brasileira de Transtorno Afetivo (Abrata) e especialista em psiquiatria infanto juvenil.