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A beleza já foi tema de muitos estudos. Pesquisas anteriores concluíram que determinadas características tendem a ser consideradas atraentes por todos, como rostos simétricos. Dada a quase universalidade de preferências desse tipo, cientistas desconfiam de que elas estejam inscritas em nosso código genético, sendo transmitidas de geração em geração há milênios. Essas análises, no entanto, não conseguem explicar os gostos pessoais, justamente os que provocam episódios como o descrito acima.
Em busca de respostas, uma equipe da Unidade de Genética Psiquiátrica e Desenvolvimento Neurológico no Massachusetts General Hospital estudou, primeiro, as preferências gerais de mais de 35 mil pessoas, que participaram de um teste no qual deviam avaliar rostos por meio de um site na internet. Com essas informações em mãos, eles puderam, então, desenvolver um novo teste capaz de identificar as peculiaridades do gosto de cada pessoa em relação a rostos.
Gêmeos
Para poder calcular depois a influência da genética nos resultados, os cientistas selecionaram para esse segundo teste 547 pares de gêmeos idênticos e 214 pares de gêmeos não idênticos e do mesmo sexo. Cada participante avaliou 200 faces, dando uma nota que ia de 1 (muito pouco atraente) a 7 (muito atraente). Os resultados, conta a equipe em um artigo publicado esta semana na revista Current Biology, indicam que experiências de vida de cada um moldam certas preferências que fazem com que a preferência de cada um se torne peculiar.
“De longe, o fator que mais pesou em determinar as preferências individuais sobre o rosto de alguém foram os ambientes individuais ou as experiências de vida e visuais únicos, e não a família ou genética”, afirma Laura Germine, coautora do estudo e pesquisadora na Unidade de Genética Psiquiátrica e Desenvolvimento Neurológico no Massachusetts General Hospital.
Germine destaca que as interações sociais, como as imagens mostradas pela mídia, e as experiências particulares, como o primeiro namorado ou namorada, são os fatores que mais influenciam no julgamento estético. “Os ambientes importantes (para a formação do gosto) não são aqueles compartilhados na família, são muito mais sutis e individuais. Eles podem incluir, por exemplo, vivências únicas e altamente pessoais com amigos ou colegas, bem como experiências com a mídia social”, completa a autora.
Modelagem
Vivian Diller, psicóloga e especialista em psicanálise da Universidade de Nova York, também acredita que experiências vividas possam influenciar nas escolhas sobre estética. “Sabemos que há aspectos universais de atratividade, ligadas à sobrevivência da espécie. Ser saudável, jovial e parecer fértil são características que costumam tornar as mulheres atraentes aos homens. Já força e virilidade tende a fazê-los mais interessantes para elas. Mas a química da atração é exclusiva da história de cada pessoa. Nós provavelmente somos ‘modelados’, desde o início da vida, para encontrar certos cheiros e outras sensações atraentes”, avalia.
Na opinião de Ana Rita Coutinho, professora do curso de psicologia do Centro Universitário Iesb de Brasília, a pesquisa americana traz dados interessantes sobre os elementos envolvidos no conceito de beleza. “Temos a ideia de que a beleza é determinada pela genética, que existem padrões do belo que valem para todo mundo, mas esse estudo ajuda a desconstruir isso. Ele mostra que o que é bonito para cada um depende muito do contexto em que a pessoa está inserida”, destaca a especialista.
Coutinho destaca que, com a tecnologia, padrões de beleza se espalharam com mais facilidade, influenciando as preferências atuais. “Temos uma mídia que funciona no mundo inteiro, e grande parte das pessoas tem acesso ao mesmo tipo de padrões. Isso faz com que as preferências acabem se formando em torno dessas informações”, completa. Sem descartar o papel de outros fatores, como a própria genética, Vivian Diller concorda: “É muito provável que cada um de nós tenha crescido com imagens de beleza trazidas pelo ambiente, especialmente a mídia”.
Até nas aves
Pesquisa realizada pela Universidade de Bristol, no Reino Unido, mostrou que as aves também possuem uma preferência por padrões simétricos. Os pesquisadores realizaram um experimento no qual foram colocados anéis em cada pata de pássaros machos. Parte deles recebeu um elemento de cada cor, enquanto outro grupo recebeu pares com cores iguais. Os cientistas notaram que, em 78% dos casos, as fêmeas preferiram os machos com acessórios da mesma cor. Os especialistas acreditam que a simetria mostra um sinal de saúde e de segurança, resultando na escolha das fêmeas.
“De longe, o fator que mais pesou em determinar as preferências individuais sobre o rosto de alguém foram os ambientes individuais ou as experiências de vida e visuais únicos, e não a família ou genética” - Laura Germine, coautora do estudo e pesquisadora na Unidade de Genética Psiquiátrica e Desenvolvimento Neurológico no Massachusetts General Hospital
Simétricos e peculiares
Diga uma celebridade que você considera muito bonita. Ao ouvir esse pedido, muitas pessoas respondem: “Angelina Jolie”. A atriz norte-americana há anos integra a lista de mulheres mais bonitas elaboradas por diversas publicações e sua beleza parece ter uma legião interminável de fãs. Por quê? Seus grandes olhos e lábios cheios, responderia Holger Wiese, pesquisador da Universidade Friedrich Schiller de Jena, na Alemanha.
Segundo Wiese, evidentemente, Jolie tem o primeiro requisito para ser considerada bela pela maioria das pessoas: um rosto simétrico. Mas o que faz com que ela seja tão admirada, muito mais que outras atrizes cujo rosto também é de uma simetria invejável, são detalhes que a tornam única — no caso a boca carnuda e os olhos imensos. Detalhes como esse, afirma o cientista, faz com que um rosto atraente tenha mais chances de ser guardado na memória das pessoas.
O pesquisador é autor de um estudo, realizado no ano passado, que demonstrou como algumas características pouco comuns fazem com que um rosto atraente seja mais lembrado pelas pessoas. No experimento, Wiese e colegas pediram a voluntários para avaliar fotos de rostos como atraentes ou não atraentes. As imagens eram mostradas por poucos segundos apenas. Depois, os voluntários voltavam a ver alguns dos rostos e deviam dizer se se recordavam deles ou não.
“As pessoas se mostraram mais propensas a lembrar os rostos não atraentes do que os atraentes que não tinham nenhum traço marcante”, contou Wiese em um comunicado emitido na época da publicação do estudo, na revista especializada Neuropsychologia. O autor admitiu que o resultado contrariou suas expectativas. “Até então, achávamos que era mais fácil memorizar faces consideradas atraentes, porque, afinal gostamos de olhar para rostos bonitos.”