Apesar de não existirem estatísticas sobre a incidência da doença, sabe-se que a fissura anal não é incomum, já que, com exceção de casos que necessitam de internação para tratamento cirúrgico, não são catalogados os pacientes que recebem e solucionam o problema em consultório. “Assim como na doença hemorroidária, as pessoas evitam falar que têm fissura anal, principalmente porque se sentem envergonhadas”, acrescenta o especialista.
Além disso, um dos principais fatores de risco para a fissura anal é a constipação intestinal, que, segundo o presidente da SBC, é extremamente comum na população. “Pessoas que sofrem de constipação intestinal têm mais chances de desenvolver a doença, em razão do trauma provocado pelas fezes endurecidas no momento da evacuação”, explica. Fábio Guilherme Campos diz que a gravidade com que a constipação intestinal se manifesta pode variar muito ao longo da vida da pessoa “na dependência de seus hábitos, sua alimentação, suas atividades e também de doenças. Define-se o problema por uma diminuição do número de vezes com que a pessoa evacua todos os dias e é geralmente acompanhada de dificuldade para evacuar e fezes ressecadas”.
Por essa razão, a alimentação influencia diretamente o risco do surgimento de uma fissura anal. “A ingestão insuficiente de fibras e líquidos resulta em prisão de ventre, que pode acarretar fissuras. Temos que destacar também o papel de alimentos condimentados, como a pimenta, na piora dos sintomas”, observa. O especialista diz que a fissura anal atinge principalmente jovens e adultos de média idade, em razão da alimentação predominantemente fora de casa e do dia a dia estressante. “Embora os mais idosos também possam ter fissura, ela não costuma ocorrer nessa faixa etária, quando a musculatura esfincteriana tende a ser um pouco mais flácida. O sexo feminino também é atingido, em razão da maior incidência de constipação intestinal”, explica.
Pessoas que mantêm relações com penetração anal mais frequentemente estão também mais expostas aos riscos de um trauma na região. “Principalmente, porque é repetitivo. Mas com cuidado, posição adequada e uso de lubrificante é possível prevenir”, explica o coloproctologista. A diarreia também pode desencadear uma fissura e crianças com distúrbios evacuatórios também podem desenvolver fissura anal. Existem, ainda, os casos que são decorrentes de doenças inflamatórias, como a doença de Crohn.
O receio sobre o exame médico é um dos principais fatores que afastam pacientes dos consultórios, mas Fábio Guilherme Campos reforça que é um procedimento simples, de curta duração, que inclui “uma inspeção cuidadosa da região anal, além de um toque retal. Algumas vezes, entretanto, o paciente tem tanta dor que o toque se torna impossível”, observa.
O presidente da SBC diz que as fissuras agudas podem cicatrizar espontaneamente, mesmo sem tratamento, mas isso não descarta o atendimento médico, já que a ferida pode provocar dor intensa, sangramento e influenciar na qualidade de vida do indivíduo. “Na fase aguda, deve-se regularizar o funcionamento intestinal, adotando-se medidas de higiene com banhos de assento e atenção com a alimentação”, salienta.
Em pacientes com algum fator de risco constante, como por exemplo, a constipação intestinal, a fissura pode se tornar crônica, ou seja, não cicatrizar. De acordo com ele, o uso de pomadas cicatrizantes vai solucionar muitos casos. “As pomadas conseguem cicatrizar cerca de metade dos casos, embora alguns deles recidivem. A medicação promove o relaxamento da musculatura esfincteriana, cuja contração involuntária está também associada ao desenvolvimento da ferida”, explica o especialista. Além do medicamento, o paciente deve adotar medidas higiênicas e comportamentais que ajudem no controle da dor e na cicatrização, segundo explica ainda o médico.
O tratamento cirúrgico é indicado para as fissuras crônicas, com bordas elevadas e muito dolorosas, que não respondem ao tratamento com as pomadas cicatrizantes. O procedimento consiste na remoção da fissura e na realização de uma esfincterotomia, pequeno corte no esfíncter anal interno (um dos músculos do canal anal). “Os pacientes com fissura crônica, geralmente, têm hipertonia esfincteriana, que é a contração involuntária do ânus. A cirurgia é considerada de pequeno porte e, ao contrário das operações para tratamento das hemorroidas, não costumam provocar muita dor no pós-operatório”, afirma.
A recuperação da cirurgia é de, no máximo, sete dias e o alívio dos sintomas após a operação traz, segundo o médico, alívio e conforto aos pacientes. Um dos principais receios em relação à cirurgia é incontinência fecal, mas o médico esclarece que dificilmente isso ocorre. “Antes de indicar o tratamento cirúrgico, o médico deve avaliar eventuais fatores de risco associados à disfunção esfincteriana. Pacientes idosos, pacientes que tenham algum grau (mesmo que leve) de incontinência fecal, pacientes com diarreias frequentes (como na síndrome do intestino irritável), pacientes com doenças inflamatórias intestinais, mulheres com alterações esfincterianas relacionadas a partos não devem ser submetidos à cirurgia. Salvo essas situações de risco, a cirurgia raramente compromete os esfíncteres anais de maneira importante”, afirma.
Por último, é importante salientar, ainda, que a fissura anal e a hemorroida são problemas diferentes mas, geralmente, causados por fatores semelhantes, como a constipação intestinal e trauma local.