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Deborah Da Costa, professora adjunta do Departamento de Medicina da Universidade McGill e autora principal do trabalho, conta que decidiu investigar o tema a partir de reflexões que surgiram em pesquisas sobre saúde mental que conduz desde 1995. “Elas mostram a importância do apoio do pai como um protetor para as mães em termos de desenvolvimento de depressão durante a gravidez e o pós-parto. Então, me perguntei se existiriam fatores que serviriam como barreira para as novas famílias em termos de apoio.” A especialista também notou falta de informações sobre o tema. “Busquei na literatura científica e percebi que não existem muitos estudos voltados para depressão em novos pais”, completa.
O experimento realizado por Costa e a equipe contou com a participação de 622 homens durante um ano e meio — desde o terceiro trimestre da gravidez da parceira até o filho completar 1 ano. Os participantes responderam a questionários que mediram fatores determinantes de depressão, como humor, prática de atividade física, qualidade de sono e estresse. Os pesquisadores descobriram que 13,3% dos pais apresentaram níveis elevados de sintomas depressivos. Entre as principais queixas, estavam problemas de sono, baixo apoio social e menos satisfação na relação com a parceira.
Para Marco Antônio Brasil, chefe do Serviço de Psiquiatria do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o estudo indica a existência de um desgaste gerado pela expectativa em torno da gravidez. “É importante enfatizar que qualquer situação de estresse atua como um fator influenciador da depressão, mesmo quando ela faz parte de algo positivo que está prestes a acontecer, como um casamento ou uma promoção”, explica.
Brasil acredita que a preocupação ligada à responsabilidade em decorrência do nascimento de um bebê seja o maior agravante aos sintomas detectados pelos canadenses. “O pai passa por um momento de estresse. Há a dúvida se a criança vai nascer bem, se ele vai ter condições de provê-la”, diz. “Além disso, pode se sentir meio à parte, excluído do processo, não só durante a gravidez, como depois do parto também. Ele pode achar que sua presença é secundária.”
Tratamento
A boa notícia é que, segundo os pesquisadores, a maioria dos casos de depressão detectada nos participantes podia ser tratada sem grandes dificuldades. “Táticas para melhorar o sono, gestão do estresse, aumento do apoio social e definição de estratégias adaptativa para o casal, como dividir os trabalhos e melhorar a comunicação, fazem parte de uma intervenção sob medida para pais em risco”, sugere Costa.
A autora também frisa que tratar os homens é importante não só para a saúde deles, mas de toda a família. “Filhos de pais deprimidos são afetados emocionalmente, socialmente e cognitivamente. Precisamos entender melhor quais os fatores que contribuem para a depressão em homens e em mulheres durante esse período e usar essas provas para desenvolver e avaliar estratégias que evitem dificuldades emocionais, principalmente em casais de primeira viagem”, defende.
Mario Pereira, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Campinas (Unicamp), destaca a importância de o homem se convencer de que haverá mudança na rotina e na relação com a parceira antes mesmo do início da gestação. “Ele precisa estar preparado para o risco de ser ‘colocado de lado’ e entender que pode ficar na periferia, mas para dar suporte à mãe e ao bebê. Em situações normais, não há razões para sofrer com a falta de atenção”, destaca.
Segundo Pereira, o ponto alto do estudo canadense é chamar a atenção para o fato de que as consequências da depressão pós-parto podem ser ainda mais preocupantes do que o imaginado. Daí, segundo ele, a importância de pensar em abordagens de prevenção que envolvam toda a família. “Esse estudo toca em uma questão que é pouco lembrada. Quando pensamos nesse tipo de transtorno, achamos que ele só ocorre com as mulheres e esquecemos que os homens podem sofrer dele também. A depressão acaba sendo vista, nesse momento, como uma questão apenas biológica, ligada só à mãe. Mas toda a experiência envolve o casal”, explica.
Vigiar é prevenir
“No caso de um primeiro filho, o cuidado é maior ainda porque o homem e a mulher não têm experiência. Essa é uma fase delicada na vida dos dois, uma interrupção na rotina que levam. É importante o suporte emocional principalmente quando o pai tem predisposição para ter esse problema de saúde. Prestar atenção no comportamento e tomar medidas que possam reverter isso, já que, com a chegada do filho, o cenário pode piorar ainda mais.”
Marco Antônio Brasil, chefe do serviço de psiquiatria do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
O perdão protege
Passada a fase fértil, a forma como homens e mulheres lidam com os problemas familiares e de outros campos da vida faz com que a depressão os acometa de forma distinta. É o que mostra um estudo da Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, publicado na última edição da revista Aging & Mental Health. As cientistas descobriram que mulheres mais velhas que perdoaram mais ao longo da vida são menos propensas a ter o distúrbio psicológico, apresentando uma quantidade reduzida de sintomas ligados a esse tipo de enfermidade.
Foram analisados dados de mais de mil adultos com mais de 67 anos e que responderam a perguntas sobre religião, saúde e bem-estar psicológico. Os cientistas perceberam que homens e mulheres que perdoam mais estavam mais protegidos da depressão, apresentando menos sintomas ligados ao distúrbio. No caso delas, o benefício é maior. “Parece superioridade moral, mas não é. Estar mais propenso a perdoar os outros parece ajudar a diminuir os níveis de depressão, e isso ocorre mais particularmente entre as mulheres”, explica Christine Proulx, coautora do trabalho.
"A gravidez pode ser um momento de aprendizado, uma fase para educar e preparar homens com risco de sofrer dificuldades em sua saúde mental. Precisamos desenvolver intervenções aceitáveis e sob medida durante a transição para a paternidade" - Deborah Da Costa, professora adjunta do Departamento de Medicina da Universidade McGill e autora principal do trabalho
Voltam traumas e conflitos
Há risco de o abalo natural provocado pela chegada de um filho despertar nos homens traumas adormecidos, segundo Mario Pereira, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Campinas (Unicamp). “Essa experiência também pode despertar questões emocionais profundas. Existe a possibilidade de o homem sofrer com inseguranças e conflitos antigos, caso não tenha se sentido amado na infância, por exemplo. Ele também pode sentir que sua virilidade foi colocada em xeque e uma rivalidade com a mãe, todos os fantasmas do passado podem retornar”, detalha.
Segundo o psiquiatra, um dos principais fatores de a saúde emocional masculina não ser muito explorada está na despreocupação dos homens quanto a essa questão. “Em sua maioria, eles não se preocupam muito com essas desordens emocionais, só quando os prejudicam diretamente, como a insônia. Aí, querem resolver o problema porque precisam trabalhar cedo, mas não percebem quais questões emocionais estão ligadas a isso, que há, por exemplo, a possibilidade de estarem inseguros com algo”, ilustra.
Site
Com a intenção de ajudar os pais a se tornarem mais proativos psicologicamente, os cientistas da Universidade McGill trabalham no desenvolvimento de uma ferramenta virtual. “Tenho obtido financiamento para desenvolver o site que está sendo projetado por mim e por outros especialistas nessa área. Estamos recebendo sugestões dos futuros pais sobre os temas que eles preferem que faça parte do portal. Queremos prepará-los emocionalmente para a paternidade, equipando-os com informações e ferramentas para ajudá-los a se sentirem prontos para o novo papel”, adianta Deborah Da Costa, professora adjunta do Departamento de Medicina da instituição canadense.