Saiba por que é difícil acabar com a barriga

Preocupação vai além da estética e passa a ser questão de saúde, já que aumenta o risco de doenças cardiovasculares e diabetes

por Zulmira Furbino 18/10/2015 09:24

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Quinho / EM / D.A Press
Recomenda-se que a circunferência abdominal não ultrapasse 88cm no caso das mulheres e 102cm nos homens (foto: Quinho / EM / D.A Press )
É sempre assim. No começo, pouca gente se preocupa. E então ela vai ganhando espaço, tomando conta, sorrateiramente. Até que, um belo dia, a pessoa se olha no espelho e bate aquele desespero: “De onde surgiu isso? Preciso acabar com esta barriga. E tem que ser já!”. Você já viu esse filme? Se a resposta for positiva, saiba que não está sozinho. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada pela primeira vez em agosto deste ano, mostram que 37,7% dos brasileiros têm cintura aumentada, o que pode significar que aquela barriguinha que você notou agora esconde riscos de doenças cardiovasculares e diabetes. O estudo também mostra que 56,9% das pessoas maiores de 18 anos no país pesam mais do que deveriam e 20,8% são consideradas obesas.

Não há mágica capaz de fazer um ser humano emagrecer somente naquele lugar onde está sobrando e o abdome é o local do corpo com mais potencial para acumular gorduras, já que tem uma reserva interna e outra externa nas quais o tecido adiposo pode ser confortavelmente acumulado. Hoje, recomenda-se que a circunferência abdominal não ultrapasse 88cm no caso das mulheres e 102cm nos homens. Por outro lado, a relação entre a cintura e o quadril não deve ser superior a 1% para o sexo masculino e 0,85% para o feminino. Estão com sobrepeso aqueles que têm índice de massa corporal (IMC) igual ou superior a 25.

MOVIMENTE-SE
Para perder barriga, o principal “segredo” é... emagrecer, certo? Portanto, pegue a fita métrica, suba na balança, mire-se no espelho. A cintura está grossa demais, o peso está no limite ou ultrapassou o limite, e o abdome está, digamos assim, mais proeminente do que a ciência e a estética mandam – e do que você gostaria? Saia da frente da TV, movimente-se, vigie sua alimentação. Se você já tentou tudo isso e não conseguiu, prepare-se para outras verdades sobre gordura abdominal. Além do sedentarismo e de uma dieta hipercalórica, fatores genéticos, o gênero e noites maldormidas podem estar alimentando, acumulando gordura nesse local a que os mais velhos chamavam de pança.

Resumo da ópera: sua barriguinha não surgiu do nada e, pior, ela tem muito a dizer sobre você.

Jair Amaral / EM / D.A Press
A gerente comercial Andréia Clélia Raydan contratou personal trainning, mas confessa que está difícil atingir seu objetivo (foto: Jair Amaral / EM / D.A Press )
Prazeres regrados
Acabar com aqueles quilinhos a mais e que ficam concentrados principalmente na barriga exige sacrifícios e persistência na prática de hábitos saudáveis. Ajuda de especialista é bem-vinda

Acabar com os quilos a mais e aquela barriguinha regada a fatores genéticos ou tira-gosto, massas e outras delícias à base de farinha branca, cerveja, carnes gordurosas e comida processada não é brincadeira. Que o diga o empresário Luiz Fernando Rodrigues dos Santos, de 28 anos, que, desde 2013, vem fazendo o possível e o impossível para ter um abdome “trincado”. Para isso, num prazo de dois anos ele perdeu 40 quilos de gordura e ganhou 20 de massa magra. Depois de emagrecer, sobraram “aquelas dobrinhas na barriga”, o que levou Luiz Fernando a encarar uma abdominoplastia. Assim que foi liberado pelos médicos, o empresário voltou a treinar intensamente para conseguir “definição de alto nível”. São três horas de atividade física ao dia, começando de manhã, pelos exercícios aeróbicos, em jejum. À noite, ele volta a malhar, desta vez com o objetivo de hipertrofiar os músculos. Paralelamente, faz dieta cetogênica, que elimina todos os carboidratos, e reposição hormonal com testosterona.

A cirurgia foi em maio e, depois disso, foram três meses de uma recuperação que o empresário considera “pesada”. Nesse meio tempo, perdeu toda a massa magra e agora vem fazendo a “reconstrução”. Segundo ele, o fundamental é continuar o trabalho que foi feito antes da cirurgia, rumo ao abdome trincado: cortar o álcool, treinar duas vezes ao dia, não abandonar o regime e “viver à base de café e proteína, pois estética e saúde não andam de mãos dadas”. Segundo Luiz Fernando, para conseguir uma definição muscular de nível alto é preciso abandonar o carboidrato. “Aí o seu cérebro para de funcionar, a desidratação é constante, você tem de comer toda hora. Como os treinos são muito intensos e o desgaste dos músculos e dos ossos é grande, é preciso tomar vitamina C para desinflamar”, diz. Mas isso não faz mal para a saúde? “Sim, mas como já disse, não existe a possibilidade de ser saudável e 'definido' ao mesmo tempo. Meu corpo está cada vez melhor e não posso parar”.

Exageros para perder a barriga à parte, de acordo com Maria Isabel Correia, especialista em nutrição parenteral e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a melhor maneira de combater a gordura abdominal é não engordar. “O abdome só acumula gordura se a balança for para o lado positivo. Ao mesmo tempo, à medida que o tempo passa, é preciso fazer atividade física, porque homens e mulheres perdem massa muscular à medida que a idade avança. Mas uma postura proativa pode mininimizar essas tendências”, alerta. A médica cita como um exemplo hipotético o caso de uma mulher que está na menopausa, começa a ficar deprimida e, por isso, acaba parando de fazer atividade física, comendo mais e, quando engorda, põe a culpa nos hormônios. “Sem dúvida, em certos casos, o fator hormonal é o ativador do aumento da barriga e do peso, mas por trás existem fatores mentais e emocionais que vão colaborar para que isso ocorra. Há mulheres que entram na menopausa e nem sabem”, lembra.



ESTÉTICA
Andréia Clélia Raydan, gerente comercial, de 43, também vive a saga de tentar perder a barriga com poucos resultados. Há três anos, ela começou a fazer atividade física por uma questão de saúde, mas agora admite que a malhação virou uma questão de estética. Como sozinha ela não se anima a fazer ginástica, contratou um personal trainning três vezes por semana. “São três anos malhando com o acompanhamento de uma nutricionista. Meu bumbum ficou mais durinho, perdi a celulite nas pernas, meus braços enrijeceram. Mas a barriga, infelizmente, não tem jeito. E olha que faço abdominal pra caramba”, diz.


Quando precisa fazer uma avaliação, a própria profissional de nutrição que acompanha Andréia alerta que a cliente engorda mais na região abdominal. “Sinto-me muito incomodada. A cintura fica mais grossa, a gente vai vestir uma roupinha e se sente mal. Minha alimentação é regulada. Durante a semana ando na linha, mas no fim de semana vem o lixo (doces, sorvetes, batata frita, cachorro-quente)”, justifica.

No Brasil, segundo estudo do IBGE, apenas 37,3% da população consome a quantidade diária adequada de frutas e hortaliças, que são seis porções ao dia. Do outro lado da balança, entre os marcadores de alimentação não saudável estão o consumo regular de refrigerantes, leite integral e carne ou frango com excesso de gordura, hábito de 37,2% dos entrevistados e que tem maior presença entre os homens (47,2%). Os brasileiros que consomem refrigerantes e sucos artificiais em pelo menos cinco dias da semana, hábito que também é mais frequente entre os homens, atinge um quarto da população do país.


Alimentos com excesso de carboidratos refinados, como açúcar, farináceos, amidos e massas, e os industrializados, que são carboidratos altamente processados, também engordam e, consequentemente, mandam a gordura para a barriga. E isso inclui os sucos de fruta batidos no liquidificador. Já os alimentos naturais e os integrais, a exemplo de frutas, legumes, verduras e os produzidos com farinha integral, têm propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias e podem reduzir a gordura na barriga.

Cristina Horta/EM/D.A Press
Depois de emagrecer 10 quilos, Simone Pinheiro faz exercícios acompanhada pela preparadora física Gabriela Moreira, quatro vezes por semana, combinada com dieta para manter o peso (foto: Cristina Horta/EM/D.A Press)


Bomba-relógio
Excesso de gordura abdominal é causa de doenças cardiovasculares, metabólicas e do fígado. Causas para o acúmulo de tecido adiposo nessa região vão desde idade e hormônios até estresse e falta de sono

Barriga não é matemática. Ou, pelo menos, não tanto como se imagina. Muitas vezes, somar a prática de atividade física a uma alimentação saudável não resolve o problema. Se fosse apenas uma questão de vaidade, tudo bem. Mas não funciona assim. Por trás da luta contra aquela barriguinha que incomoda e teima em não desaparecer há uma batalha por viver mais e melhor. Especialistas alertam que existe uma boa chance de que aquele abdome avantajado funcione como uma bomba-relógio amarrada na cintura, já que o excesso de gordura abdominal, principalmente aquela que se acumula entre os órgãos, é causa de doenças cardiovasculares, metabólicas e do fígado. As causas para o acúmulo de tecido adiposo nessa região do organismo são várias e vão desde a idade e os hormônios, passando pela genética, estresse e a falta de sono.

O endocrinologista Geraldo Santana, diretor do Instituto Mineiro de Endocrinologia, explica que a primeira coisa que se deve entender sobre a região abdominal é que ela é um lugar preferencial de acúmulo de gordura no organismo. Claro que algumas pessoas têm baixa predisposição para isso, mas quando a pessoa engorda pra valer e tem tendência genética, é certo que ela vai se acumular ali. “Homens têm mais chance de engordar na região do abdome e mulheres no quadril, coxas e bumbum. Ou seja: em certos casos, a culpa por uma pessoa não conseguir eliminar aquela terrível barriguinha está fora de controle, porque ela tem a ver com o gênero ou com a herança familiar. “O sexo conta e os fatores genético e hereditário também”, avisa.

Envelhecer também tem tudo a ver com o diâmetro da cintura. Conforme o tempo passa, muda a maneira como o corpo perde e ganha peso. O metabolismo desacelera e, com ele, o número de calorias que o organismo precisa para se manter vivo diminui. No caso das mulheres, a situação é ainda mais complexa por causa da menopausa. “A queda na produção do hormônio responsável pelas curvas femininas e pela deposição da gordura no quadril, o estrógeno, durante e depois da menopausa vai levar as mulheres a acumularem mais tecido adiposo na região abdominal”, explica o endocrinologista.

Os homens também sofrem com a chegada da idade, já que os níveis de testosterona começam a cair e a barriga a aumentar. O abdome tem dois compartimentos de deposição de gordura, a camada subcutânea e a intravisceral, que fica atrás do músculo abdominal. É essa gordura que causa mais danos à saúde. “É preciso levar em conta o tipo de gordura que a pessoa tem. Se é a do tipo pneuzinho, o problema está mais para a estética. Já a visceral tem relação com doenças”, alerta o endocrinologista.

CORTISOL
Se você está entre os 60% dos brasileiros que têm queixas relativas ao sono, saiba que dormir entre seis e oito horas por dia pode afinar a sua cintura. Geraldo Santana explica que a falta de sono aumenta a produção do cortisol, relacionado ao aumento da gordura abdominal. Noites maldormidas, por outro lado, reduzem a produção do hormônio do crescimento, o GH, responsável por aumentar a massa magra e reduzir a gordura exatamente no lugar onde ela mais incomoda, o abdome. “O GH é produzido durante o sono profundo. Se a pessoa dorme pouco, não produz GH e há o aumento da gordura na barriga”, justifica. O estresse crônico e prolongado, segundo ele, também está diretamente ligado às barriguinhas proeminentes, porque produz o famigerado cortisol, que eleva o nível das células adiposas que engrossam a circunferência abdominal.



Conjunto de ações
Maria Isabel Correia, especialista em nutrição parenteral e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concorda que há vários motivos que “ajudam” a barriga a não desaparecer. Ela explica que a melhor maneira de enfrentar as tendências hereditárias de engordar e, no caso específico das mulheres, evitar o acúmulo da gordura abdominal na menopausa, é não engordar. Trabalhar o corpo de maneira incorreta também impede a cintura de afinar.

É o que explica a preparadora física Gabriela de Paula Sales Moreira, de 26 anos. Formada em educação física e dona de uma assessoria esportiva que presta serviços a vários condomínios, ela explica que apenas os exercícios aeróbicos não vão dar conta de eliminar – ou diminuir – a sua barriga. “O exercício aeróbico, a dieta e a musculação precisam caminhar juntos. Morrer de fazer abdominal não adianta nada. Para ter um abdome sarado é preciso seguir esses três passos”, recomenda.

A executiva de contas Simone Pinheiro de Andrade, de 35, tinha uma barriguinha que a incomodava demais. Por isso, há um ano e meio, contratou Gabriela como sua treinadora. De lá para cá, emagreceu 10 quilos e reduziu a circunferência abdominal. “A barriga me incomodava muito. E sou de um biótipo que engorda na barriga, no quadril e nas coxas. Depois que perdi esses quilos, faço atividade física quatro vezes por semana e tento segurar a onda na alimentação. Mas no fim de semana abro uma exceção. Não tenho o objetivo de ser uma 'paniquete'. Quero só ter um corpo legal, magro, definido e com saúde”, explica.

LIMITES
Treinos de alta intensidade também ajudam a banir a gordura do abdome. O objetivo é queimar calorias superando limites e dando o máximo de si. A ideia é queimar mais calorias em menos tempo. A prática regular de exercícios físicos ou esportes nos níveis recomendados, considerada como fator de proteção à saúde, é adotada apenas por 22% dos brasileiros, a maioria homens. Os que não praticam atividades físicas ou praticaram menos de 150 minutos por semana são 46% da população, a maioria mulheres. Por último, um batalhão de 42,3 milhões de pessoas – 28,9% da população adulta –, fica sentado diante da TV por mais de três horas diárias.