'Expondo o Silêncio': ensaio dá voz às cicatrizes invisíveis (ou não) de vítimas de violência obstétrica
As autoras Cristen Pascucci e Lindsay Askins viajaram pelos Estados Unidos e se encontraram com mães que foram vítimas de traumas na gravidez e no parto
Valéria Mendes
Uma em cada quatro mulheres brasileiras afirma ter sido vítima de violência obstétrica. No entanto, estima-se que a incidência seja ainda maior já que o conceito ainda não é amplamente conhecido. Até hoje, a ideia é rechaçada e não reconhecida pelos profissionais de saúde principalmente pelo fato de a autoria estar focada apenas no médico. No entanto, abrange todo o sistema de atendimento à gestante. Outro porém é que o tema ainda é pouco divulgado e muitas mulheres ainda não conseguem se reconhecer como vítimas já que só recentemente a violência obstétrica começou a ser tipificada.
A realidade, no entanto, está mudando. Em 2014, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou, em seis idiomas, uma declaração contra a violência obstétrica. Entre as definições para esse tipo de agressão a mulheres no pré-parto, parto e pós-parto a OMS aponta “abuso de medicalização e patologização dos processos naturais do trabalho de parto, que causem a perda de autonomia e da capacidade das mulheres de decidir livremente sobre seus corpos e sua sexualidade”.
Já neste ano, a OMS listou os principais tipos de agressão que vitimam grávidas ao redor do mundo. O mapeamento revisou 65 estudos que abrangiam 34 países, o Brasil incluído, e que mostrou que em todos os continentes mães enfrentam maus-tratos nas unidades de saúde.
Entre eles estão agressão verbal e física, discriminação e preconceito e não cumprimento dos padrões de cuidado como, por exemplo, o excesso de exames de toque que para a gestante pode ser constrangedor, doloroso e gerar um novo trauma (caso a mulher tenha sido vítima de violência sexual e estar em uma posição de vulnerabilidade que a remeta à lembrança do abuso). O mau relacionamento entre as mulheres e os profissionais de saúde também foi listado pela OMS.
Para além de pesquisas e conhecimento científico que vem sendo produzido sobre o tema, trabalhos autorais como o ‘Projeto 1:4: retratos da violência obstétrica’ de autoria da fotógrafa Carla Raiter e da produtora cultural Caroline Ferreira tentam dar visibilidade a cicatrizes invisíveis (ou não) e provocar a reflexão sobre a condição de nascimento. O Brasil é campeão mundial de cesarianas.
Um novo projeto, a série de fotografias 'Exposing The Silence' (Expondo o Silêncio, em tradução livre) dá voz às mulheres vítimas de violência obstétrica com imagens e depoimentos tocantes. O projeto idealizado por Cristen Pascucci, que trabalha em organizações que lutam pelo nascimento respeitoso e uma boa experiência no parto, e pela fotógrafa e doula Lindsay Askins pode ser conhecido na íntegra aqui.
As duas viajaram pelos Estados Unidos e se encontraram com mães que foram vítimas de traumas na gravidez e no parto e relataram suas experiências. A cesariana sem indicação, o excesso de intervenções no parto normal como a episiotomia (corte entre o ânus e a vagina), a separação entre mãe e bebê quando o recomendado pela OMS é o contato pele a pele na primeira hora de vida, a violência verbal e física aparecem nos relatos das norte-americanas. Veja alguns: