Pesquisa sobre diabetes tipo 2 divide pacientes em três grupos e sugere tratamentos diferentes

Cada grupo tem características genéticas e riscos de complicações diferentes. A medida poderia levar a tratamentos personalizados mais eficientes

por Isabela de Oliveira 12/10/2015 11:00

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Pesquisadores da Escola de Medicina Icahn, do Hospital Monte Sinai, em Nova York, apontam que o diabetes tipo 2 (DT2) não é uma doença única, que se desenvolve de maneira igual nos pacientes. Na realidade, as manifestações da enfermidade dependem de características genéticas e fenotípicas, que também podem favorecer o aparecimento de males como câncer e doenças cardiovasculares. A partir disso, os autores propõem, em artigo na revista especializada Science Translational Medicine, que o DT2 seja dividido em três subtipos, o que pode ajudar no desenvolvimento de terapias personalizadas para o problema.

Arte: CB / D.A Press
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Os resultados são fruto da primeira demonstração de como a medicina de precisão e o processamento de big data (como é chamada a análise de um grande número de dados) podem ser aplicados para desvendar relações clínicas entre pacientes. “É como uma rede social em que as pessoas são conectadas porque compartilham os mesmos amigos ou têm interesse nos mesmos filmes. Nesse caso, construímos uma rede em que os pacientes são conectados por semelhanças no exame de sangue e outras manifestações clínicas”, explica Joel Dudley, principal autor do estudo.

Após analisar os dados de mais de 11 mil pessoas, das quais 2.551 tinham DT2, Dudley notou que um grupo de pacientes — que no fim da pesquisa foi classificado como subtipo 1 — tendia a ser mais gordo, manifestar o problema jovem e sofrer com doenças respiratórias e problemas de visão, inclusive cegueira. Essas pessoas também tinham taxas elevadas de hemoglobina glicada, o que significa um baixo controle da doença.

A continuidade das análises identificou outros dois quadros. O subtipo 2 foi associado a um maior risco para câncer, especialmente de pulmão e brônquios. Os autores não conseguiram avaliar, contudo, se esses pacientes eram fumantes. Foi detectada, ainda, correlação com tuberculose e problemas cardiovasculares. Por fim, o grupo do subtipo 3, que é o mais numeroso, foi mais frequentemente diagnosticado com HIV, doenças cardiovasculares, anemia e doenças mentais.

Dudley esclarece que alguns desses achados, como maior número de infecções por HIV no subtipo 3, são apenas correlações, ou seja, não é possível afirmar se é apenas uma coincidência ou se o diabetes está, por algum motivo, favorecendo o contágio. No entanto, as informações do DNA dos pacientes permitiram identificar aspectos genéticos que podem ser relacionados a determinados problemas.

O grupo com risco elevado para complicações cardiovasculares, por exemplo, exibe fatores genéticos únicos relacionados à função vascular. Foram identificadas 33 variáveis clínicas específicas para o subtipo 1, três delas compartilhadas com o subtipo 3. Para os subtipos 2 e 3, foram encontradas três e 11 variantes específicas, respectivamente. Bases genéticas que favorecem o DT2 já tinham sido observadas em grupos étnicos, mas nunca de forma tão afunilada como fizeram Dudley e sua equipe.

Comunicação
Diretora do Departamento de Diabetes Mellitus da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), Hermelinda Pedrosa julga que a correlação com o HIV é interessante por mostrar como efeitos adversos de antirretrovirais podem ser mais acentuados em algumas pessoas do que em outras. Após analisar a pesquisa, ela observa que as reações a medicamentos também foram notadas no subgrupo 3, que apresenta maior uso de drogas antipsicóticas, como clozapina e olanzapina. As substâncias favorecem o ganho de peso, a dislipidemia e o diabetes.

Também presidente da Regional Distrito Federal da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD-DF), a médica diz que os resultados de Dudley reforçam a necessidade de comunicação entre diferentes especialidades médicas, como psiquiatria e endocrinologia. Os profissionais, antes de prescrever as medicações, precisam fazer um levantamento do risco que o paciente tem de desenvolver DT2 e se o remédio prescrito poderia potencializá-los. “Além disso, mostram que o DT2 não é uma doença linear e que há cenários diferentes para cada paciente, o que é explicado pela genética.”

Pedrosa considera que, mesmo com limitações, como falta de correlação do tempo que o paciente tem a doença, os pesquisadores tiveram sucesso em mostrar quais comorbidades e bases genéticas estão correlacionadas com cada subtipo. Para ela, estudos nessa linha abrem campo para o desenvolvimento de abordagens que, além de tratar, previnam complicações. Dudley acredita que a estratégia usada na análise poderia ser usada para explicar outras doenças, como artrite, mal de Alzheimer ou câncer. “Esperamos que, no futuro, possamos incorporar informações de fontes de dados como aplicativos digitais ou sensores ‘vestíveis’ que nos permitam criar mapas mais precisos dos pacientes. Assim, focaremos no bem-estar das pessoas.”

Mexicanos

Pesquisa publicada no Journal of the American Medical Association (Jama) mostrou que, nos Estados Unidos, 10% de mexicanos sofriam com o diabetes tipo 2. O índice entre caucasianos caía para 5,2% dos casos. Um dos fatores que influenciam a estatística, além do estilo de vida e de dieta, são os genes SLC16A11 e HNF1A. A última variante, que é rara, está associada a um aumento de cinco vezes nas chances de uma pessoa desenvolver o diabetes tipo 2. Ainda é cedo para falar em um tratamento diferenciado, porque mais estudos são necessários para avaliar os benefícios de um guia terapêutico baseado no genótipo, afirmaram os pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts (EUA).