Os fins de semana de Mary são “na pedra”. É na natureza que ela experimenta um dos prazeres da vida. A escalada é também o ganha-pão: de segunda a sexta-feira, ela trabalha na loja da academia; sábado e domingo, está à frente de um camping na Serra do Cipó. Pedro prefere sua magrela. Difícil uma semana em que não faça pelo menos 100 quilômetros. Só não pedala mais por causa do trabalho, da faculdade e do namoro: é preciso saber dividir o tempo. Lia gosta do agito da academia: são pelo menos quatro horas por dia. A zumba é uma das aulas preferidas. Heloísa é a turista do grupo. Acaba de voltar de um tour pela Itália, com as amigas, claro. Alexandre é um homem do mundo. Não sai do aeroporto. Em 30 dias, vai “bater ponto” em seis países diferentes. É trabalho, trabalho e trabalho de novo.
Mary, Pedro, Lia, Heloísa e Alexandre somam 364 anos. Para as estatísticas, são idosos. Para quem os conhece pela disposição, estilo de vida e novos planos, são mais jovens que muita gente que se agarrou ao controle remoto da TV como se a vida acabasse aos 60. Todos eles são personagens da “Revolução da Longevidade”, que veio para mudar a ordem social. Para Alexandre Kalache, o Alexandre aí de cima, que, como doutor em envelhecimento e saúde pública e presidente do Centro Internacional da Longevidade no Brasil, cruza os continentes falando sobre o assunto, às vésperas de estrear na casa dos 70 anos, é uma revolução silenciosa com efeitos gritantes para a sociedade. “Pela primeira vez na história da humanidade, o grupo etário que mais cresce, em todo o mundo, é o dos que têm mais de 60 e menos de 80 anos”, comemora.
Envelhecer, hoje, é, principalmente, ultrapassar os limites da idade cronológica e saber aproveitar o bônus de longevidade conquistado. Mais do que um fenômeno biológico, esse é um amplo processo social que precisa de boa saúde, rede de relações e condição financeira. Preparar-se para tal momento, contemplando todos esses aspectos, é o caminho para vivenciá-lo com plenitude. Para a geriatra e gerontóloga Andréa Prates, mestre em promoção de saúde e coordenadora executiva do Centro Internacional de Informação para o Envelhecimento Saudável (Cies), é preciso desconstruir o modelo de velhice arraigado na sociedade e trazer outra visão sobre o passar do tempo, abandonando a construção social estereotipada que conhecemos, aquela na qual ainda se vê o número, a idade cronológica, e não a pessoa.
Mary Lage, por exemplo, mais do que uma idosa com 66 anos cravados na carteira de identidade, é uma mulher que trabalha de segunda a sexta-feira, quase sempre de manhã, de tarde e de noite. Porque sobra disposição e vontade de estar com o marido, os filhos, as noras e os netos vendo o negócio e paixão da família prosperar. A montanhista tinha 47 anos quando escalou pela primeira vez. O filho mais velho se encantou pelo esporte e estilo de vida, e ela foi conferir quão segura era aquela novidade. “A maioria das pessoas chega aos 60 com a ideia de que não consegue fazer mais nada. Para mim, esta fase é como uma segunda infância. Já vivi tanta coisa que, daqui pra frente, tudo o que eu fizer é para ser feliz. Escalo com crianças de 5 anos e não vejo diferença. Só me divirto mais”, ensina.
As vésperas do Dia Internacional do Idoso, comemorado em 1º de outubro, quinta-feira, o Bem Viver convida seus leitores a pensar o futuro e a refletir sobre o que é possível fazer para envelhecermos mentalmente saudáveis. O novo idoso, esse para o qual a idade cronológica pouco importa, tem projetos, sonhos e imaginação; cuida da saúde; tem interesse pela vida; é ativo; usa a criatividade; relaciona-se e convive; realiza desejos novos e antigos; exerce a sexualidade; aceita limites e se adapta. O novo idoso encara o envelhecimento como mais uma das fases da vida. O novo idoso sabe que ruim mesmo é não ter a chance de ficar velho. O novo idoso é o único capaz de mudar um paradoxo: querem viver muito, mas não querem envelhecer. E então? Quer ser esse novo idoso?