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Amamentar pode reduzir risco de leucemia infantilProteção contra a leucemia: pesquisa mostra como vacina ajuda no combate ao câncer infantilMedicamento contra a leucemia recebe status de avanço terapêutico nos EUAVacina aplicada após sessões de quimioterapia evita a volta da leucemiaPesquisadores da Suécia descobrem dois novos tipos de leucemiaTerapia inédita reverte leucemia incurável em bebê de 1 ano“A ideia de que as células brancas poderiam ser geneticamente modificadas de uma forma que permita alvejar e matar substâncias cancerosas surgiu há quase 20 anos. Ao longo da última década, as abordagens para o crescimento dos linfócitos e a modificação genética deles se tornaram muito mais eficientes”, explicou ao Correio David Porter, professor da Universidade da Pensilvânia e um dos autores do estudo.
Pela nova técnica, chamada CTL019, células imunitárias do paciente são recolhidas por meio de um sistema semelhante ao da diálise — filtragem do sangue realizada quando o rim não consegue exercer essa função. As células T recebem, então, um vírus composto pela pela base genética do HIV e por outras sequências de DNA. Essas estruturas fazem com que os glóbulos brancos consigam atacar a proteína CD19, encontrada na superfície de células cancerígenas ligadas à leucemia linfoide crônica, entre outros tumores. “Modificando geneticamente os linfócitos conseguimos fazer com que eles reconheçam e matem as próprias células cancerosas”, explica Porter.
Nos testes iniciais, a maioria dos pacientes apresentou melhoras com a injeção da substância modificada combinada com a quimioterapia. Dos 14 voluntários, quatro apresentaram remissão completa assim que o tratamento conjunto foi finalizado. Desses, dois mantiveram a condição quatro anos depois. Um, um ano a mais. Para a equipe de cientistas, porém, o resultado mais significante é que as estruturas modificadas permanecerem no corpo dos pacientes muito tempo após o novo tratamento. “Descobrimos que essas células brancas podem persistir por vários anos e temos provas de que elas ficam ativas. Isso sugere que podem proteger os pacientes de recaídas”, destaca Porter.
Guardiãs
Belinda Simões, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea (SBTMO), destaca que essa resistência das células modificadas é um ponto interessante, pois surge como um recurso mais eficaz para tratar a leucemia. “Nessa doença, a quimioterapia não funciona muito bem porque não consegue combater as células cancerígenas por muito tempo, já que elas são muito resistentes. Não funciona como uma vacina, que você toma uma vez só e se protege do sarampo, por exemplo. Os dados desses pesquisadores que mostram uma resistência de anos trazem esperanças de que essas células permaneçam como guardiãs do corpo”, explica.
Simões explica que o sistema imunológico fortalecido é uma busca constante no tratamento das leucemias, conquistada hoje por meio do transplante de medula óssea. A especialista cogita que a técnica proposta pela equipe norte-americana pode, inclusive, acabar com o uso da quimioterapia no tratamento da leucemia linfoide crônica. Para outros cânceres, porém, seria mais difícil.
“Você precisa buscar um alvo para atingir a enfermidade. No caso da leucemia, seriam os linfócitos, mas outras doenças demandam que outras substâncias sejam combatidas e, muitas vezes, se você as destruir, pode causar uma reação de ataque ao corpo pelo fato de elas estarem interligadas a outros órgãos. Nesse câncer de sangue, a destruição das células T não desencadeia outros problemas”, diferencia.
Efeitos colaterais preocupam
Apesar de ter mostrado resultados positivo de eficácia e duração, a nova imunoterapia desenvolvida pelos cientistas norte-americanos trouxe efeitos colaterais aos voluntários. Entre eles, febre alta, náusea, dor muscular, alucinações e delírios. A equipe tratou os pacientes com medicamentos para esses sintomas adversos, mas acredita que os efeitos indesejados das células de defesa modificadas possam ser reduzidos futuramente. “Estamos tentando otimizar essa terapia de modo que ela fique mais eficaz. Também esperamos identificar os fatores que justifiquem o funcionamento melhor dela em alguns pacientes e em outros não”, diz David Porter, professor da Universidade da Pensilvânia e um dos autores do estudo.
Celso Arrais, hematologista do Hospital Sírio-Libanês em São Paulo, destaca que a pesquisa mostra um tipo de opção de terapia que já tem sido considerada como uma nova ferramenta no tratamento da leucemia, mas destaca que algumas melhoras devem ser consideradas para um resultado clínico melhor, incluindo nesse conjunto a redução dos efeitos adversos. “Estamos acostumados com os efeitos colaterais, que ocorrem durante esse tipo de tratamento da leucemia. Há uma espécie de inflamação, que é parecida com uma infecção, que torna o processo complicado, caro e que precisa ser feito em hospital, com acompanhamento médico”, explica o especialista.Mesmo com o cuidado extra exigido pelo tratamento, Arrais acredita que a nova técnica é uma promessa para a área médica. “Esse tipo de modificação é algo que pode ser encomendado e enviado pelas empresas (de saúde) para vários locais. Trata-se de um recurso que não envolve elementos tóxicos e utiliza o próprio sistema de defesa do corpo, evitando, assim, rejeições. Uma estratégia inteligente e eficaz”, avalia.