Saúde

Apaixonado por esportes, professor universitário reaprendeu a andar para continuar se exercitando

Túlio Max Ferreira Leite, de 64 anos faz trilhas na natureza, joga tênis, treina uma equipe de futebol, nada e até subiu o Pico da Bandeira

Carolina Cotta

"Não perdi nada. Continuei vivendo e fazendo minhas atividades", diz Túlio Max



Um problema circulatório lhe tirou as pernas com as quais conquistou suas maiores vitórias, mas ele não precisaria delas para seguir vencendo. Na vida do professor universitário aposentado Túlio Max Ferreira Leite, de 64 anos, dedicada à educação física, a deficiência é uma realidade recente, mas que, com pouco tempo, ele soube transformar. Três anos atrás, durante uma partida de tênis, Túlio sentiu uma forte dor na perna. Com o diagnóstico de trombose, vieram 20 cirurgias e três amputações em um único mês. “Primeiro, foi a perna esquerda, abaixo do joelho. Depois, o pé direito e, por fim, a perna direita. Mas, em momento algum senti que foi tirada de mim alguma coisa”, recorda.


Foi tudo tão rápido e impactante, que Túlio se lembra de não ter pensado em muita coisa na hora. Queria era resolver o problema de saúde. “Quando falaram da possibilidade da amputação, reuni minha família e tentei evitar que entrassem em desespero. Tive muita calma naquele momento e não consigo explicar por que, mas ela permanece até hoje. Não perdi nada. Continuei vivendo e fazendo minhas atividades. Claro que precisei me adaptar. Mas me surpreendo com essa resiliência, essa coisa de aceitar de forma tranquila. Uma reação que também foi boa para minha família, que estava chorosa”, lembra.

O professor universitário mantém na rotina as atividades que sempre gostou de fazer


Atleta por toda a vida, inclusive agora, professor da Faculdade de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) por 35 anos, Túlio sempre chamou a atenção pela vitalidade, disposição, pelo movimento. Por isso todos sofreram em pensar que seu corpo estava perdendo uma parte. Para Túlio, talvez tenha vindo daí a força para encontrar outras mil possibilidades. “Pensei para mim um novo caminhar”, comemora. A adaptação à prótese foi bem rápida. “Nem deu tempo de pensar em coisa ruim. Queria levantar, andar e fazer as coisas que gostava de fazer. E não queria incomodar ninguém”, lembra.

Túlio também treina e uma equipe de futebol infantil


As trilhas de bicicleta ele trocou pelo quadriciclo, mesmo assim não conseguiu se despedir da magrela: substituiu as pedaladas pelo downhill. Hoje, faz academia, natação, tênis e esportes na natureza. Já correu a Volta da Pampulha e subiu o Pico da Bandeira, coisa que muitos não deficientes nem sequer imaginam tentar. “Posso dizer que sou tão ativo quanto antes. Minha experiência de vida talvez tenha me feito reagir com mais naturalidade ao processo. Soube compreender os reveses que a vida nos apresenta. É como encarar um tropeço. Minha espiritualidade e minha família me deram toda a força de que precisava”, comemora.

Outro esporte que o professor gosta de praticar é o Tênis


Como Túlio, muitos dos 45,6 milhões de brasileiros que vivem com algum tipo de deficiência optaram por enfrentar a diferença de forma positiva, comemorando a superação de cada desafio, lutando por acessibilidade, ampliando a inclusão, inspirando seus pares a se aceitar. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 apontam que os deficientes são 23,91% da população brasileira. Isso quer dizer que, praticamente, um em cada quatro brasileiros tem alguma deficiência. Significa que, provavelmente, toda família brasileira enfrenta essa realidade.

O Saúde Plena foi atrás dessas pessoas, que, no seu dia a dia ou por meio de projetos que dão apoio e visibilidade à questão, estão mostrando que é preciso mudar a estrutura, melhorar a acessibilidade e promover a inclusão, mas que nada disso funciona se o olhar delas mesmas, e dos outros, frente à deficiência não mudar.

DEPOIMENTO
Teresa Vilela, esposa de Túlio



“Quem conhece o Túlio sabe que sua superação não poderia ser diferente. Durante toda sua vida, fez trilhas de moto, andou de ski aquático, fez rapel, pedalou, jogou peteca, peladas, tênis. Sempre muito ativo e entusiasmado, agregava as pessoas que faziam parte da sua vida nas mais variadas aventuras. Acho que Deus escolhe as pessoas fortes para servir de exemplo. Enquanto todos à sua volta não conseguiam sequer imaginar que isso estava acontecendo, ele dava lições de aceitação, força e coragem. O hospital inteiro conhecia o seu astral, pois sempre entrava na sala de cirurgia com um largo sorriso, cumprimentando todos os enfermeiros e médicos da equipe. Na primeira amputação, enquanto ia de maca para a sala de cirurgia e a família fazia um corredor ao seu lado, ele, com as mãos para cima, dizia a todos com humor e alegria: 'Façam minha inscrição para as Paralimpíadas de 2016”. Depois de dois anos de muita luta, garra e recuperação, hoje, usa duas próteses, dirige seu carro adaptado, joga tênis, pratica natação, faz academia e anda de bicicleta. Já tentou até andar de skate e, em junho, com a família e um grupo de amigos, subiu o Pico da Bandeira, comemorando os dois anos de uma nova forma de andar na vida.”