Saúde

Tratamento minimamente invasivo aumenta sobrevida de pacientes com valvopatia

Em Belo Horizonte, o procedimento já foi realizado nos hospitais Felício Rocho, Madre Teresa e Mater Dei. Especialistas lutam pela sua incorporação ao SUS

Carolina Cotta

Clique na imagem para ampliá-la e saiba mais
Uma técnica minimamente invasiva tem diminuído a mortalidade e aumentado a qualidade de vida de pacientes com estenose na valva aórtica submetidos ao procedimento. Valvopatia mais comum entre os idosos, com prevalência estimada de 5% para aqueles com mais de 75 anos de idade, a estenose provoca dor no peito, desmaio e falta de ar. A partir do início desses sintomas, a sobrevida média é de dois a três anos. O tratamento exige a troca da valva, uma cirurgia complicada nessa faixa etária. Mas, com o implante de valva aórtica transcateter, o chamado TAVI, os riscos são minimizados.


Na primeira quinzena de agosto, a incorporação do procedimento no Sistema Único de Saúde (SUS) foi discutida na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal. Enquanto isso não ocorre, mais centros estão se preparando para aumentar a experiência na realização das cirurgias. O Hospital Santa Isabel, de Ubá, realizou, no fim de julho, um TAVI por via transapical, método mais agressivo. Em Belo Horizonte, o procedimento já foi realizado nos hospitais Felício Rocho, Madre Teresa e Mater Dei, mas todos eles pela via transfemural, que responde por mais de 80% dos procedimentos.

Segundo Marcus Bolívar Malachias, presidente eleito da Sociedade Brasileira de Cardiologia, trata-se de uma tecnologia inovadora, que requer uma preparação minuciosa e a participação de um grande número de profissionais, além de equipamentos especializados. “É uma perspectiva de tratamento, principalmente, para pacientes idosos, que, até então, não tinham qualquer alternativa, exceto a cirurgia aberta, com maior risco e elevada mortalidade”, explica o professor da Faculdade de Ciências Médicas. Até que as equipes conquistem experiência, a realizacão do TAVI exige a participação de experts atrelados aos fornecedores dos implantes.

O implante de valva aórtica transcateter vem sendo usada desde 2002, em pacientes de alto risco ou inoperáveis para cirurgia aberta. No Brasil, a técnica começou em 2008. Há dois modelos de próteses transcateter disponíveis no mercado, a Core Valve, da Medtronic, e a Sapien XT, da Edwards Lifesciences. Segundo o cardiologista e ecocardiografista André Luís Fernandes Nogueira, responsável técnico pelo Instituto do Coração de Ubá, essa última é expansível por balão e recoberta por pericárdio bovino, enquanto a Core Valve é autoexpansível e recoberta por pericárdio de porco.

Segundo Nogueira, o tratamento padrão para pacientes com estenose aórtica é a cirurgia de troca da valva, promovendo um aumento no tempo de vida e amenizando os sintomas desses pacientes. “Mas o risco cirúrgico, principalmente relacionado à idade e a doenças associadas, torna uma boa parte desses pacientes inelegíveis para esse tipo de tratamento”, lamenta. Como alternativa para esses pacientes, existia a valvoplastia por balão, que é uma abertura da valva por meio de um cateter com balão. “Mas é um procedimento muito restrito, devido à alta mortalidade”, explica.

O cardiologista intervencionista Lucas Lodi Junqueira, coordenador da Sala Híbrida do Hospital Mater Dei Contorno, dedicada a procedimentos de grande porte e alta complexidade como o TAVI (o hospital realizou o procedimento pela primeira vez no ano passado), ressalta que a técnica, a princípio, era indicada apenas para pacientes com estenose valvar aórtica grave com alguma contra-indicação cirúrgica, o que mudou com o desenvolvimento de dispositivos mais modernos, hoje em sua terceira geração. “As indicações foram ampliadas, passando a abranger também aqueles pacientes com alto risco cirúrgico”, explica.

O TAVI transapical é uma alternativa à técnica tradicional, sendo reservada aos casos em que a técnica transfemural não é possível. Segundo o cardiologista intervencionista Marco Antônio Perin, à frente do Centro de Intervenção Cardiovascular do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo, referência nesse tipo de procedimento, se o paciente tem lesões vasculares, vasculopatia periférica ou artéria femural com calibre menor que seis milímetros não é possível fazer o TAVI via femural. Algumas doenças, como a chamada aorta em porcelana, resultante de uma grande calcificação da valva, também exige que o TAVI seja via transapical.

ACESSO

A estenose aórtica grave gera altos custos ao SUS, onde a única terapia prevista é a valvuloplastia aórtica com cateter balão. Segundo Lucas Lodi, apesar de nossa maior prevalência da estenose valvar aórtica em relação à América do Norte e Europa, o número de TAVI ainda é muito aquém do desejado. “Para esses pacientes, não existe outro procedimento substituto, mas devido a seu alto custo, ela não é autorizada nem pelo SUS nem pela maioria dos planos de saúde suplementar. Infelizmente, a grande maioria dos procedimentos já realizados no país foram autorizados por meio de liminares judiciais”, lamenta.

Enquanto se tenta ampliar o acesso à técnica, novidades já são experimentadas em outros locais do mundo. Segundo Perin, já é possível fazer a substituição da valva pulmonar, uma das quatro valvas do coração, mas o procedimento ainda não chegou ao Brasil. A substituição da valva aorta é a mais recente no país. Já o procedimento chamado valve-in-valve, indicado para a valva mitral, é feito há mais de 20 anos. Nesse caso, o paciente já tem uma valva operada ou tem uma prótese mal funcionante, sendo necessário colocar uma valva dentro de outra.