A técnica pioneira foi desenvolvida pelo Laboratório do Sono do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC/Fmusp). O tratamento é uma série de seis exercícios para fortalecer os músculos envolvidos, direta ou indiretamente, na produção do ronco e na apneia obstrutiva do sono. Com duração de oito minutos, eles devem ser realizados três vezes ao dia e, para facilitar ainda mais a adesão do paciente ao tratamento, sempre incorporados às atividades rotineiras, como se alimentar, escovar os dentes ou no percurso para o trabalho, por exemplo. Sua efetividade, contudo, depende da orientação de um fonoaudiólogo especializado em motricidade orofacial, área da fonoaudiologia de onde os exercícios se originaram.
“Embora seja de fácil execução, os exercícios devem ser prescritos, orientados e acompanhados por profissionais especializados”, reforça a fonoaudióloga especialista em motricidade orofacial Vanessa Ieto, autora do estudo que resultou na nova técnica. Essa medida é necessária para que os desvios na execução dos exercícios sejam diagnosticados e corrigidos ao longo do tratamento. “Ao fazer o movimento errado serão trabalhados músculos que nada têm a ver com a cessação do ronco”, explica a doutora em ciências e pesquisadora do Incor. Se as pessoas tentarem reproduzir o exercício em casa, sem a orientação do especialista, não serão capazes de fazer a carga e a força necessárias e, se não fizerem direito, não vão chegar aos resultados.
Segundo Vanessa, para manter os benefícios, o paciente não pode parar com os exercícios, mas depois de um período, o tratamento entra em fase de manutenção. Em média, a fase inicial dura três meses. Nesse período, o fonoaudiólogo deve ver o paciente pelo menos uma vez por semana para mudar a carga dos exercícios. A série leva cerca de oito minutos para ser realizada e deve ser feita três vezes ao dia. “O número de repetições, se o exercício será fraco ou forte, vai depender da frequência do treino em casa”, explica.
INOVAÇÃO
Os tratamentos para ronco incluem cirurgias para desobstrução das vias aéreas superiores, implantes no palato, dispositivos intraorais e orientações para perda de peso e mudança postural. A nova técnica avança no acesso, já que são exercícios possíveis de serem realizados nas atividades do dia a dia. Em 2009, o próprio Incor desenvolveu uma série de 12 exercícios. A nova técnica é evolução dessa, já que a partir da simplificação do método ele se torna mais fácil de ser assimilado e seguido. “Até hoje não havia registro científico de um tratamento que combinasse eficácia nos resultados e facilidade para a adesão do paciente à terapia”, afirma Geraldo Lorenzi Filho, pneumologista e diretor do Laboratório do Sono, que orientou a pesquisa de desenvolvimento da técnica antirronco do Incor.
Mas o grande avanço foi o desenvolvimento de um aparelho capaz de mensurar o ronco. Segundo Lorenzi, isso foi fundamental para a simplificação da técnica original. Desenvolvido em parceria com o Instituto de Física da USP, o aparelho de registro contínuo do ronco grava os sons concomitantemente à polissonografia e, por meio de um software, analisa e registra a intensidade e a frequência do ronco. “Antes disso, não tínhamos como medir o ronco de forma objetiva e, portanto, era impossível avaliar também a sua melhora por meio dos exercícios”, explica. Os pacientes estudados tiveram uma diminuição da frequência do ronco em 36% e de 60% em sua potência, que representa o barulho total do ronco durante a noite.
SONO SAUDÁVEL
Peso, idade e, no caso das mulheres, o período pós-menopausa são alguns dos fatores que levam ao ronco primário ou à piora daquele associado à apneia obstrutiva do sono. Contra a idade e a menopausa não há o que fazer, mas perder peso pode ajudar. Segundo Lorenzi Filho, outras medidas também podem se somar à prática dos exercícios antirronco na melhoria do quadro. Evitar dormir de barriga para cima é uma delas, porque a língua cai para trás e obstrui a faringe. O consumo de álcool e de sedativos também deve ser evitado, uma vez que eles relaxam a musculatura dessa região, favorecendo sua vibração ou colapso.
RISCO CARDÍACO
A apneia obstrutiva do sono é a obstrução parcial ou total das vias aéreas de forma recorrente durante a noite. No total, a respiração é paralisada por mais de 10 segundos. A gravidade da apneia é determinada pelo número de paradas da respiração por hora de sono: leve (5 a 15 paradas por hora), moderada (15 a 30) e grave (mais de 30). A diminuição do fluxo de ar para os pulmões e as paradas respiratórias resultam numa menor oxigenação do sangue e em alterações no sistema nervoso autônomo que provocam alterações no metabolismo. Isso pode agravar a hipertensão, a aterosclerose e a obesidade, todos eles fatores de risco para as doenças cardiovasculares, as que mais matam no mundo. Quando conjugados, eles aumentam ainda mais o risco de infarto, AVC e arritmias. O ronco está presente em 70% a 95% dos casos de apneia.
BARULHO INCÔMODO
A garganta do ser humano, especificamente a faringe, é muito estreita. Quando dormimos, sua musculatura tem um relaxamento natural, o que favorece um colapso nessa região, que vibra quando o ar passa por ela. Essa condição fisiológica favorecedora do ronco é agravada no obeso pelo acúmulo de gordura na região do pescoço, que dificulta ainda mais a passagem do ar. Já em pessoas idosas e também nas mulheres depois da menopausa, o ronco é favorecido pela flacidez dos tecidos da faringe, que, sob relaxamento da musculatura durante o sono, vibram na passagem do ar.